Marion (1989:157-160) – dizer “eu”

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(…) O Dasein, porque põe em jogo o ser nele, não pode senão pôr-se ele mesmo em jogo e, portanto, logo não pode senão dizer-se em pessoa, tal como não pode senão pôr-se em jogo como um eu: “O ente que chamamos Dasein, eu o sou a cada vez eu mesmo (bin ich je selbst), e isto enquanto poder-ser para o qual se trata de ser este ente. [SZ:58] Aqui, a possibilidade de dizer “eu sou” logo de declinar ser na primeira pessoa resulta da propriedade, para o Dasein, de se colocar em pessoa no jogo de seu próprio ser. O eu não teria nem interesse, nem legitimidade se, a título de “determinação existencial do Dasein”, não devesse e não pudesse “ser interpretado existencialmente”, isto é, se “egoísmo e ipseidade não fossem concebidos existencialmente”. Mas estes dois termos não permanecem equivalentes, como se um pudesse substituir o outro. Pelo contrário, a sua interpretação existencial exige que “o si mesmo (Selbst), que revela a re-ticência da existência resoluta, seja o solo fenomenal originário para a questão do ser do “Eu”. Só a orientação fenomenal sobre o sentido do ser do poder-ser-Si-mesmo (Selbstseinkönnen) autêntico põe a meditação em condição de elucidar que direito ontológico a substancialidade, a simplicidade e a personalidade podem reivindicar como características da ipseidade (Selbstheit)” [SZ:59]. Só o Si mesmo (ipseidade, Selbstheit) torna possível, através da sua absoluta coincidência consigo mesmo, que qualquer pronome pessoal seja dito, e assegura assim ao Eu um eventual “eu sou” a sua autêntica possibilidade; se o Si não determinasse o Eu, nenhum ente seria tal que pudesse pôr-se em jogo no seu próprio ser — precisamente porque nenhum “mesmo” seria então acessível. Inversamente, o Dasein, na sua postura de Impessoal (das Man), pretende ater-se ao Eu, ele próprio mera “aparência de um Eu” (scheinbare Selbst)” [SZ:60]. Logo, o Eu só pode dizer “eu sou” com perfeita legitimidade existencial caso se reduza ao fenômeno essencial do Ser (Selbst).

Original

Excertos de

Heidegger – Fenomenologia e Hermenêutica

Responsáveis: João e Murilo Cardoso de Castro

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