Ouvir o que diz (physis) esta primeiríssima palavra do ser exige dois movimentos sucessivos. Em primeiro lugar, um retorno à língua: trata-se de traduzir (übersetzen) a própria palavra grega, quer dizer de nos apresentarmos diante dela, para a ouvir «em modo grego» (WhD (GA8), pp. 140-141: griechisch gehört) — único meio de circunscrever o seu campo original de significação. Em segundo lugar, e apoiados no fundamento dessa clarificação semântica, um avanço em direção ao pensamento: tratar-se-á então de determinar, à luz de certos fragmentos de Heráclito, o que constitui a essência ou a verdade da φύσις (physis) assim definida. (MZHPO:43-44)
Noutros termos, o que constitui aqui a especificidade de Heidegger, não é tanto uma concepção diferente dos Gregos (em todo o caso, não em primeiro lugar) quanto uma metodologia nova a seu respeito. Na interpretação que acabamos de apresentar, a língua (griechische Sprache) e o pensamento dos Gregos (griechische Denken) são compreendidos a partir da língua (Sprache) e do pensamento modernos (neuzeitliche Denken), e só são iluminados por estes últimos; todo o esforço de Heidegger consiste, pelo contrário, em definir um novo modo de leitura (que é também uma nova «ética» (Ethik)) na relação com os textos gregos. Isto exige um trabalho em três tempos: 1) a «suspensão» (Epoche) radical do «pensamento habitual» (gewöhnliche Denken), compreendido como pensamento representativo dominado pelo entendimento (Cf. GA55:117-118), 2) o salto para o «pensamento essencial» (wesentliche Denken) (o único que permite pensar «em grego»), o que implica que se saiba aprender a «perceber simplesmente a palavra (Wort)» (GA55:123), 3) o retorno, a partir desta origem reencontrada, à representação ou interpretação moderna, retorno esse que é o único que permite reconhecer o caráter derivado e parcial desta. (MZHPO:46-47)