Stambaugh (1991:68-70) – Heidegger renova o problema do tempo

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(…) Em Ser e Tempo, Heidegger realizou pelo menos três coisas no que diz respeito ao problema do tempo, que me parecem novas. Em primeiro lugar, ao relacionar o tempo com o indivíduo finito e existente (Dasein), ele sublinha a irreversibilidade e a direcionalidade do tempo no ser-para-a-morte do Dasein, compreendendo assim a verdadeira natureza da finitude do tempo, que não reside na quantidade limitada de tempo atribuída ao indivíduo, mas nessa mesma irreversibilidade e direcionalidade. Assim, a finitude perde o seu antigo significado puramente quantitativo de “tempo insuficiente”, uma espécie de significado pré-filosófico que “acompanhava” a ideia filosófica de que as coisas estão “no tempo” sem nunca se integrarem verdadeiramente nele. O fato de algo estar no tempo é incapaz de explicar por que razão deve ser finito, por que razão deve alguma vez deixar de ser/estar no tempo. A finitude adquire o significado mais profundo da constatação da relação intrinsecamente indissolúvel da vida e da morte. A vida e a morte são inseparáveis uma da outra. Para o homem, a vida inclui o sofrimento principalmente porque a consciência da morte está presente nela, e o homem tem consciência da morte porque ela está presente na vida. A morte não é um acontecimento clinicamente definível que põe termo à existência física. É, antes, uma consciência que permeia e transforma a vida, não no sentido de uma preocupação mórbida com a morte, mas no sentido de nos individualizar e autenticar radicalmente. Em termos budistas, torna-nos conscientes do problema, da tarefa implícita na solução da vida e da morte. O conceito de “vida sem fim” é um conceito irrefletido e superficial, que impede qualquer compreensão verdadeira da natureza da vida e da morte.

A rigor, Heidegger não fala nem do universal nem do individual, mas sempre do que é “em cada caso meu” (Jemeinigkeit). O Dasein de Heidegger, o ser humano, não é nem um indivíduo nem um sujeito no sentido tradicional destas palavras. Escapa à dicotomia indivíduo-universal, em parte através da ênfase na relação radical do homem com o tempo. O homem é o ser que produz o tempo, o ser que temporaliza. Finalmente, Heidegger não só dispensa o entendimento tradicional do tempo como “no tempo”, como até tenta explicar o que significa este “no”, o que significa qualquer possível “ser/estar no”. Para Heidegger, “ser/estar em” significa o modo como o ser humano existe como o seu “aí” e o constitui através da compreensão de si próprio no mundo, juntamente com uma certa sintonia de si próprio no mundo. A gíria contemporânea exprime muito bem esta ideia de sintonia com o mundo ao falar dos “comprimentos de onda” em que as pessoas se encontram e das “vibrações” que emitem.

original

[STAMBAUGH, Joan. Thoughts on Heidegger. Washington, D.C: Center for Advanced Research in Phenomenology ; University Press of America, 1991]

Excertos de

Heidegger – Fenomenologia e Hermenêutica

Responsáveis: João e Murilo Cardoso de Castro

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