Luijpen (IFE:98-114) – o conhecimento humano como intencionalidade

A fenomenologia denomina o sujeito-como-cogito, o conhecimento humano, “intencionalidade”.1 Quando Husserl usou esse termo pela primeira vez,2 referiu-se expressamente a Brentano.3 O certo, porém, é que Husserl não tomou de Brentano senão a palavra, visto que lhe deu um significado inteiramente diverso do que o de Brentano. Na escolástica também ocorre a “intencionalidade”, empregada para designar as species impressae (imagens impressas), formas substitutas da realidade bruta. A escolástica concebia a realidade como separada do sujeito-como-cogito e esperava das imagens substitutas no sujeito que constituíssem a ponte entre este e a realidade. Se perguntarmos qual o modo de ser de tais imagens, a escolástica responderá que não têm um ser entitativo, mas só intencional. Isso quer dizer que todo o seu ser consiste em seu referir-se à realidade. Portanto, o sujeito-como-cogito separa-se primeiro da realidade, para só depois entrar em contacto com ela por meio das imagens impressas.

Quando Husserl emprega o termo “intencionalidade”, rompe com a ideia de um sujeito isolado do mundo e, portanto, “fechado”, descrevendo o sujeito-como-cogito, o próprio conhecimento, como direção-para e abertura-ao-mundo. O conhecimento, portanto, não é a “morada de imagens cognitivas” na interioridade do sujeito, mas presença imediata do sujeito como uma espécie de “luz” numa realidade presente. Como modo do ser-homem o conhecimento humano é uma maneira de existir, uma maneira de ser-envolvido-no-mundo, isto é, o sujeito mesmo. Logo, o sujeito não é “primeiro” e por si uma “coisa psíquica”, para “depois”, por meio de imagens cognitivas, entrar em relação com as coisas físicas. O conhecimento não é “algo entre duas coisas por si”, nem uma relação entre duas realidades diversas, mas o próprio sujeito envolvido no mundo4.

A bem dizer, a teoria das imagens sucedâneas pressupõe precisamente o que não quer admitir. De fato, não quer reconhecer que o sujeito-como-cogito está imediatamente presente à realidade, e, entretanto, essas imagens cognitivas são chamadas imagens da realidade. Como isso é possível, desde que o sujeito não está imediatamente presente à realidade ? Suponhamos que moram no sujeito imagens reais da realidade. Nesse caso, deve haver uma razão para se admitir que elas são realmente imagens, i. é, formas que representam a realidade. Entretanto, isso só pode ser afirmado se o sujeito está imediatamente presente à realidade, para se reconhecer, com base nessa presença, o verdadeiro ser-imagem das imagens. E quem concebe esta sempre pressuposta presença-à-realidade como a “morada de imagens no sujeito”, adia ao infinito a possibilidade de conhecer o ser-imagem dessas imagens. Imagens cognitivas só podem denominar-se imagens com fundamento na presença imediata do sujeito a uma realidade presente.5 Mas então deixam de ser necessárias.

Exclusão do “problema crítico”?

Em nosso primeiro capítulo já indicamos que o problema crítico, como formulado desde Descartes, não subsiste. Não tem sentido algum perguntar-se se existe realmente um mundo, porque essa questão só pode ser levantada a partir de uma filosofia constituída que não procura no conhecimento, tal como ocorre, os termos em que o problema crítico deve ser posto. O conhecimento humano só aparece como intencionalidade, o que implica que o conhecimento simplesmente não é o que é sem o mundo real. Portanto, a existência do mundo não deve e não pode ser provada,6 visto que o sujeito-como-cogito é, em si mesmo, relação ao mundo real.7 O “escândalo da filosofia” não consiste, como pensava ainda Kant, em ninguém até agora ter podido estabelecer claramente uma prova da existência do mundo, mas, como deixou claro Heidegger, no fato de que ainda se procure semelhante prova.

Mas, dir-se-á, não têm valor algum as razões que levaram Descartes a duvidar da existência real do mundo ? Não posso sonhar, e, sonhando, pensar que percebo um mundo real, não existente na realidade ? Não posso ter alucinações, temores e desejos, convencendo-me, contudo, de que todas as significações percebidas em alucinações, temores ou desejos são reais, quando de fato não o são ?

É evidente que posso fazer tudo isso. Mas a distinção estabelecida pelo próprio Descartes entre perceber e sonhar significa que implicitamente ele já conhecia a diferença entre um mundo percebido e um mundo sonhado. Sabia tacitamente que, ao perceber, estava envolvido no mundo real, o que não se dava quando sonhava ou tinha alucinações.8 Apesar disso Descartes punha “o mundo todo” entre parênteses, inclusive o mundo da percepção, que já afirmara real. Enquanto, porém, punha entre parênteses também o mundo da percepção, apagava a diferença entre perceber e sonhar, porque subsiste em virtude da diferença entre o mundo percebido e o sonhado. Descartes enchia o cogito de imagens imanentes, mas nelas o sujeito nunca pode “ver” se são imagens sonhadas ou reais.9 Quem toma a sério a ideia da intencionalidade não pergunta mais se o mundo que ele “vê” existe realmente. O que pergunta é se realmente “vê” e não sonha.10

