SZ:41-43 – caracterização do Dasein

Schuback

O ente que temos a tarefa de analisar somos nós mesmos. O ser deste ente é sempre e cada vez meu. Em seu ser, isto é, sendo, este ente se relaciona com o seu ser. Como um ente deste ser, a presença se entrega à responsabilidade de assumir seu próprio ser. Ser é o que neste ente está sempre em jogo. Desta caracterização da presença resultam duas coisas:

1. A “essência” deste ente está em ter de ser. A quididade (essentia) deste ente, na medida em que dela se possa falar, há de ser concebida a partir de seu ser (existência). Neste propósito, é tarefa ontológica mostrar que, se escolhemos a palavra existência para designar o ser deste ente, esta não tem e nem pode ter o significado ontológico do termo tradicional existentia. Para a ontologia tradicional, existentia designa o mesmo que ser simplesmente dado, modo de ser que não pertence à essência do ente dotado do caráter de presença. Evita-se uma confusão usando a expressão interpretativa ser simplesmente dado (mot16) para designar existentia e reservando-se existência como determinação ontológica exclusiva da presença.

A “essência” da presença está em sua existência. As características que se podem extrair deste ente não são, portanto, “propriedades” simplesmente dadas de um ente simplesmente dado que possui esta ou aquela “configuração”. As características constitutivas da presença são sempre modos possíveis de ser e somente isso. Toda modalidade de ser deste ente é primordialmente ser. Por isso, o termo “presença”, reservado para designá-lo, não exprime a sua quididade como mesa, casa, árvore, mas sim o ser.

2. O ser, que está em jogo no ser deste ente, é sempre meu. Neste sentido, a presença nunca poderá ser apreendida ontologicamente como caso ou exemplar de um gênero de entes simplesmente dados. Pois, para os entes simplesmente dados, o seu “ser” é indiferente ou, mais precisamente, eles são de tal maneira que o seu ser não se lhes pode tornar nem indiferente nem não indiferente. Dizendo-se a presença, deve-se também pronunciar sempre o pronome pessoal, devido a seu caráter de ser sempre minha: “eu sou”, “tu és”.

A presença se constitui pelo caráter de ser minha, segundo este ou aquele modo de ser. De alguma maneira, sempre já se decidiu de que modo a presença é sempre minha. O ente, em cujo ser, isto é, sendo, está em jogo o próprio ser, relaciona-se e comporta-se com o seu ser, como a sua possibilidade mais própria. A presença é sempre sua possibilidade. Ela não “tem” a possibilidade apenas como uma propriedade simplesmente dada. E porque a presença é sempre essencialmente sua possibilidade ela pode, em seu ser, isto é, sendo, “escolher-se”, ganhar-se ou perder-se ou ainda nunca ganhar-se ou só ganhar-se “aparentemente”. A presença só pode perder-se ou ainda não se ter ganho porque, segundo seu modo de ser, ela é uma possibilidade própria, ou seja, é chamada a apropriar-se de si mesma. Os dois modos de ser propriedade e impropriedade ambos os termos foram escolhidos em seu sentido rigorosamente literal — fundam-se em a presença determinar-se pelo caráter de ser sempre minha. A impropriedade da presença, porém, não diz “ser” menos e nem tampouco um grau “inferior” de ser. Ao contrário, a impropriedade pode determinar toda a concreção da presença em suas ocupações, estímulos, interesses e prazeres.

Os dois caracteres esboçados da presença, o primado da “existência” frente à “essência” e o ser sempre minha, já indicam que uma análise deste ente se acha diante de um âmbito fenomenal próprio. A presença não tem, nem nunca pode ter o modo de ser dos entes simplesmente dados dentro do mundo. E por isso é que não se pode dar tematicamente nos modos e métodos em que se constatam os entes simplesmente dados. O modo de dar-se previamente, que lhe é adequado, é tão pouco evidente que sua determinação constitui uma parte essencial de sua análise ontológica. A possibilidade de se compreender o ser deste ente vai depender da segurança com que se exerce um modo conveniente de acesso. Por mais provisória que seja, a análise exige que se assegure um ponto de partida conveniente. (p. 85-86)

Rivera

Macquarrie & Robinson

Original

  1. a – cada vez ‘yo’.[↩]
  2. NT:“…cada vez…”: en alemán, je.[↩]
  3. b – Pero este ser es un estar-en-el-mundo que acontece históricamente.[↩]
  4. c – ¿Cuál? (El que consiste en) Tener que ser el Ahí y en él afirmarse ante el Ser en cuanto tal (das Seyn überhaupt).[↩]
  5. NT: “…tener-que-ser…”: en alemán, Zu-sein.[↩]
  6. d – que él ‘tiene’ que ser [zu seyn:] ¡Destinación![↩]
  7. NT: “…estar-ahí…”: en alemán, Vorhandensein o también Vorhandenheit (destacado en el texto original).[↩]
  8. NT: “Todo ser tal…”: en alemán, alies Sosein[↩]
  9. a – el Ser (Seyn) ‘del’ Ahí; ‘del’: genitivo objetivo.[↩]
  10. b – e.d. ser-cada-vez-mío quiere decir estar entregado a sí mismo como propio (Übereignetheit).[↩]
  11. NT: “Y, por otra parte… etc.”: Heidegger sostiene aquí que el ser-cada-vez-mío puede revestir distintas maneras de realización: se puede ser-cada-vez-mío en forma impropia o se puede ser-cada-vez-mío en forma propia.[↩]
  12. ‘Das Seiende, dessen Analyse zur Aufgabe steht, sind wir je selbst. Das Sein dieses Seienden ist je meines.’ The reader must not get the impression that there is anything solipsistic about the second of these sentences. The point is merely that the kind of Being which belongs to Dasein is of a sort which any of us may call his own.[↩]
  13. Als Seiendes dieses Seins ist es seinem eigenen Sein überantwortet.’ The earlier editions read ‘. . . seinem eigenen Zu-sein . . .’[↩]
  14. See note 2, p. 28, H. 8 above.[↩]
  15. als Vorhandenen’. The earlier editions have the adjective ‘vorhandenen’ instead of the substantive.[↩]
  16. ‘gleichgültig’. This adjective must be distinguished from the German adjective ‘indifferent’, though they might both ordinarily be translated by the English ‘indifferent’, which we shall reserve exclusively for the former. In most passages, the latter is best translated by ‘undifferentiated’ or ‘without further differentiation’; occasionally, however, it seems preferable to translate it by ‘Indifferent’ with an initial capital. We shall follow similar conventions with the nouns ‘Gleichgültigkeit’ and ‘Indifferenz’.[↩]
  17. ‘Und weil Dasein wesenhaft je seine Möglichkeit ist, kann dieses Seiende in seinem Sein sich selbstwählen”, gewinnen, es kann sich verlieren, bzw. nie und nur “scheinbar” gewinnen. Verloren haben kann es sich nur und noch nicht sich gewonnen haben kann es nur, sofern es seinem Wesen nach mögliches eigentliches, das heisst sich zueigen ist.’ Older editions have ‘je wesenhaft’ and ‘zueigenes’. The connection between ‘eigentlich’ (‘authentic’, ‘real’) and ‘eigen’ (‘own’) is lost in translation.[↩]
  18. ‘. . . dass Dasein überhaupt durch Jemeinigkeit bestimmt ist.’[↩]
Excertos de

Heidegger – Fenomenologia e Hermenêutica

Responsáveis: João e Murilo Cardoso de Castro

Twenty Twenty-Five

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