GA6T1:498-499 – vontade de verdade (Willen zur Wahrheit)

Casanova

Se o pensamento nietzschiano da vontade de poder é o pensamento fundamental de sua filosofia e da metafísica ocidental, então a essência do conhecimento, isto é, a essência da verdade, precisará ser determinada a partir da vontade de poder. A verdade contém e oferece o que é, o ente em meio ao qual o próprio homem é um ente; e, com efeito, de tal modo que ele se relaciona com o ente. Por isso, em todo comportamento, o homem se mantém de alguma maneira junto ao verdadeiro. A verdade é aquilo a que o homem aspira, aquilo a partir do que ele exige que ela reine em tudo o que faz e deixa de fazer, em tudo o que deseja e presenteia, experimenta e configura, sofre e supera. Fala-se de uma “vontade de verdade”.

Porque o homem se comporta como ente em relação ao ente na totalidade, sempre explorando e arranjando aí para si a cada vez um domínio do ente, e, nesse domínio, este e aquele ente particular, a verdade é, ao mesmo tempo, requerida, valorizada e honrada de maneira explícita e implícita. Por isso, poderíamos conceber a essência metafísica do homem com a seguinte sentença: o homem é aquele que honra e, consequentemente também, aquele que renega a verdade. Assim, como que por meio do brilho repentino de um raio, a concepção nietzschiana da verdade é esclarecida com uma expressão sobre a veneração da verdade. Em uma anotação oriunda de 1884, na qual a figura do pensamento da vontade de poder começa a se tornar consciente, Nietzsche observa: “que a veneração da verdade já é a consequência de uma ilusão”. (A vontade de poder, n. 602)

O que é dito com isso? Nada menos do que: a verdade mesma é uma “ilusão” – uma miragem. Pois somente nesse caso a veneração da verdade pode ser a consequência de uma “ilusão”. Se uma vontade de verdade é, contudo, vital para a nossa “vida”, e se, porém, vida significa elevação da vida, uma “realização” cada vez mais elevada da vida e, com isso, uma vitalização do real, então a verdade se transforma, se ela é apenas “ilusão”, “imaginação”, ou seja, algo irreal, em desrealização, em obstáculo, em suma, em aniquilação da vida. Dessa forma, a verdade não é nenhuma condição da vida, nenhum valor, mas um não valor.

Mas o que acontece então quando todas as barreiras entre a verdade e a não verdade são derrubadas e tudo passa a vigorar na mesma medida, isto é, tudo se torna igualmente nulo? Nesse caso, o niilismo se torna realidade. Ora, Nietzsche quer o niilismo ou quer conhecê-lo como tal e superá-lo? Ele quer a superação do niilismo. Por conseguinte, caso a vontade de verdade deva pertencer à vida, a verdade certamente não pode, uma vez que a sua essência permanece uma ilusão: ser o valor supremo. Precisa haver um valor, uma condição de elevação perspectivística da vida, que tenha mais valor do que a verdade.

De fato, Nietzsche diz

“que a arte possui mais valor do que a verdade” (n. 853, IV; 1887-1888).

Klossowski

Krell

Original

Excertos de

Heidegger – Fenomenologia e Hermenêutica

Responsáveis: João e Murilo Cardoso de Castro

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