Realismo fenomenológico

A ideia de intencionalidade da fenomenologia exclui o idealismo. O sujeito-como-cogito está, enquanto intencionalidade, dirigido àquilo que não é o próprio sujeito. Numa volta reflexiva ao conhecimento como realmente ocorre, o filósofo sempre depara com a insuperável facticidade do dado corporal. A densidade do que é dado de fato nunca pode ser anulada, pois que o sujeito-como-cogito é, por si mesmo, um modo de ser-no-mundo.11 O sujeito-como-cogito, por conseguinte, não é jamais mera atividade, mas sempre também “sensibilidade” para com uma realidade que não é o próprio sujeito. O homem cognoscente é simplesmente o guarda da realidade.12

O realismo, como concebido na tradição, torna-se igualmente impossível graças à ideia de intencionalidade.13 O mundo, como a fenomenologia o pensa, é o mundo real. O correlato do sujeito-como-cogito, existente, é o que se mostra (das Sichzeigende), o manifesto (das Offenbare); é o “desoculto”, o “fenômeno”, em suma: o próprio Sendo que aparece a fenomenologia chama “sentido”. O sentido tem alguma coisa a “dizer” ao sujeito-como-cogito, dado que é desocultação. Mas é desocultação porque o próprio sujeito não é pura passividade: é também, apesar de sua passividade, atividade, desde que é o deixar-se (Seinlassen) do sentido.14 O sentido é o desoculto. O sentido é o desoculto que se impõe ao sujeito no conhecimento.15 É o real ! Mas o fato de que o real se impõe não dá a ninguém o direito de conceber o real como em-si, porque o em-si “é” aquilo que, por princípio e definitivamente, está oculto, nada tendo, portanto, a “dizer” ao sujeito. O “real”, conceituado pelo realismo comum, não é “fenômeno”: “foi fenômeno” e tornou-se “realizado”. Isso significa que o em-si do realismo corrente é bem, primeiramente, o resultado do deixar-ser do sujeito e se liga a ele. Mas, em segundo lugar, está separado desse deixar-ser e, sendo uma realidade completamente original, é “posto” fora da existência.16 O sentido prende-se firmemente ao dizer-e que é o próprio sujeito-como-cogito, existente.17 O realismo faz abstração desse dizer-e e, apesar de tudo, julga poder chamar o Sendo de Sendo.

Do que ficou dito pode deduzir-se que o dilema tradicional “idealismo-realismo” não constitui um verdadeiro dilema. Não há inconveniente, portanto, em se chamar a fenomenologia uma filosofia realista, por não se entender o termo “realista” no sentido objetivista em que o realismo tradicional, re-presentacionista, o tomava. Mas, para distinguir com precisão o sentido em que a palavra é usada na fenomenologia e a realidade bruta do realismo representacionista, já se emprega atualmente, em geral, os termos em-si-para-nós ou ser-para-nós,18 com o que se exprime a própria independência-do-ser do sentido mundano perante o sujeito.

O mundo como sistema de significados “próximos” e “longínquos”

Chamamos “sentido” o correlato da intencionalidade ou do sujeito-como-cogito, existente. Denominemos agora “percepção” o ato do sujeito-como-cogito. Se concebermos a percepção como intencionalidade e analisarmos com exatidão essa forma de intencionalidade, surpreender-nos-emos com coisas que na psicologia tradicional da percepção levaram às mais estranhas hipóteses. Contudo, não é tão fácil descrever bem essas coisas. Por isso, desculpamo-nos se, a princípio, empregamos uma terminologia que depois se verá imprópria.

Quando percebo uma casa, não hesito em dizer que avisto realmente uma casa, embora só enxergue certo perfil da casa. Vejo a fachada, um dos lados e uma parte do telhado, mas não propriamente o fundo, o outro lado e a parte restante do telhado. Poderia, sem dúvida, ver as partes não vistas da casa, desde que mudasse meu ponto de vista no espaço em relação à mesma, mas com isso deixaria de ver o perfil que via antes. Em princípio, eu poderia perceber um número infinito de aspectos (Abschattungen, como diz Husserl), pois que posso ocupar infinitos pontos de vista em relação a ela.19 Um objeto de percepção, portanto, exibe um horizonte interno. Uma infinita pluralidade de mutáveis atos parciais envolve-me numa infinita pluralidade de fugazes aspectos. Isso vale para qualquer objeto de percepção.20 Em todo ato parcial e em todo perfil que atualmente aparece, entretanto, tenho consciência de que se trata sempre de perfis de uma e mesma coisa.21

Como, porém, se unem entre si os vários atos parciais do sujeito e os vários aspectos aparentes do objeto da percepção ? Seria um engano julgar que a percepção, tanto em seu lado subjetivo (noesis) como no objetivo (noema), tenha de consistir numa espécie de “adição”.22 A percepção como totalidade não consta de atos parciais colados entre si. Porque todo perfil da casa percebida se refere intrinsecamente a outros perfis,23 que aparecem se mudo de posição. Posso seguir as várias linhas de um perfil atual até um ponto em que não as vejo mais. Indicam, entretanto, a aparição de outro perfil, preso à minha futura percepção a partir de outro ponto de vista. Se se tivesse de “concluir” que de fato isso não se dá, ou que, no exemplo aduzido, o frontispício de uma casa não indica um fundo, é sinal de que de fato não percebi realmente uma coisa, ou, no nosso exemplo, uma fachada. Se percebo as costas de meu amigo e depois “verifico” que seu corpo não tem frente — não só a frente que eu esperava, mas toda e qualquer frente — não vi umas costas na realidade. Todo perfil atual indica, pois, intrinsecamente, um perfil que aparece em potência, e isso significa que, sem essa indicação, o perfil atual não é o que ele é. Também sem referência a possíveis percepções não existe realmente a percepção atual. Logo, o que chamamos percepção inclui não só atualidade, mas também potencialidade, e esses distintos momentos da percepção não são o que são quando não dizem respeito um ao outro. A potencialidade pertence à realidade do atual, e o atual pertence à realidade do potencial.24 O objeto da percepção, portanto, é um sistema de significados mutáveis, “próximos” e “longínquos”, correlativos aos sempre mutáveis momentos da atualidade e da potencialidade da percepção. Esta mostra, tanto em seu lado noético como no noemático, um horizonte espacio-temporal, interno, só accessível a uma análise intencional.25

