GA11:14-16 – do sophon ao philo-sophon

Ernildo Stein

Todo o ente é no ser. Ouvir tal coisa soa de modo trivial em nosso ouvido, quando não de modo ofensivo. Pois, pelo fato de o ente ter seu lugar no ser, ninguém precisa preocupar-se. Todo mundo sabe: ente é aquilo que é. Qual a outra solução para o ente a não ser esta: ser? E entretanto: precisamente isto, que o ente permaneça recolhido no ser, que no fenômeno do ser se manifesta o ente; isto jogava os gregos, e a eles primeiro unicamente, no espanto. Ente no ser: isto se tornou para os gregos o mais espantoso.

Entretanto, mesmo os gregos tiveram que salvar e proteger o poder de espanto deste mais espantoso — contra o ataque do entendimento sofista, que dispunha logo de uma explicação, compreensível para qualquer um, para tudo e a difundia. A salvação do mais espantoso — ente no ser — se deu pelo fato de que alguns se fizeram a caminho na sua direção, quer dizer, do sophon. Estes tornaram-se por isto aqueles que tendiam para o sophon e que através de sua própria aspiração despertavam nos outros homens o anseio pelo sophon e o mantinham aceso. O phileinsophon, aquele acordo com o sophon de que falamos acima, a harmonia, transformou-se em orexis, num aspirar pelo sophon. O sophon — o ente no ser — é agora propriamente procurado. Pelo fato de o philein não ser mais um acordo originário com o sophon, mas um singular aspirar pelo sophon, o philein to sophon torna-se “philosophia”. Esta aspiração é determinada pelo Eros.

Uma tal procura que aspira pelo sophon, pelo hen panta, pelo ente no ser, se articula agora numa questão: que é o ente, enquanto é? Somente agora o pensamento torna-se “filosofia”. Heráclito e Parmênides ainda não eram “filósofos”. Por que não? Porque eram os maiores pensadores. “Maiores” não designa aqui o cálculo de um rendimento, porém aponta para uma outra dimensão do pensamento. Heráclito e Parmênides eram “maiores” no sentido de que ainda se situavam no acordo com o Logos, quer dizer, com o Hen Panta. O passo para a “filosofia”, preparado pela sofística, só foi realizado por Sócrates e Platão. Aristóteles então, quase dois séculos depois de Heráclito, caracterizou este passo com a seguinte afirmação: Kai de kai ta palai te kai nyn kai aei zetoumenon kai aei aporoumenon, ti to on? (Metafísica, VI, 1, 1028 b 2 ss.). Na tradução isso soa: “Assim, pois, é aquilo para o qual (a filosofia) está em marcha já desde os primórdios, e também agora e para sempre e para o qual sempre de novo não encontra acesso (e que é por isso questionado): que é o ente? (ti to on)”.

A filosofia procura o que é o ente enquanto é. A filosofia está a caminho do ser do ente, quer dizer, a caminho do ente sob o ponto de vista do ser. Aristóteles elucida isto, acrescentando uma explicação ao ti to on, que é o ente?, na passagem acima citada: tou to esti tis he ousia? Traduzido: “Isto (a saber, ti to on) significa: que é a entidade do ente?” O ser do ente consiste na entidade. Esta, porém — a ousia — , é determinada por Platão como ideia, por Aristóteles como energeia. (1999, p. 32-33)

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Responsáveis: João e Murilo Cardoso de Castro

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