GA6T2:212-213 – ser como a priori

O ser, a entidade do ente (Seiendheit des Seienden), é pensado como o “a priori”, o “prius”, o anterior, o precedente. O a priori, o anterior na significação temporal comum, visa ao mais antigo, ao que outrora surgiu e foi e que não é mais agora um ente presente. Se o que está em questão é a sequência temporal do ente, então a palavra e o seu conceito não necessitam de nenhum esclarecimento. O que se encontra em questão, porém, é a distinção entre ser e ente. O a priori e o anterior são ditos como títulos do ser que marcam distintivamente o ser. A palavra latina prius é a tradução e interpretação do grego πρότερον. Platão foi o primeiro a tratar expressamente desse πρότερον. Seguindo os passos de Platão, Aristóteles também tratou do termo, e, em verdade, em ligação com a entidade do ente (οὐσία, ousia). Precisamos abdicar aqui de uma apresentação expressa das ideias platônicas e aristotélicas sobre ο πρότερον a partir dos diálogos e ensaios desses pensadores. Uma explicitação mais genérica e mais livre precisa ser aqui suficiente. Com certeza, contudo, essa explicitação não pode ser levada a termo sem que nos detenhamos ao mesmo tempo rapidamente nesse ponto em alguns traços centrais da doutrina platônica do ser do ente. A explicitação do a priori que tem por objetivo a caracterização da distinção entre ser e ente pode demonstrar ao mesmo tempo o fato de não ser inventado nada abstruso com o pensamento do a priori, mas de ser concebido aí pela primeira vez algo próximo demais, que, contudo, só foi apreendido em determinados limites, limites que são aqueles da filosofia, isto é, da metafísica. Segundo a coisa mesma, portanto, já sempre tratamos nas discussões até aqui daquilo que ganha voz com essa caracterização particular do “a priori”.

(HEIDEGGER, Martin. Nietzsche (volume único). Tr. Marco Antonio Casanova. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2014, p. 608)