Já é tempo, porém, de corrigir nossa terminologia. Não devemos dizer que o percipiente vê “propriamente” só certo perfil de uma casa, mas não outro. Não se diga tampouco que certo perfil está presente e outro não. Quem assevera tal coisa parte da suposição de que é realidade exclusivamente o momento da atualidade da percepção, deixando de considerar que esse momento da atualidade não é o que é sem o momento da potencialidade. Também esquece que a presença presente de um perfil que atualmente aparece não é o que é sem a presença ausente de um perfil a aparecer potencialmente. O percipiente vê presenças presentes e ausentes, o que só é possível porque a própria percepção inclui essencialmente momentos de atualidade e potencialidade.26

O objeto da percepção apresenta não só um horizonte interno, mas também um externo. Não é só a totalidade do objeto de percepção que deve ser exclusivamente acentuada, mas também a unidade da totalidade com todo o campo de percepção. Cada objeto aparece como certa “figura” sobre um fundo, sobre um horizonte de significados. A maçã que percebo como unidade e totalidade numa infinita série de perfis, só aparece como maçã real sobre o horizonte da mesa, da fruteira, do guarda-comidas ou do livro em que está. Uma maçã que não está numa mesa, numa fruteira, numa caixa de quitandeiro, na mão de uma criança ou pendurada em um galho, não aparecendo, portanto, sobre um fundo, não é simplesmente uma maçã real, o objeto de uma percepção real, mas uma imagem da fantasia, produto de um sonho ou de uma alucinação.27 A percepção mesma de uma maçã inclui essencialmente o campo de percepção, o fundo, o horizonte.

Desde que dirijo minha atenção à maçã e não à mão da criança, onde ela se acha, a maçã aparece como uma figura central, como um significado que, por assim dizer, ressalta de um fundo de significados. A mão, o braço, o corpo da criança, o assoalho sobre que esta se encontra, o quarto, a casa etc. são, entretanto, co-constitutivos da maçã real. Uma maçã que não tenha nenhum horizonte exterior não pode ser percebida e não é real.

Por conseguinte, a percepção é sempre percepção da coisa total, compreendida num campo mais amplo, o qual, por sua vez, é abrangido em um horizonte de significados mais distantes.28 O conjunto desse complicado sistema de sempre mutáveis significados “próximos” e “longínquos”, ligados aos sempre mutáveis momentos de atualidade e potencialidade da percepção, eis o que se chama “mundo” na fenomenologia.

Crítica da psicologia tradicional da percepção

Uma vez vista a unidade original da estrutura figura-horizonte, dada na percepção, compreende-se sem dificuldade que a explicação psicológica da percepção pelos adeptos da psicologia de elementos não faz justiça a esse fenômeno como ocorre realmente. Tais psicólogos admitem que a percepção é construída de sensações elementares,29 insulares e punctiformes, causadas por estímulos físico-químicos.

Esta explicação não abre perspectivas, visto que jamais se encontraram sensações elementares. Além disso, indicando-se uma constelação de estímulos, não se explica a percepção I assim como se produz na realidade, nem se exprime o que se passa realmente no ato de perceber. Uma cor, p. ex., nunca é apenas uma cor na percepção, mas sempre a cor de alguma coisa.30 Há uma enorme diferença entre o vermelho lanoso de um tapete, o viscoso e grudento vermelho do sangue, o refrescante e radioso vermelho de um rosto sadio e sanguíneo e o sedutor vermelho de uns lábios pintados. Essa diferença não se explica de modo algum pelos estímulos físico-químicos.31 É a totalidade do objeto que se apresenta na percepção, não aparecendo nela o objeto como um aglomerado de excitantes, mas como uma significação dada. Um amontoado de estímulos é outra coisa que a ira ou a dor que leio no rosto de meu semelhante: percebo a ira e a dor como significados de um rosto.32 A redução de um sentido a certa constelação de estímulos implica que jamais posso perceber que uma paisagem ou um rosto sejam alegres, tristes, animados, melancólicos, monótonos ou insípidos.33 Um rosto alegre e feliz não se define pelas propriedades físico-químicas de uma constelação de estímulos, e, contudo, tenho a ideia de ter visto um rosto alegre e feliz.

