Vattimo (Realidade) – encenação (Vollzugssinn)

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(…) Não se pode possuir o sentido da existência, diz Heidegger, de uma “forma teórica [nota do autor: contemplativa, objetivante], mas sim através da encenação (Vollzug) do ‘sou’, que é um modo de ser que pertence ao ser do ‘eu’.” (GA60) Tudo isto mostra “que esta experiência não experimenta o ‘eu’ como algo localizado numa região, como uma individuação de um ‘universal’.” E ainda aqui: “O ‘eu’ deve ser entendido aqui como o eu pleno, concreto e historicamente factual que é acessível a si mesmo na sua experiência historicamente concreta de si mesmo.” A historicidade concreta não significa aqui, de modo algum, “o correlato da observação histórica teórica e objetiva; pelo contrário, é tanto o conteúdo como o ‘como’ da preocupação ansiosa do eu sobre si mesmo”. Isto não tem nada a ver com um novo alargamento da “consciência histórica” dominante, entendida como uma coleção de conhecimentos sobre o passado, a utilização prática desta informação e uma crítica das suas relíquias sobreviventes. Não se trata, numa palavra, de Historisches, de historiografia, mas de uma história em progresso que está ativamente em relação com o seu próprio passado. Jaspers, e antes dele a fenomenologia de Husserl, tinham dado à filosofia a tarefa de chegar “às coisas mesmas”. Portanto, sem qualquer pressuposto. Já nas primeiras páginas da recensão (Psychologie der Weltanschauungen de Jaspers, GA9), Heidegger tinha escrito que “pensar sem pressupostos pretende aqui ser tomado num sentido filosófico e não num sentido especificamente científico. . . . Pode acontecer que mesmo nas direções de investigação em que poderíamos encontrar acesso às próprias coisas da filosofia estejam encobertas para nós, e que o que é assim necessário é um tipo radical de desconstrução e reconstrução, i.e., um confronto genuíno com a história que nós próprios ‘somos’”. A destruição — ou desconstrução — de algo que se entende no contexto da escrita, onde já não se trata de uma “metafísica” a superar, no sentido do “segundo” Heidegger, mas fala-se antes do fato de os pressupostos objetivos, panorâmicos e estéticos que acabam por se afirmar no livro de Jaspers serem o resultado de uma tradição aceita sem crítica, e nem sequer conscientemente assumida. Devido a esta sujeição à tradição, “não somos capazes de ver os fenômenos da existência atual de uma forma autêntica, já não experimentamos o sentido da consciência e da responsabilidade que reside no próprio histórico (o histórico não é apenas algo de que temos conhecimento e sobre o qual escrevemos livros; antes, nós próprios o somos e o temos como tarefa).”

Valgenti

  1. It makes up volume 9, edited by F. W. von Herrmann.[↩]
  2. In Martin Heidegger, Pathmarks, ed. W. McNeill (Cambridge: Cambridge University Press, 1998), 1, where he cites Jaspers.[↩]
  3. Here too is a literal citation from Jaspers: ibid., 2.[↩]
  4. Ibid., 3.[↩]
  5. Martin Heidegger, The Phenomenology of Religious Life, trans. M. Fritisch and J. A. Gossetti-Ferencei (Bloomington: Indiana University Press, 2004), 7.[↩]
  6. Heidegger, Pathmarks, 20.[↩]
  7. Heidegger, The Phenomenology of Religious Life.[↩]
  8. Ibid., 30, translation modified.[↩]
Excertos de

Heidegger – Fenomenologia e Hermenêutica

Responsáveis: João e Murilo Cardoso de Castro

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