A intermediação total significa que o intermediante, enquanto intermediante, suspende-se. Isso quer dizer que a reprodução (no caso de peça teatral ou de música, mas também na palestra épica ou lírica), não será, como tal, temática, mas através dela, perpassando-a, e nela, a obra torna-se representação. Veremos que a mesma coisa vale para o caráter de acesso e de encontro, em que, construções e quadros se representam. Também aqui o acesso, como tal, não será ele mesmo temático, mas, ao contrário, também não é o caso de que se tenha de abstrair dessas relações de vida, a fim de compreender a própria obra. Antes, está nelas próprias. O fato de que existem obras que se originam num passado, do qual penetram no presente como monumentos duradouros, ainda não torna o seu ser, nem de longe, um objeto da consciência estética ou histórica. Enquanto mantêm-se em suas funções, elas são contemporâneas a todo e qualquer presente. Mesmo quando, como obras de arte, ainda somente encontram seu lugar nos museus, não estão totalmente alheados de si mesmas. Não somente porque uma obra de arte jamais deixa apagar inteiramente os indícios de sua função originária, tornando possível ao perito, em reconhecendo-as, vir a restaurá-la, — a obra de arte, que recebe a indicação de seu lugar na justaposição de uma galeria, continua a ser sempre uma origem própria. Dá validade a si mesma, e como o faz — ao “matar” uma outra ou tornar-se bom complemento de uma outra — é algo ainda de si mesma. VERDADE E MÉTODO PRIMEIRA PARTE 2.
Com o fim de dar uma idéia antecipada da questão e de relacionar as conseqüências sistemáticas do que desenvolvemos até aqui com a ampliação que experimenta agora o nosso questionamento, faremos bem se nos ativermos de imediato à tarefa hermenêutica que nos coloca o fenômeno da arte. Por mais que tenhamos conseguido evidenciar, que a “diferenciação estática” é uma abstração, que não está em condições de suspender a pertença da obra de arte ao seu mundo, também continua sendo inquestionável, que a arte jamais é apenas passado, mas consegue superar a distância dos tempos através da presença de seu próprio sentido. Dessa maneira, o exemplo da arte nos mostra, em ambas as direções, um caso muito qualificado da compreensão. A arte não é mero objeto da consciência histórica, no entanto a sua compreensão co-implica sempre uma mediação histórica. Como se irá determinar, face a isso, a tarefa da hermenêutica? VERDADE E MÉTODO PRIMEIRA PARTE 2.
Este é o ponto em que Hegel nos aparece como um testemunho importante. Na Fenomenologia do espírito mostrou como faz suas experiências a consciência que quer adquirir certeza de si mesma. O objeto da consciência é o em-si, só pode ser conhecido tal como se representa para a consciência que experimenta. Desse modo a consciência que experimenta faz precisamente esta experiência: o em-si do objeto é em-si “para nós”. VERDADE E MÉTODO SEGUNDA PARTE 2.
Partimos da base de que na acepção lingüística da experiência humana do mundo não se calcula ou mede simplesmente o dado, mas vem à fala o ente, tal como se mostra aos homens, como ente e como significante. E aqui — e não no ideal metodológico da construção racional que domina a moderna ciência natural matemática — onde se poderá reconhecer a compreensão que se exerce nas ciências do espírito. Se antes tínhamos caracterizado o modo de realização da consciência da história efeitual por sua lingüisticidade, isso tinha como razão de ser o fato de que a lingüisticidade caracteriza em geral toda nossa experiência humana do mundo. E se nela não se objetiva o “mundo”, tampouco a história efeitual chega a ser objeto da consciência hermenêutica. VERDADE E MÉTODO TERCEIRA PARTE 3.