Mas, também visto do lado do sujeito, há muitas dificuldades contra a explicação psicológica da percepção pelos elementaristas. O sujeito percipiente reduz-se a um aglomerado de impressões insulares, punctiformes. Os elementaristas dizem muito bem não ser possível mostrar para cada uma dessas impressões um estímulo como causa. Quando leio um livro ou entabulo uma conversação, não recebo uma impressão particularizada de cada letra escrita ou som falado; não obstante, leio e ouço palavras e frases. Da parte posterior da mesa e de sua parte inferior meu “aparelho receptor e registrador”, aparelho dos sentidos, não recebe as “mensagens” dos estímulos; contudo, tenho ideia de estar percebendo uma mesa. Ao perceber minha água-furtada, só recebo estímulos das paredes que estão diante de mim, e a meu lado, mas não da parede de trás nem do telhado; entretanto, sei que meu quarto tem quatro paredes e é uma água-furtada.

Tais dificuldades não levaram os elementaristas a abandonar sua teoria dos estímulos. Julgaram poder superá-las com a introdução de uma nova teoria: a hipótese dos complementos por meio da associação e reprodução, ou outras invenções semelhantes.

Para eles, fica claro o seguinte: a percepção pode não ser percepção da totalidade da realidade; a percepção da totalidade pode não ser primária; deve, porém, obrigatoriamente ser construída de elementos psíquicos. Com outras palavras, a psique deve ser composta como uma coisa da natureza, os conteúdos da consciência devem ser elementos e tratados como se costumam tratar os elementos nas ciências naturais. Eis a incondicional exigência para o caráter “científico” da psicologia.34

Entretanto, a teoria da associação e reprodução, exigida como complemento pela teoria dos estímulos, tem de pressupor o que quer explicar. A associação, consoante a terminologia de Claparède,35 concebe-se como um “cordão” psíquico ligando as impressões punctiformes. Dada a interconexão das impressões, um estímulo exterior muito fragmentário basta para reproduzir o conjunto ou totalidade do percebido. Assim deve poder manter-se o primado das impressões isoladas sobre a percepção da totalidade.

Esta teoria, como dissemos, pressupõe o que pretende explicar. As impressões sempre se associam, de muitos modos, com outras impressões. Portanto, a reprodução de um conjunto pode fazer-se de várias maneiras. Mas como sucede que justamente este conjunto se reproduza ? Por um estímulo fragmentário poderiam formar-se diversas totalidades. Como “sabem” as impressões atuais que impressões suscitar para o complemento do conjunto ? Se é sem “razão” ou casualmente que estas e não aquelas impressões são evocadas da memória para complemento, a percepção não será explicada, porque, com o acaso, nada se explica.36 Se, pelo contrário, há uma “razão” para reproduzir esta e não aquela totalidade, supõe-se certo “saber” da totalidade, donde se deduz que a explicação pela associação se torna supérflua, porque já está pressuposto o conhecimento da totalidade a esclarecer.37

Até mesmo a psicologia dos elementos precisa, pois, afirmar a prioridade do objeto percebido, visto que a teoria da associação e da reprodução pressupõem tal coisa.38 Atendo-nos à sensação tal como ocorre, cumpre afirmar a prioridade do conjunto; se não o fizermos, afirmamos a mesma prioridade implicitamente, pelo fato de a pressupormos.

Isso nos traz de volta a nosso ponto de partida: é contraditório querer substituir a experiência comum pela das ciências naturais,39 ou pretender pôr em lugar do mundo da experiência cotidiana um sistema de significados descoberto por alguma ciência.40 A reflexão filosófica exige uma volta à experiência original e ao mundo original, despojados da superestrutura de teorias acrescentadas pelas ciências. Esta volta se chama “redução fenomenológica”.

A redução fenomenológica e o “mundo vivido”

A intenção de Husserl com a fenomenologia foi sempre a de encontrar uma base, um fundamento, para qualquer enunciado das ciências positivas. Esse desiderato implica a convicção de que as afirmações das ciências precisam de um fundamento, ou seja, que não o possuem em si mesmas. Tal coisa não quer dizer, para Husserl, que as ciências devem ser rejeitadas, mas que no cultivo delas se acham latentes e estão, em princípio, já respondidas muitíssimas questões, se bem que as ciências, em si, nem sequer as possam pôr. O físico como físico não pergunta a respeito da essência de seu conhecimento físico, não questiona qual o sujeito e o objeto específico da física, nem, tampouco, quais as condições de possibilidade de seu relacionamento.41 Como físico, pode permitir-se não suscitar essas questões, mas, nesse caso, há um ponto de vista a partir do qual se pode e se deve dizer que a ocupação do físico é “ingênua”.42 Evidentemente, isso também não significa que o físico não é crítico, mas que ainda é possível e necessário um modo totalmente diverso de ser crítico. O físico é crítico em relação à experiência científica, mas não indaga o que é propriamente a experiência científica e, muito menos, o que é a experiência em geral.43

A filosofia, portanto, deve mostrar o fundamento último dos juízos científicos. Trata-se da {ciência do radical},44 ou antes, que deve ser tal. Husserl, com efeito, está convicto de que a filosofia não o é de fato.45 Cabe ao filósofo exprimir o que é essencialmente a experiência. Mas a filosofia incorreu num impasse, porque também ela adota uma ideia da experiência que não pode seguramente valer como base dos juízos científicos. Desde Descartes e Locke admite-se na filosofia a convicção de que a experiência deve ser representação e que o sistema de representações objetivas há de ser encontrado nas ciências naturais. A filosofia afundou no cientismo, de modo a não poder ser mais encarada como ciência do radical. O legítimo filosofar é algo totalmente diverso do pensamento da ciência positiva,46 o que os filósofos deixaram de ver. Portanto, o brado de Husserl, “volta às próprias coisas”, não pretende dizer que as ciências não se ocupam com as próprias coisas, mas visa a filosofia. Esta se afastou de sua realidade.47

A procura da autêntica ou filosófica concepção a respeito do cogito, do pensamento e da experiência leva Husserl à sua ideia de intencionalidade, cujas implicações descrevemos em parte. Semelhantes implicações já nos puseram de certo modo na pista da resposta sobre o significado da “redução fenomenológica”. Antes, porém, de fixar seu sentido exato, demore-mo-nos um pouco numa concepção da redução fenomenológica ultrapassada na própria fenomenologia.

