A experiência hermenêutica faz parte desse campo, porque também ela é o acontecer de uma autêntica experiência. O fato de que se evidencie algo naquilo que foi dito, sem que por isso fique assegurado, julgado e decidido em todas as possíveis direções, é algo que de fato ocorre cada vez que algo nos fala a partir da tradição. O transmitido se faz valer a si mesmo, em seu próprio direito, na medida em que é compreendido, e desloca oiorizonte que até então nos rodeava. Trata-se de uma verdadeira experiência, no sentido já mencionado. Tanto o evento do belo como o acontecer hermenêutico pressupõem fundamentalmente a finitude da existência humana. Inclusive podemos fazer a pergunta se um espírito infinito poderia experimentar o elo como nós o experimentamos. Poderia ele ver outra coisa que a beleza do todo que tem ante si? O “aparecer” do belo parece reservado à experiência humana finita. O pensamento medieval conhece um problema análogo, o de como é possível a beleza em Deus, se ele é uno e não múltiplo. Somente a doutrina de Nicolau de Cusa, da complicatio do múltiplo em Deus oferece uma solução satisfatória (cf. O Sermo de pulchritudine, citado acima). E nesse sentido nos parece inteiramente consequente que, na filosofia hegeliana do saber infinito, a arte seja uma forma da representação, que encontraria a sua suspensão e subsunção no conceito e na filosofia. Do mesmo modo, a universalidade da experiência hermenêutica não deveria ser, por princípio, acessível a um espírito infinito, que desenvolvesse, a partir de si mesmo, tudo quanto é sentido, todo noeton, e que pensasse todo o pensável na plena autocontemplação de si mesmo. O Deus aristotélico (e também o espírito hegeliano) deixou para trás de si a “filosofia”, esse movimento da existência finita. Nenhum dos deuses filosofa, diz Platão. VERDADE E MÉTODO TERCEIRA PARTE 3.