É evidente que o conceito do decorativo está sendo pensado aqui, a partir da oposição à “obra de arte autêntica” e a partir de sua origem na inspiração genial. Argumenta-se, por exemplo, assim: o que somente é decorativo não é arte do gênio mas ofício da arte. Como meio, está submetido àquilo que deve adornar, e, tal qual qualquer outro meio submetido a um fim, poderia ser substituído por qualquer outro meio que correspondesse ao fim. O decorativo não participa do caráter único da obra de arte.
Na realidade, o conceito da decoração tem de ser liberado dessa oposição ao conceito da arte vivencial e encontrar seu fundamento na estrutura ontológica da representação, que já elaboramos como modo de ser da obra de arte. Bastará recordar que o adorno, o decorativo são, por seu sentido originário, o belo como tal. Vale a pena reconstruir esse antigo conhecimento. Tudo o que é adorno, e adorna, está determinado pela sua relação com o que ele adorna, com aquilo em que ele é, com aquilo que é seu portador. Não possui um conteúdo estético próprio, o qual somente a posteriori receberia um condicionamento restritivo através da relação para com seu portador. Inclusive Kant, que pode ter alentado essa opinião, leva em conta, na sua conhecida assertiva contra as tatuagens, que um adorno só é tal, quando é conveniente ao portador e lhe cai bem. Forma parte do gosto, não somente que se saiba apreciar que algo é bonito em si, mas também que se saiba o âmbito onde ele pertence e onde não. O adorno não é primeiramente uma coisa para si, que mais tarde se acrescenta a uma outra, mas pertence ao representar-se de seu portador. Do adorno tem-se de dizer também, que pertence à representação; a representação, porém, é um acontecimento ôntico, é representação. Um adorno, um ornamento, uma plástica colocada num local preferencial são representativos no mesmo sentido em que o é, por exemplo, a própria igreja em que foram feitos. [Gadamer Verdade e Método I]