Enquanto Husserl definia como intencionalidade o sujeito-como-cogito, punha entre parênteses a existência de fato do sentido mundano, para o qual se orienta o sujeito. Eis a primeira acepção em que Husserl usou o termo “redução”: Einklammerung des Seins (colocação do ser entre parênteses).48 Essa redução consistia em que Husserl retinha seu juízo sobre a existência real do sentido mundano.49 O que o levou a essa suspensão do juízo ?

Conforme De Waelhens, a causa foi a teoria do conhecimento do século XIX, em luta com o problema crítico, ou seja, com a questão de saber se uma realidade exterior corresponde aos conteúdos, noções e conceitos do cogito retirado, isolado e fechado em si mesmo.50

Segundo o idealismo, o sentido é um conteúdo do cogito, não distinto dele em seu ser; de acordo com o realismo, o sentido é totalmente distinto do cogito e seu ser é perfeitamente estranho a ele. Husserl não quis se imiscuir na controvérsia entre realistas e idealistas, porque suspeitava que iria encalhar aí. Pensou poder escapar disso com sua fenomenologia, i. e, poder executar suas análises intencionais, mesmo sem optar por nenhuma das duas direções, sem se pronunciar a respeito do ser do sentido: eis o motivo de pô-lo entre parênteses. O próprio Husserl ainda não vira que, definindo o conhecimento como intencionalidade, tal como ele a entende, impossível se torna “pôr entre parênteses” o ser do sentido. Aquele que admite a intencionalidade, já decidiu sobre o ser do sentido. Até o filósofo não vira que a colocação do ser do sentido entre parênteses só é possível em se partindo da pressuposição de que o cogito é uma realidade isolada, repleta de conteúdos. Mas essa hipótese precisamente é rejeitada pela afirmação da intencionalidade.51

Só aos poucos Husserl se foi tornando consciente da inconsistência de suas concepções. A consequência é que nas suas obras posteriores aparecem sempre menos os parênteses do ser do sentido, para afinal desaparecerem completamente. Em Heidegger e Merleau-Ponty não se encontram mais vestígios deles.

Mas enquanto ocorrem sempre menos os parênteses em Husserl, acentua ele sempre mais a necessidade de uma redução fenomenológica. Isso significa que suas ideias a respeito da redução se modificaram. O filósofo permanece fiel à finalidade de sua fenomenologia: encontrar um fundamento para todo e qualquer enunciado científico. Pouco a pouco foi vendo que todos os enunciados das ciências pressupõem uma experiência muito mais fundamental que a científica, ou seja, que, sem a conhecer explicitamente, vivem dessa experiência muito mais fundamental e, exatamente por isso, sabem com precisão sobre o que falam.52 Essa experiência muito mais fundamental é o sujeito-como-cogito, com suas numerosas atitudes (Einstellungen) diferentes, e o correlativo mundo vivido (Lebenswelt).53

Concebida como volta à nossa mais original experiência de nosso mais original mundo, a redução fenomenológica é essencial para a filosofia fenomenológica. Essa redução é realizada por quem se coloca dentro da existência e reconhece as implicações disso. Executando-a, vai-se de fato achar uma base para todo e qualquer enunciado científico. Assim, se se trata da percepção de uma árvore florida no prado, posso invocar em meu socorro várias ciências, mas só sei o que significam todos os resultados de todas as investigações científicas conhecendo o significado da percepção “comum” de uma árvore florida no prado. Não falassem as ciências afinal do mundo em que o sol se levanta e se deita, do mundo em que há diferença entre um morto e um assassino, do mundo em que existem moças bonitas e rapazes guapos, de um mundo em que, pelo simples fato de ir às férias, posso chegar a saber o que é o mar, um rio ou uma montanha, nesse caso nem os mais inteligentes cientistas saberiam sobre o que falam propriamente.54 As ciências não têm nenhum fundamento em si mesmas. Não sabem sobre o que falam, a menos que admitam serem afinal simples momentos explicativos de uma experiência muito mais original que a científica e de um mundo mais original que o desvendado pelas ciências 55. O mundo primariamente real e objetivo é aquele em que o físico está bem ou mal casado, no qual tem ou não tem amigos, sente calor ou frio, pouco importando o que diz o termômetro, e no qual, pouco antes do pôr do sol, compra ainda um livro de astronomia onde se lê que o sol não se põe, mas está parado.56

No mundo vivido há uma grande diferença entre o vermelho brando de um tapete, o vermelho viscoso do sangue coalhado, o sadio vermelho de um rosto jovem e viçoso e o vermelho sedutor de uns lábios pintados 57. Se na ciência se fala dos “movimentos da laringe e ondas sonoras”, o cientista só saberá que com isso discorre sobre a fala, admitindo saber o que é falar, devido ao fato de já ter falado com alguém. Se na ciência se fala de “certos movimentos das fossas nasais e certas contrações dos cantos da boca, junto com um piscar de olhos”, só sabe o cientista que se trata de um sorriso pelo fato de já alguma vez ter experimentado o que significa alguém lhe haver sorrido.

