Fédier (2012:22-25) – Da-sein

destaque

— Ser-o-aí é dar uma presença?

— Não, não é dar uma presença, é abrir o aí: manter aberta a possibilidade, a dimensão de manifestação de tudo o que é. Ser-o-aí, das Da-sein, significa desdobrar a dimensão dentro da qual tudo pode aparecer como ente (sendo). Fazemo-lo a toda a hora, basta abrir os olhos. “A porta está fechada” é uma manifestação simples. O que é espantoso é que nenhum outro ente, para além do homem, pode fazer tal coisa. O ser humano é, portanto, humano se for diferente de todos os outros entes [Carta sobre o humanismo: “Manter-se na clareira do ser é o que chamo a ek-sistência do homem. Este modo de ser é próprio (eignet) apenas ao homem” (tradução de R. Munier, modificada)]. O macaco pode reconhecer um ente, mas não pode identificar este ente como ente. Em outras palavras, o macaco não fala. Falar e ser-o-aí são, de fato, duas faces do mesmo fenômeno: falar é ser-o-aí. Ser-o-aí não se esgota na fala, mas tudo o que é humano se passa numa atmosfera de fala. Quando caminhamos por uma floresta, estamos constantemente a dizer coisas como “há mais luz”, ou “as árvores vão ter folhas em breve”. É por isso que os diálogos de Platão são sempre sobre estas coisas. Sócrates gosta de confundir os seus interlocutores: sou menor que tu e maior que o outro, logo sou simultaneamente maior e menor (Platão, Fédon, 100e-101 b, (24) República, VII, 524c). Os gregos tinham uma predileção por este tipo de afirmação: bates numa cadela que é mãe, e a cadela é tua, logo bates na tua mãe (Ionesco escreve em Rhinoceros: “Todos os gatos são mortais, e Sócrates é mortal, logo Sócrates é um gato”). Platão e Aristóteles também colocam ordem na argumentação. É a reflexão sobre o que nos é mais próximo: a língua. A reflexão sobre a língua linguagem é uma reflexão sobre a humanidade.

original

  1. Voir Descartes, Méditations, II, éd. Adam et Tannery, Paris, Vrin-CNRS, 1896-1909, vol. 7, p. 28,1. 20.[↩]
  2. Voir Lettre sur l’humanisme, p. 56 : « Se tenir dans l’éclaircie de l’être, c’est ce que j’appelle l’ek-sistence de l’homme. Cette manière d’être est propre (eignet) à l’homme seul» (trad. R. Munier modifiée).[↩]
  3. Voir Hölderlin, Le Rhin, 8e strophe: «Ils en ont pourtant, de leur propre / Immortalité, les Dieux, assez, et ils ont besoin / Les Célestes d’une chose, / Une seule : ce sont les héros et les hommes / Et les mortels par ailleurs. En effet comme / Les Bienheureux ne ressentent rien d’eux-mêmes, / Il est bien nécessaire, s’il est permis de dire / Une telle chose, qu’au nom des dieux, / Prenant part, ressente un autre, / Celui-là, il le leur faut » (dans Douze Poèmes, trad. Fr. Fédier, Paris, La Différence, 1989, p. 75.)[↩]
Excertos de

Heidegger – Fenomenologia e Hermenêutica

Responsáveis: João e Murilo Cardoso de Castro

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