GA38:38-40 – “Quem é o homem?”

Pacheco & Quadrado

A questão condutora da lógica, tal como nós a queremos compreender, reza assim: “O que é a linguagem?” Esta pergunta reconduziu-nos à pergunta: “o que é o homem?” Esta pergunta tem o caráter de uma pergunta preliminar. A abordagem da pergunta tem de ser dirigida de tal modo que acerte naquilo que é questionado. Nós vimos que a pergunta “o que é o homem?” falha naquilo a que aponta. A pergunta pelo homem tem que mudar-se da pergunta pelo quê para a pergunta pelo quem. Pois a pergunta pelo quê compreende o homem como uma coisa que está diante dos olhos (Vorhandenes).

“Quem é o homem?” – neste modo de perguntar, o homem é à partida atingido, na medida em que, com o quem, nós chamamos um estranho que vem em direção a nós. Agora, já não estamos em risco de subestimar este “quem” no desenvolvimento ulterior.

A pergunta “quem é o homem?” conduz-nos à resposta seguinte. Quando perguntamos a uma pessoa determinada “quem és tu?”, recebemos como resposta “eu”. E quando perguntamos a várias pessoas, recebemos como resposta “nós”. Ou recebemos como resposta um nome próprio. Nós compreendemos estes eu, tu, nós, vós como pessoa ou como associação de pessoas. Esta resposta é, contudo, mais uma vez, um desacerto, na medida em que não determinamos aquele que é questionado a partir de ele mesmo, mas de acordo com uma determinada perspectiva, como ser vivo e como racional. Quando nós nos dirigimos claramente àquele que é questionado, então perguntamos (86): “Quem és tu mesmo?” – “Quem é ele mesmo?” – “Quem sou eu mesmo?”. Os inquiridos são, por conseguinte, cada qual um si mesmo.

Deve perguntar-se a seguir: “O que é um si mesmo?”. Mas, com isto, estamos já de novo fora da direcção a que aponta a pergunta. Nós temos de compreender de novo o homem como um si mesmo. A pergunta reza por conseguinte: “Quem é ele mesmo? — aquele que pergunta?”, “quem somos nós mesmos — aqueles que perguntamos?”

A pergunta pela essência relativamente ao homem colocou, de uma maneira peculiar, na pergunta, aquele que pergunta juntamente com aquilo que é perguntado. O que pergunta é aqui sempre conjuntamente atingido pela pergunta. Deve estar ligado com isso o facto de que, não apenas no início, mas sempre de novo, nós corremos o risco de deslizar para tora da direção da pergunta. Corremos o risco de voltar a cair na pergunta pelo quê, mas, com isso, também de procurar uma definição da essência, que é realizada no horizonte do conceito do quê.

Por isso, exige-se manter a direção da pergunta orientada para o si mesmo e o quem. Isso parece fácil, pois nós mesmos parecemos ser os mais próximos de nós. Quem somos nós mesmos? Cada um de nós é um eu mesmo, os muitos eus juntos são um nós. O si mesmo reconduz-se portanto para o eu.

Nós chegamos assim à determinação do eu como fundamento que desempenhou o seu papel na filosofia moderna. Esta orientação do perguntar pelo homem como o eu foi possível porque se falhou, ou, melhor, não se conheceu a pergunta pela essência do si mesmo. (87) Certamente, cada um de nós é um eu mesmo, mas também, do mesmo modo, um tu, um nós, um vós – mesmos. O caráter da mesmidade não é uma determinação distintiva do eu, mas o homem como ele mesmo é, simultaneamente e de modo igualmente originário, eu, e tu, e nós, e vós.

Tem de se sublinhar: o homem não é um si mesmo, porque ele é um eu, mas, pelo contrário: ele só pode ser um eu, porque ele é na essência um si mesmo. O ele mesmo nem é limitado pelo eu nem reconduzível ao eu. Por isso, a partir do si mesmo bem compreendido, nenhum caminho conduz em direção ao eu como fundamento da essência; (neste caso) o si mesmo permanecería, antes, no egocentrismo e na representação.

Gregory & Unna

Original

Excertos de

Heidegger – Fenomenologia e Hermenêutica

Responsáveis: João e Murilo Cardoso de Castro

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