A volta às próprias coisas é o retorno ao mundo vivido, e ela inclui que o sujeito-como-cogito, existente, com suas muitas atitudes, seja conhecido como a mais original experiência do mundo.58 Eis em que consiste a redução fenomenológica. A experiência do mundo vivido foi e é caracterizada pelas ciências como “puramente” subjetiva e relativa. Na realidade, entretanto, é o fundamento último (letztbegruendende). É por essa experiência que os que se ocupam com as ciências positivas sabem sobre o que falam. Não se pode, pois, querer substituir os significados do mundo vivido pelo sistema de significados descobertos pelas ciências, pondo a experiência da ciência positiva em lugar da experiência mais original que sustenta a primeira.59 O cientismo é uma filosofia da experiência que esquece sua própria origem,60 e uma ciência sem filosofia não sabe sobre que fala.61

  1. Husserl, E., Ideen zu einer reinen Phänomenologie und phänomenologischen Philosophie, Erstes Buch, Allgemeine Einführung in die reine Phänomenologie, ed. Walter Biemel, Husserliana III, Haag, 1950., pp. 79-80, 203-212, 357-358. “A propriedade fundamental dos modos de consciência em que vivo como ‘eu’ é a chamada intencionalidade”. E. Husserl, Cartesianische Meditationen und Pariser Vorträge, (Husserliana I), p. 13.[]
  2. ”Falaremos, pois… de ‘vivência’ no sentido fenomenológico acima fixado. O adicionado qualificativo intencional designa o caráter essencial que é comum à classe de vivência a ser limitada, a propriedade da intenção referente à maneira da representação ou de qualquer outro modo análogo de se relacionar objetivamente”. E. Husserl, Logische Untersuchungen, II Band, I Teil, Halle a.d.S., 1928, p. 378.[]
  3. E. Husserl, op. cit., p. 380.[]
  4. ”Note-se bem que não se trata aqui de uma relação entre um conhecimento psicológico — chamado conhecimento — e outro ser-aí real — chamado objeto — ou de uma ligação psicofísica e, de qualquer modo, real, que se estabelecesse na realidade objetiva entre um e outro. A questão aqui e em todos os lugares é a respeito das vivências puramente fenomenológicas, i. e., da sua essência e daquilo que está incluído em sua essência a priori, com absoluta necessidade”. Ideen, I, p. 80.[]
  5. ”A coisa espacial vista por nós é, apesar de toda sua transcendência, percebida, algo conscientemente dado em sua corporalidade. Em seu lugar não é dada uma imagem ou um sinal, pois não se atribui à percepção uma consciência de sinal ou imagem”. Ideen, I, pp. 98-99.[]
  6. ”Vê-se… como o problema da existência do mundo exterior não apresenta, rigorosamente falando, nenhum sentido”. Marcel, G., Journal Méthaphysique, IIa ed., Paris, 1935., p. 26.[]
  7. Cf. notas do cap. I, n.° 168.[]
  8. ”Porque se posso falar de ‘sonhos’ e da ‘realidade’, interrogar-me quanto à distinção do imaginário e do real, e pôr em dúvida o ‘real’; é porque essa distinção já está feita por mim antes da análise, é porque tenho uma experiência tanto do real como do imaginário, e o problema então não é procurar como o pensamento crítico pode dar-se equivalentes secundários dessa distinção, mas explicitar nosso saber primordial do ‘real’, descrevendo a percepção do mundo como o que funda para sempre nossa ideia de verdade”. Merleau-Ponty, Phénoménologie de la Perception, Avant-propos, p. XI.[]
  9. ”Se eu dissesse com o sensualismo que só existem ‘estados de consciência’ e procurasse distinguir de meus sonhos minhas percepções mediante ‘critérios’, falharia ao fenômeno do mundo”. Ibid.[]
  10. ”Não se deve, pois, perguntar se percebemos verdadeiramente um mundo; cumpre dizer, ao contrário: o mundo é aquilo que percebemos”. Ibid.[]
  11. ”Mas, visto que, ao contrário, estamos no mundo, e visto que nossas reflexões se realizam no fluxo temporal que buscam captar…, não há pensamento que abarque todo o nosso pensamento”. Ibid. Avant-propos, p. IX.[]
  12. ”O homem é o pastor do ser”. M. Heidegger, Über den Humanismus, p. 19.[]
  13. ”Se, ao contrário, quiséssemos definir sem prejuízo o sentido filosófico da psicologia da Forma, dever-se-ia dizer que, revelando a ‘estrutura’ ou a ‘forma’ como um ingrediente irredutível do ser, ela repõe em questão a alternativa clássica da ‘existência como coisa’ e da ‘existência como consciência’, ao estabelecer uma comunicação e como que uma mistura de objetivo e do subjetivo…” Merleau-Ponty, Sens et Non-sens, pp. 171-172.[]
  14. M. Heidegger, Vom Wesen der Wahrheit, 3.a ed., Frankfurt a. M., 1954, pp. 14-17.[]
