Henry (1987) – Vida

Nossa Tradução

Assim sendo, de que vida se fala aqui? Qual é esta força de existência que não cessa de se manter e de crescer? De maneira alguma a vida que forma o tema da biologia, o objeto de uma ciência, estas moléculas e estas partículas que o cientista busca alcançar através de seus microscópios, de onde elabora a natureza pelo viés dos procedimentos múltiplos, a fim de construir laboriosamente um conceito sempre mais adequado mas sempre sujeito à revisão. De sorte que esta vida que estudam os biologistas, não se saberá jamais o que ela é, senão ao termo ideal e como tal jamais alcançado do progresso científico. Mas se nós não temos hoje ainda senão uma noção imperfeita do que é a vida biológica, convém notar que a humanidade todavia viveu durante milênios sem dela ter a menor ideia, sem se duvidar de sua existência — sem que qualquer das modificações da vida humana precisamente, sua manutenção, seu crescimento, sua cultura, nada lhe deva.

A vida de que falamos não se confunde portanto com o objeto de um saber científico, objeto cujo conhecimento seria reservado àqueles que estão de posse deste saber e que tiveram que adquiri-lo. Ao invés, ela é o que todo mundo sabe, sendo isso mesmo que somos. Mas como “todo o mundo”, quer dizer cada um enquanto está vivo, pode saber o que é a vida, nem que seja na medida que a vida se sabe ela mesma e onde este saber original de si constitui sua essência própria? Pois a vida se sente e se experiencia a si mesma de sorte que nada há nela que ela não experiencie e nem não sinta. E isso porque o fato de se sentir a si mesmo é justamente o que faz dela a vida. Assim tudo que porta em si esta propriedade maravilhosa de se sentir a si mesmo está vivo, enquanto tudo o que disto se encontra desprovido não é senão morte. Esta capacidade de se experienciar a si mesmo e de se sentir a si mesmo que constituiria justamente um ser vivo — não no sentido biológico mas no sentido de uma vida verdadeira —, é a vida fenomenológica absoluta cuja essência consiste no fato mesmo de se sentir ou de se experienciar a si mesmo, e que podemos ainda denominar “subjetividade”.

Agora, se dizemos que esta propriedade extraordinária de se experienciar si mesmo é um saber e sem dúvida o saber sob a forma mais profunda, e que assim a vida é nela mesma, enquanto vivente, este saber original, como se fala também e sobretudo de saber a respeito da ciência, importa precisar de que sorte de saber se trata nos dois casos e como um se distingue do outro, se não se quer que o debate relativo à cultura e a barbárie, que se mantêm tanto uma como outra em uma relação essencial, positiva ou negativa, ao saber em geral, se perda no vago.

Original

(MH1987)

Heidegger – Fenomenologia e Hermenêutica

Responsáveis: João e Murilo Cardoso de Castro

Twenty Twenty-Five

Designed with WordPress