SZ:233-234 – Ausstand – faltante – excédent – pendente

Schuback

Como se apresenta, portanto, a posição prévia da situação hermenêutica até aqui considerada? Quando e como a análise existencial, que parte da cotidianidade, forçou toda a presença — esse ente do seu “princípio” ao seu “fim” — a entrar na visão fenomenológica propiciadora do tema? De fato, afirmou-se que a cura é a totalidade do todo estrutural da constituição da presença 1. Mas o ponto de partida da interpretação já não impõe a renúncia da possibilidade de apreender a presença como um todo? A cotidianidade é justamente o ser “entre” nascimento e morte. E, se a existência determina o ser da presença e o poder-ser também constitui 2 sua essência, então a presença, enquanto existir, deve, em podendo ser, ainda não ser alguma coisa. O ente, cuja essência é constituída pela existência (305) resiste, de modo essencial, à sua possível apreensão como ente total. A situação hermenêutica não apenas não assegurou a “posição” de todo o ente, como é até questionável se isso, por fim, se pode alcançar e se uma interpretação ontológica originária da presença não estará fadada ao fracasso, considerando-se o modo de ser do próprio ente tematizado.

Uma coisa não se pode negar: a análise existencial da presença, até aqui realizada, não pode pretender originariedade. Na posição prévia, sempre se encontrou apenas o ser impróprio da presença como o que não é total. Se a interpretação do ser da presença, enquanto fundamento da elaboração da questão ontológica fundamental, deve ser originária, ela deve trazer à luz, de modo preliminar e existencial, o ser da presença em sua possível propriedade e totalidade.

Desse modo, é urgente a tarefa de se colocar a presença como um todo em sua posição prévia. Isto significa, porém: desenvolver, ao menos uma vez, a questão do poder-ser desse ente como um todo. Na presença, enquanto ela é, sempre se acha algo pendente, que ela pode ser e será. A esse pendente pertence o próprio “fim”. O “fim” do ser-no-mundo é a morte. Esse fim, que pertence ao poder-ser, isto é, à existência, limita e determina a totalidade cada vez possível da presença. Mas o estar-no-fim 3 da presença na morte e, com isso, o ser desse ente como um todo, só poderá ser introduzido, de modo fenomenalmente adequado, na discussão da possibilidade de seu possível ser todo, caso se tenha conquistado um conceito ontológico suficiente, ou seja, existencial da morte. De acordo com o modo de ser da presença 4, a morte 5 só é num ser-para-a-morte existenciário. A estrutura existencial desse ser evidencia-se na constituição ontológica de seu poder-ser todo. Toda a presença existente deixa-se, assim, trazer para a posição prévia existencial. Mas será que a presença também pode existir toda ela de modo próprio? Como se deve, então, determinar a propriedade da existência senão na perspectiva do existir de modo próprio? E de onde retirar o seu critério? Manifestamente, a própria presença deve propiciar antecipadamente em seu ser a possibilidade e a maneira de sua existência própria, uma vez que estas não lhe podem ser impostas, onticamente, e nem encontradas, ontologicamente, por acaso. O testemunho de um poder-ser próprio é fornecido pela consciência 6. Assim como a morte, esse fenômeno da presença exige uma interpretação existencial genuína. Esta leva à compreensão de que um poder-ser próprio da presença reside no querer-ter-consciência. Segundo seu sentido ontológico, porém, essa possibilidade existenciária tende para uma determinação existenciária no ser-para-a-morte.

Graças à demonstração de um poder-ser-todo em sentido próprio da presença, a analítica existencial se assegura da constituição ontológica originária da presença. Por outro lado, esse poder-ser-todo em sentido próprio revela-se, ao mesmo tempo, como modo da cura. Com isso, assegura-se também, de modo suficiente, o solo fenomenal para uma interpretação originária do sentido ontológico da presença. (p. 305-306)

Castilho

Rivera

Vezin

Macquarrie & Robinson

Original

  1. Cf. §41, p. 258s.[↩]
  2. simultaneamente o já fazer[↩]
  3. “ser”-para-o-fim[↩]
  4. pensado de acordo com o modo de ser da presença[↩]
  5. ser do não-ser[↩]
  6. NT: A palavra alemã designa, usualmente, a consciência moral dos deveres e obrigações.[↩]
  7. Cf. § 41, pp. 254 ss.[↩]
  8. (a) ao mesmo tempo: o já-ser.[↩]
  9. (a) “Ser” voltado para o final.[↩]
  10. (b) conforme à essência do Dasein.[↩]
  11. (c) Ser do não-ser.[↩]
  12. Cf. § 41, p. 213 ss.[↩]
  13. NT: “…integridad’”: en alemán, Ganzheit (destacado en el texto original).[↩]
  14. NT: “…poder-estar-entero…”: en alemán, Ganzseinkönnen.[↩]
  15. NT: “…resto pendiente…”: en alemán, Ausstand.[↩]
  16. a — ‘Estar’-vuelto-hacia-el-fin [o ‘ser’-de-cara-al-fin[↩]
  17. NT: “El haber-llegado-a-fin…”: en alemán, das Zu-Ende-sein.[↩]
  18. si se piensa en conformidad a la esencia del Dasein.[↩]
  19. Ser del no-ser.[↩]
  20. NT: “…la conciencia moral”: en alemán, das Gewissen.[↩]
  21. Cf. §41, p. 191 sqq.[↩]
  22. En même temps : l’être-déjà.[↩]
  23. « Être » (arrivé) à la fin.[↩]
  24. Pensée selon l’essence du Dasein.[↩]
  25. Être du non-être.[↩]
  26. ‘Zu-Ende-sein’ This expression is to be distinguished from ‘Sein-zum-Ende’, which we shall translate as ‘Being-towards-the-end’.[↩]
  27. Vgl. § 41, S. 191 ff.[↩]
Excertos de

Heidegger – Fenomenologia e Hermenêutica

Responsáveis: João e Murilo Cardoso de Castro

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