  15. ”O enunciado é um ser para a própria coisa que é. E o que é legitimado pela percepção ? Nada mais do que o que o próprio Sendo é, o qual tinha sido pensado na enunciação… O próprio Sendo pensado mostra-se como aí mesmo é, a saber, que na sua ipseidade é tal como sendo mostrado, descoberto, na enunciação”. Heidegger, M., Sein und Zeit, 6.a ed., Tübingen, 1949, p. 218.[]
  16. ”Pela primeira vez, a meditação do filósofo é suficientemente consciente para não realizar no mundo e antes dela seus próprios resultados”. Merleau-Ponty, Phénoménologie de la Perception, Avant-propos, p. XV.[]
  17. ”é pelo conhecimento… que o ser bruto ascende ao plano da verdadeira existência, e nossa consciência de existir está pressuposta na da existência do mundo”. P. Foulquié, L’existentialisme, Paris, 1953, p. 38.[]
  18. Merleau-Ponty, Phénoménologie de la Perception, Avant-propos, p. V; Merleau-Ponty, Sens et Non-sens, p. 187.[]
  19. ”Na necessidade da essência pertence a uma ‘múltipla’, continuamente unitária e autoconfirmante consciência da experiência de uma mesma coisa, um múltiplo sistema de continuadas diversidades de aparências e aspectos, nas quais, se vigoram atualmente, se representam ou aparecem na consciência da identidade e em determinadas continuidades, todos os momentos objetivos da percepção que possuem o caráter de autonomia corporal”. Ideen, I, p. 93.[]
  20. Ideen, I, pp. 100-101.[]
  21. ”Partamos de um exemplo. Vendo sempre esta mesa, mas rodeando-a, mudando sempre minha posição no espaço, tenho continuamente consciência do ser-aí corporal de uma e mesma mesa, idêntica, imutável em si. A percepção da mesa, porém, está sempre mudando: é uma continuidade de percepções em mudança”. Ideen, I, p. 92.[]
  22. ”Os pedaços e fases da percepção não se colam exteriormente um ao outro…” E. Husserl, Cartesianische Meditationen und pariser Vorträge, (Husserliana I). P. 17.[]
  23. E. Husserl, Erfahrung und Urteil, Redigiert und herausgegeben von L. Landgrebe, Hamburg, 1948, pp. 26-27.[]
  24. ”Tão essencial como a atualidade da vida é a potencialidade, que não se reduz a uma vácua possibilidade. Todo cogito — como, p. ex., uma percepção exterior ou uma recordação — traz em si mesmo, podendo ser descoberta, uma potencialidade imanente de vivências possíveis, referíveis ao mesmo objeto intencional e a ser realizadas a partir do eu”. E. Husserl, Cartesianische Meditationen und Pariser Vorträge, p. 18.[]
  25. E. Husserl, op. cit., p. 19.[]
  26. Merleau-Ponty, M., La Structure du Comportement, 3.a ed., Paris, 1953., pp. 200-203[]
  27. ”Quando a teoria da Gestalt nos diz que uma figura sobre um fundo é o dado sensível mais simples que podemos obter, não se trata de um caráter contingente da percepção de fato, que nos deixaria livres, numa análise ideal, de introduzir a noção de impressão. É a própria definição do fenômeno perceptivo, aquilo sem o qual um fenômeno não pode chamar-se percepção”. Merleau-Ponty, Phénoménologie de la Perception, p. 10.[]
  28. ”A visão é um pensamento sujeito a certo campo e é isso que se denomina um sentido”. Merleau-Ponty, Phénoménologie de la Perception, p. 251.[]
  29. Merleau-Ponty, Μ., Phénoménologie de la Perception, 14.a ed., Paris, 1945., p. 10.[]
  30. ”Uma cor nunca é simples cor, mas cor de certo objeto, e o azul de um tapete não seria o mesmo azul se não fosse um azul lanoso”. Merleau-Ponty, Phénoménologie de la Perception, p. 361.[]
  31. A chamada “hipótese da constância”, a teoria segundo a qual os estímulos de determinada força provocam em todo caso uma “reação” constante, contrasta com os fatos reconhecidos pelos próprios psicólogos. Cf. Merleau-Ponty, Phénoménologie de la Perception, p. 14.[]
  32. ”Definindo uma vez mais o que percebemos pelas propriedades físicas e químicas dos estímulos que podem atuar sobre nossos aparelhos sensoriais, o empirismo exclui da percepção a cólera ou a dor que, entretanto, leio num rosto; a religião cuja essência apreendo, não obstante, numa hesitação ou numa reticência; a cidade cuja estrutura, apesar de tudo, conheço na atitude do guarda civil ou no estilo de um monumento”. Merleau-Ponty, Phénoménologie de la Perception, p. 32.[]
  33. Merleau-Ponty, Phénoménologie de la Perception, pp. 31-32.[]
  34. ”Está-se certamente convencido de que, considerado, em princípio, na sua generalidade, o método de todas as ciências experimentais é um só, e, desde logo, o mesmo na psicologia como na ciência da natureza física”. E. Husserl, Philosophie als strenge Wissenschaft, em: Logos, I (1910-1911), p. 309.[]
  35. E. Claparède, L’association des Idées, Paris, 1913, p. 7.[]
  36. Merleau-Ponty, Μ., Phénoménologie de la Perception, p. 22.[]
  37. ”No momento em que a evocação se torna possível, fica sendo supérflua, porque o trabalho que dela se espera já está feito”. Merleau-Ponty, Phénoménologie de la Perception, p. 27.[]
