GA15:292-294 – verdade como certeza e sujeito-objeto

Tradução

Como chegamos a esta separação, esta dicotomia entre o sujeito e o objeto? Como um surge em relação ao outro? Esta questão pressupõe um estágio anterior, quando a dicotomia ainda não havia ocorrido. Este estágio inicial, para Hegel, é o mundo grego.

Qual é de fato a força motriz da dicotomia sujeito-objeto? É a busca pela certeza absoluta. Tal busca, que nasce de uma interpretação da verdade como certeza, aparece historicamente com a primeira Meditação de Descartes. Com Descartes, o homem como ego cogito torna-se o distintivo ὑποκείμενον (hypokeimenon), o subjectum (no sentido medieval) – o fundum inconcussum. Doravante, a natureza só aparece como objeto de sujeito.

Como um prelúdio histórico a este advento, pode-se notar que a busca pela certeza aparece primeiro no domínio da fé, como a busca da certeza da salvação (Lutero), depois no domínio da física como a busca pela certeza matemática de natureza (Galileu) – uma pesquisa há muito preparada pela separação nominalista de palavras e coisas no campo da linguagem (William de Ockham). Ao evacuar o conceito de realidade, o formalismo de Ockham torna possível o projeto de uma chave matemática para o mundo.

Daí a pergunta: É possível apreender em um conceito, com uma necessidade imperiosa, a unidade da certeza matemática e a certeza da salvação?

Heidegger responde que é a garantia (domínio, disponibilidade, segurança) que se busca cada vez que aproxima estas duas questões aparentemente independentes. Na busca da certeza matemática, o que se busca é a segurança do homem na natureza, no sensível; na busca da certeza da salvação, o que se busca é a certeza do homem no mundo supra-sensível.

A origem da dicotomia é, portanto, a mutação da verdade em certeza, a que corresponde a prioridade dada à entidade homem no sentido de ego cogito, sua ascensão à posição de sujeito. Doravante, a natureza torna-se objeto (ob-jectum), sendo o objeto nada mais do que “o que é lançado contra mim” (das mir Entgegengeworfene). Assim que o ego se torna o Sujeito absoluto, todos os outros seres se tornam objetos para ele, por exemplo, na forma de percepção (este é o ponto de partida para o “Objeto” no sentido kantiano). O decisivo é que a distinção sujeito-objeto atua inteiramente na dimensão da subjetividade. Esta dimensão é caracterizada por Hegel por meio da expressão consciência. “Consciência” é a esfera da subjetividade. Consciência, isto é, “ver tudo junto”, co-agere. Todos os termos essenciais de Hegel no texto em questão se referem à consciência.

Os parágrafos dedicados a Descartes em Ser e Tempo representam a primeira tentativa de sair da prisão da consciência, ou melhor, de não mais entrar nela. Não se trata de maneira alguma de restaurar o realismo contra o idealismo, pois o realismo, limitando-se à garantia de que existe um mundo para o sujeito, permanece dependente do cartesianismo. É antes uma questão de tentar pensar o sentido grego de ἐγώ (ego).

Mitchell & Raffoul

Original

Excertos de

Heidegger – Fenomenologia e Hermenêutica

Responsáveis: João e Murilo Cardoso de Castro

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