GA65:153 – o vivente

Pode-se, uma vez que todo vivente é organímico (alles Lebendige organismisch), isto é, corporal (leiblich), considerar esse elemento corporal como corpo físico (Körper) e o corpo mecanicamente. Sim, há até mesmo certas tarefas, que exigem tal consideração: medições de grandezas e de peso (Größen- und Gewicht-Messungen) (que, naturalmente, se encontram imediatamente no campo de visão de uma interpretação com vistas ao vivente).

Mas a questão persiste: será que aquilo que se pode experimentar aqui dessa maneira (mecanicamente) conduzirá algum dia para aquilo que precisa ser de antemão e em primeiro lugar, supondo que uma relação fundamental com o vivente seja necessária? Em que medida isso é pertinente? O que ainda são as plantas e os animais para nós, se deduzirmos as utilidades, o embelezamento e a diversão?

Se o vivente é o que não exige de nós qualquer esforço, então ele é o que há de mais difícil de ser visto, se tudo está estabelecido com vistas ao que exige esforço e à sua superação, se movimentando na maquinação!

Pode haver “biologia”, enquanto faltar a ligação fundamental com o vivente (Grundbezug zum Lebendigen), enquanto o vivente não tiver se transformado na outra ressonância do ser-aí (anderen Widerklang des Da-seins)?

Mas, afinal, precisa haver “biologia” lá onde ela só deriva o seu direito (Recht) e a sua necessidade (Notwendigkeit) do domínio da ciência (Herrschaft der Wissenschaft) no interior da maquinação (Machenschaft) moderna? Toda biologia não destruirá necessariamente o “vivente” (Lebendige) e impedirá a relação fundamental com ele? A ligação com o “vivente” não precisa ser buscada completamente fora da “ciência”? E em que espaço deve se manter essa ligação?

O “vivente”, tanto quanto tudo aquilo que é capaz de se tornar objeto, oferecerá ao progresso da ciência possibilidades infinitas e se subtrairá cada vez mais ao mesmo tempo, quanto mais desprovida de fundamento a ciência mesma se tornar.

(HEIDEGGER, Martin. Contribuições à Filosofia (Do Acontecimento Apropriador). Tr. Marco Antonio Casanova. Rio de Janeiro: Via Verita, 2014, §153)