  38. ”Se nos atemos aos fenômenos, a unidade da coisa na percepção não é construída pela associação, mas, condição da associação, precede as informações que a verificam e determinam, ou seja, precede a si mesma”. Merleau-Ponty, Phénoménologie de la Perception, p. 24.[]
  39. Merleau-Ponty, Μ., Phénoménologie de la Perception, 14.a ed., Paris, 1945., Avant-propos, pp. II-V.[]
  40. ”Como vimos, não se pode reconstituir assim, combinando situações ideais (estímulos, receptores, circuitos associativos), a estrutura da experiência perceptiva”. Merleau-Ponty, La Structure du Comportement, p. 235.[]
  41. E. Husserl, Philosophie als strenge Wissenschaft, em: Logos, I (1910-1911), pp. 299-300.[]
  42. ”Toda ciência da natureza é ingênua por seus pontos de partida”. E. Husserl, art. cit., p. 298.[]
  43. ”Mas, por mais que este modo de crítica da experiência nos possa contentar, enquanto a nossa posição estiver dentro da ciência natural e o nosso pensamento orientado por ela — pode e deve existir ainda uma crítica da experiência de caráter inteiramente diverso, pondo em dúvida toda e qualquer experiência e, ao mesmo tempo, o pensamento científico-experimental”. E. Husserl, art. cit., p. 299.[]
  44. E. Husserl, art. cit., p. 340.[]
  45. E. Husserl, art. cit., pp. 289-291.[]
  46. ”A filosofia, porém, está numa dimensão totalmente nova. Precisa de pontos de partida completamente novos e de um método de todo novo, distinto por princípio de toda ciência ‘natural’”. E. Husserl, Die Idee der Phänomenologie, Fünf Vorlesungen, Husserliana II, p. 24.[]
  47. A. de Waelhens, De la phénoménologie à l’existentialisme, em: Le choix, le monde, l’existence, Grenoble-Paris, s. d., p. 42.[]
  48. Husserl, E., Ideen zu einer reinen Phänomenologie und phänomenologischen Philosophie, Erstes Buch, Allgemeine Einführung in die reine Phänomenologie, ed. Walter Biemel, Husserliana III, Haag, 1950.; p. 65.[]
  49. ”Em toda investigação epistemológica… cumpre realizar a redução epistemológica, isto é, marcar com o índice da exclusão toda transcendência que a acompanha, ou com o índice da indiferença, da nulidade epistemológica, com um índice que diz: a existência de todas essas transcendências, quer creia eu nelas ou não, não me interessa aqui, nem é aqui o lugar de julgar tal coisa: isso está fora de questão”. E. Husserl, Die Idee der Phänomenologie, p. 39.[]
  50. A. de Waelhens, Une philosophie de l’ambiguïté, L’existentialisme de Maurice Merleau-Ponty, Louvain, 1951, pp. 89-93.[]
  51. A. de Waelhens, op. cit., pp. 89-90.[]
  52. A. de Waelhens, op. cit., p. 91.[]
  53. ”… todas as finalidades, até as teóricas das ciências ‘objetivas’, porque nelas estão as ‘evidências’ que o cientista usa continuamente, ou, falando de modo universal, o mundo das coisas evidentemente compreensíveis e tidas como verdadeiras e reais, à maneira da {doxa}, é o solo no qual primeiramente se pode desenvolver qualquer ciência objetiva; com uma palavra, o mundo vivido, ‘puramente’ subjetivo e relativo, em seu fluxo nunca suspenso de valores do ser, cujas transformações e correções é — por mais paradoxal que isso pareça — o solo em que a ciência objetiva constrói seus quadros de ‘definitivas” e ‘eternas’ verdades, de juízos válidos para sempre e para todos”. E. Husserl, Die Krisis der Europäischen Wissenschaften und die transzendentale Phänomenologie, Husserliana VI, p. 465.[]
  54. A. de Waelhens, cf. nota 41.[]
  55. E. Husserl, op. cit., pp. 126-129.[]
  56. A. de Waelhens, Signification de la phénoménologie, em: Diogène V (1954), p. 59.[]
  57. Phénoménologie de la Perception, p. 361.[]
  58. ”Voltar às próprias coisas é voltar a esse mundo antes do conhecimento de que o conhecimento fala sempre e a respeito do qual toda determinação científica é abstrata, significativa e dependente, como a geografia em relação à paisagem onde antes aprendemos o que é uma floresta, um prado ou um rio”. Merleau-Ponty, Phénoménologie de la Perception, Avant-propos, pp. II-III.[]
  59. ”Todo o universo da ciência se constrói sobre o mundo vivido, e se queremos pensar a própria ciência com rigor, apreciando-lhe exatamente o sentido e o alcance, cumpre despertar primeiro essa experiência do mundo da qual ela é a expressão segunda”. Merleau-Ponty, Phénoménologie de la Perception, ibid.[]
  60. ”A ciência clássica é uma percepção que esquece suas origens e se julga acabada”. Merleau-Ponty, Phénoménologie de la Perception, p. 69.[]
  61. ”Uma ciência sem filosofia não saberia, em rigor, de que fala . Merleau-Ponty, Sens et Non-sens, p. 195.[]