GA45:§36 – tonalidade afetiva [Stimmung]

Casanova

A indigência que se tem em vista determina o homem, na medida em que ela o afina inteiramente, por mais que a incompreensão possa se imiscuir aqui novamente e de imediato e nos levar a pensar que as tonalidades afetivas são algo que o homem “possui” e que, então, elas dependeriam ou bem de dados e circunstâncias exteriores ou bem de estados corpóreos internos, enquanto, em verdade, quer dizer, concebido a partir da essência do seer (acontecimento apropriativo), são as tonalidades afetivas que possuem o homem e que o determinam, consequentemente, de maneira a cada vez diversa, até mesmo em sua corporeidade vital. A tonalidade afetiva também pode suportá-lo através da corporeidade vital como uma de suas vias que conduzem para além dele. A cada vez, o mundo é trazido ao homem de uma forma diversa; a cada vez, seu si mesmo é descerrado e decidido para o ente de maneira diversa.

De maneira ainda mais essencial é preciso dizer: a concepção até aqui do homem, isto é, a concepção biológica e psicológica, poderia compreender mal o que acabamos de dizer, considerando a tonalidade afetiva como uma faculdade muito importante do homem que não teria sido até aqui suficientemente avaliada e interpretada. A tonalidade afetiva corretamente compreendida, porém, leva muito mais a uma superação da concepção até aqui do homem. Dizemos habitualmente: “Somos transpostos para essa ou aquela tonalidade afetiva.” Em verdade, ou seja, concebido a partir da essência originária do ser, o que acontece é o inverso: a tonalidade afetiva nos transpõe a cada vez de um modo ou de outro para o interior dessa ou daquela relação fundamental com o ente enquanto tal. Mais exatamente: a tonalidade afetiva é esse elemento trans-portador, que nos transpõe de tal modo que funda concomitantemente o tempo-espaço da transposição.

Ainda não podemos perguntar aqui como precisamos entender o fato de esse elemento transportador vigorar. Como um trecho e uma via no interior de nossa questão acerca da abertura enquanto tal (ser-aí), contudo, essa questão é essencial.

Com vistas à essência da indigência, o que precisamos levar em conta aqui inicialmente é: aquela indigência do não-se-saber-fora-nem-dentro, como uma indigência afinadora, não compele apenas para o interior de uma relação determinada com o ente já aberto e interpretado em sua entidade, mas ela torna necessário pela primeira vez aquele “entre” e “em meio a”, em cujo espaço-de-jogo-temporal o ente na totalidade pode ser determinado em sua entidade. Aquela indigência do pensar inicial, a que se visa aqui, só pode nos compelir para uma tonalidade afetiva essencial ou, como dizemos, para uma tonalidade afetiva fundamental.

Todavia, precisamos fazer valer agora, finalmente, o fato de o que foi discutido até aqui sobre a indigência e a tonalidade afetiva não passar justamente de “fantasias” atuais e, por fim, apesar de tudo, de declarações “psicológicas” sobre a psicologia que nos é completamente desconhecida dos gregos arcaicos. Contra essa interpretação equivocada, ainda não há hoje, de fato, nenhuma defesa suficiente; e tampouco haverá futuramente tal defesa, porque essas interpretações equivocadas, constantemente possíveis, só se tornam impossíveis com base em uma transformação essencial do pensar e do questionar. Nós nos encontramos a caminho da realização necessária dessa transformação.

Rojcewicz

Original

  1. Über das Wesen der’ Stimmung vgl.: Sein und Zeit. Gesamtausgabe Bd. 2. Hg. F.-W. von Herrmann, Frankfurt a. M. 1977; und vor allem die Hölderlinvorlesung: Hölderlins Hymnen »Germanien« und »Der Rhein«. Gesamtausgabe Bd. 59. Hg. S. Ziegler, Frankfurt a. M. 1980.[↩]
Excertos de

Heidegger – Fenomenologia e Hermenêutica

Responsáveis: João e Murilo Cardoso de Castro

Twenty Twenty-Five

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