Bochenski1962
Os objetos intencionais do sentir (intentionale Gegenstände des Fühlens) são ο a priori do emocional: são os valores. O entendimento é cego para eles, mas eles são dados imediatamente ao sentir intencional, como as côres à visão. São a priori.
Scheler leva a cabo uma crítica demolidora, por um lado, de toda espécie de nominalismo axiológico, para o qual os valores nada mais são do que fatos empíricos, e, por outro lado, do formalismo ético. Por esta forma consegue liberar a filosofia dos preconceitos dominantes no século XIX, mediante um esforço comparável ao de Bergson no campo teórico. Não podemos entrar aqui nos pormenores desta crítica e circunscrevemo-nos a traçar suas linhas fundamentais.
No comportamento humano distingue Scheler a tendência (Streben), os fins (Zwecke), os objetivos (Ziele) e os valores (Werte). O fim é um conteúdo, dado para ser realizado; pertence sempre à esfera dos conteúdos figurados, é, portanto, representado. Nem em toda tendência há um fim. Pelo contrário, toda tendência tem um objetivo: radica no próprio curso da tendência e não é condicionado por nenhum ato da representação. Em todo objetivo há um valor: o valor é o conteúdo imediato do objetivo. É totalmente errônea a afirmação de que o homem aspira sempre ao prazer. Na realidade nunca procura originariamente o prazer nem qualquer outro estado afetivo, mas sim os valores. E mesmo nos casos em que o prazer se converte em objetivo, na intenção ele converte-se em valor. Mas nem todo dado de valor está ligado a uma tendência: podemos sentir valores (mesmo éticos) sem tender para eles. Segue-se, portanto, que os valores não dependem dos fins, mas radicam já nos objetivos de nossas tendências, que lhes servem de fundamento, e mais ainda aos fins. Por outro lado, tampouco se deve confundir o valor com o dever ser. Scheler distingue aqui entre o “dever ser ideal” e o “dever ser normativo” (imperativista). Neste último, um conteúdo de “dever ser ideal” é referido, como exigência, a uma tendência. O valor fundamenta o dever ser ideal e este é o fundamento do dever ser normativo. Constitui grave equívoco pretender construir a ética sobre este último.
Os valores são tudo menos relativos: são absolutos no duplo sentido da palavra. Seu conteúdo não é uma relação; pertencem à categoria da qualidade, e são imutáveis. Relativo é o nosso conhecimento dos valores, e não os valores. Neste ponto Scheler investe energicamente contra as diferentes formas de relativismo e, especialmente, contra a ética relativista. Empreende, sucessivamente, o exame do subjetivismo que reduz os valores ao homem, do relativismo que os reduz à vida ou os considera historicamente necessitados. Deste ponto de vista, descobrimos variações do sentimento (portanto, do conhecimento) dos valores (Ethos), variações no juízo dos valores (Ethik), variações dos tipos unitários de instituições, de bens e de ações, da moralidade prática, que afeta o valor do comportamento humano, finalmente variações dos costumes e usos tradicionalmente estabelecidos. Tudo isto é captado numa evolução constante, mas os valores morais permanecem intatos. Estes podem ser mais ou menos bem captados, concebidos e formulados, mas, em si mesmos, permanecem absolutos e imutáveis.
Os valores constituem um mundo de relações, no qual reinam as relações de essência e as leis formais a priori. Segundo isso, os valores dividem-se em positivos e negativos. A existência de um valor positivo é, em si mesma, um valor positivo, e sua não-existência um valor negativo; a existência de um valor negativo é um valor negativo, e sua não-existência um valor positivo. O mesmo valor não pode ser, a um tempo, negativo e positivo, todo valor não negativo é positivo e vice-versa. Os valores agrupam-se em superiores e inferiores. São valores superiores os mais consistentes, os menos “divisíveis”, os que servem de fundamento aos outros, os que provocam satisfação mais profunda, finalmente os que são os menos relativos. A hierarquia a priori das modalidades de valor é a seguinte: 1) valores sensíveis: o agradável e o desagradável; 2) valores vitais: o nobre e o vulgar; 3) valores espirituais: o belo e o feio, o justo e o injusto, o conhecimento puro da verdade; 4) valores do sagrado e do profano. A verdade não é um valor. Esta classificação não contém os valores éticos (morais), porque estes consistem na realidade de outros valores relativamente superiores ou inferiores.
Finalmente, os valores agrupam-se segundo seus portadores. A divisão mais importante é a de valores de pessoa e valores de coisa. São valores de coisa ou reais os que concernem a objetos de valor (bens), entre outros também aos bens de cultura. São valores de pessoa ou pessoais os valores da “própria” pessoa e os valores de virtude. São, por essência, superiores aos valores de coisa. Só a pessoa é originariamente boa ou má. Em segundo lugar, estes valores correspondem às direções da capacidade moral e, em terceiro lugar, aos atos de uma pessoa. Pelo que, os valores morais são valores pessoais por excelência.