O eu, enquanto «eu penso» é, de ora em diante [após Descartes ], o fundamento em que repousa toda a certeza e verdade. Mas, ao mesmo tempo, o pensamento, o enunciado, o logos, é o fio condutor das determinações do Ser, das categorias. Estas encontram-se tendo como fio condutor o «eu penso», tendo em vista o eu. Deste modo, o eu, devido a este significado fundamental para a fundamentação da totalidade do saber, torna-se a determinação acentuada e essencial do homem. Até então e também de aí em diante, ele é concebido como animal rationale, como ser-vivo pensante. Com a particular acentuação do eu, quer dizer, com o «eu penso», a determinação do racional e da razão adquire um peculiar predomínio. Porque o pensar é o acto fundamental da razão. Com o cogito sum, a razão é agora posta, expressamente e de acordo com a sua exigência própria, como primeiro fundamento de todo o saber e como fio condutor de qualquer determinação da coisa em geral.
Já em Aristóteles, o enunciado, o logos, era o fio condutor para a determinação das categorias, quer dizer, do Ser do ente. Todavia, o lugar do fio condutor — a razão humana, a razão em geral — não era caracterizado como subjetividade do sujeito. Mas agora a razão, enquanto «eu penso», é erigida expressamente em princípio supremo, enquanto fio condutor e tribunal de toda a determinação do Ser. O princípio fundamental é o princípio do eu: cogito-sum. E o axioma fundamental de todo o saber mas não é o único axioma fundamental e isto simplesmente porque, no próprio princípio do eu, se encontra implicado ainda outro princípio. Na medida em que dizemos «cogito-sum», enunciamos o que se encontra no subjectum (ego). Enquanto tal, o enunciado, para ser enunciado, deve pôr sempre aquilo que se encontra no subjectum. O que se põe e diz no predicado não deve nem pode contradizer o sujeito; a kataphasis deve ser sempre de tal modo que evite a antiphasis, o dizer no sentido do exprimir-se contra qualquer coisa, no sentido de contradição. Na proposição enquanto proposição e, por consequência, no princípio supremo, enquanto princípio do eu, é posto como válido, de um modo igualmente originário, o princípio da contradição a evitar (abreviadamente: princípio de contradição).
Na medida em que o axiomático, enquanto projeto matemático, se põe a si mesmo como princípio normativo do saber, é colocado o pôr, o pensar enquanto «eu penso» e o princípio do eu. «Eu penso» quer dizer: evito a contradição, obedeço ao princípio de contradição.
O princípio do eu e o princípio de contradição resultam da essência do próprio pensar, de tal modo que a vista se dirige simplesmente à essência do «eu penso» e ao que se encontra nele e apenas nele. O «eu penso» é a razão, é o seu ato fundamental. O que é meramente criado pelo «eu penso» é simplesmente extraído da própria razão. A razão concebida deste modo é puramente ela própria, é razão pura.
Os princípios que resultam simplesmente da razão, de acordo com o traço matemático fundamental do pensar, tornam-se os princípios do saber autêntico, quer dizer, daquilo que é filosofia em grau mais elevado, a metafísica. Os princípios da mera razão são os axiomas da razão pura. A razão pura, o logos entendido desta forma, a proposição com esta forma, tornam-se fios condutores e medidas diretrizes da metafísica, quer dizer, do tribunal da determinação do Ser do ente, da coisalidade da coisa. Agora, a pergunta pela coisa está ancorada na razão pura, quer dizer, no desenvolvimento matemático dos seus princípios.
No título «razão pura» está presente o logos de Aristóteles e em «pura», em particular, uma determinada configuração do matemático.