GA24:322-324 – Temporalidade [Zeitlichkeit] e Temporialidade [Temporalität]

Casanova

O problema da diferença entre o ser em geral e o ente não se encontra sem razão no primeiro lugar, pois é a discussão dessa diferença que deve possibilitar pela primeira vez ver tematicamente de maneira inequívoca e metodicamente segura algo do gênero do ser em sua diferença em relação ao ente, colocando tal diferença em meio ao esforço de investigação. Com a possibilidade de uma realização suficientemente clara desta diferenciação entre ser e ente e, por conseguinte, com a possibilidade da realização do ultrapassamento da consideração ôntica do ente em relação à tematização ontológica, surge e decai a possibilidade da ontologia, isto é, da filosofia enquanto ciência. As discussões deste capítulo requisitam, por isso, o nosso interesse preponderante. O ser e a diferença do ser em relação ao ente só podem ser fixados se conseguirmos controlar a compreensão de ser enquanto tal. Conceber a compreensão de ser significa, porém, compreender de início o ente, a cuja constituição ontológica pertence a compreensão de ser, o ser-aí. A exposição da constituição fundamental do ser-aí, isto é, de sua constituição existencial, é a tarefa da analítica ontológica preparatória da constituição existencial do ser-aí. Nós a denominamos a analítica existencial do ser-aí. Essa analítica precisa ter por meta trazer à luz em que se fundam as estruturas fundamentais do ser-aí em sua unidade e totalidade. Em verdade, na primeira parte, oferecemos vez por outra, na medida em que as discussões positivamente críticas o foram exigindo, fragmentos particulares de tal analítica existencial. Mas nós não a percorremos em sua sistemática, nem expusemos expressamente a (332) constituição ontológica fundamental do ser-aí. Antes de discutirmos o problema ontológico fundamental, carece-se da execução da analítica existencial do ser-aí. Não obstante, isto é impossível no interior da presente preleção, se não quisermos formular expressamente o problema ontológico fundamental. For isso, precisamos escolher um desvio e pressupor o resultado essencial da analítica existencial do ser-aí como resultado fundamentado. No que concerne aos seus resultados essenciais, expus em meu ensaio sobre Ser e tempo o que abarca a analítica existencial. O resultado da analítica existencial, isto é, da exposição da constituição ontológica do ser-aí em seu fundamento, nos diz: a constituição ontológica do ser-aí se funda na temporalidade. Se pressupusermos este resultado, então isto não significa que poderíamos nos satisfazer em ouvir a palavra temporalidade. Sem apresentar aqui expressamente a demonstração de que a constituição fundamental do ser-aí se funda na temporalidade, precisamos tentar, contudo, conquistar por uma via qualquer uma compreensão daquilo que significa temporalidade. Para tanto, escolhemos o seguinte caminho: tomaremos como ponto de partida o conceito vulgar do tempo e procuraremos aprender a ver como é que aquilo que se conhece comumente como tempo e que foi transformado unicamente em problema até aqui na filosofia pressupõe a própria temporalidade. É preciso ver que e como o tempo vulgarmente compreendido pertence à temporalidade e emerge dela. Por meio desta consideração, alcançamos para nós mesmos uma via de acesso ao fenômeno da própria temporalidade e de sua estrutura fundamental. O que conquistamos com isso? Nada menos do que a inserção do olhar na constituição ontológica originária do ser-aí. Neste caso, então, se é que a compreensão de ser pertence à compreensão de ser do ser-aí, esse ser-aí também precisa se fundar na temporalidade. A condição ontológica de possibilidade da compreensão de ser é a própria temporalidade. A partir dela, por isso, precisa ser possível resgatar aquilo a partir do que nós compreendemos algo assim como o ser. A temporalidade assume a possibilitação da compreensão de ser e, com isso, a possibilitação da interpretação temática do ser e de sua (333) articulação e modos múltiplos, isto é, a possibilitação da ontologia. Daí emerge uma problemática própria, ligada à temporalidade. Nós a designamos como a problemática da temporialidade (Temporalität). O termo “temporialidade” não é equivalente ao termo temporalidade (Zeitlichkeit), apesar de não passar da sua tradução. Ele designa a temporalidade na medida em que ela mesma é transformada em tema como condição de possibilidade da compreensão de ser e da ontologia enquanto tal. O termo “temporialidade” deve indicar que a temporalidade não representa na analítica existencial o horizonte a partir do qual compreendemos ser. O que inquirimos na analítica existencial, a existência, revela-se como temporalidade que, por seu lado, constitui o horizonte para a compreensão de ser, que pertence essencialmente ao ser-aí. (p. 331-333)

Courtine

Norro

Hofstadter

Original

  1. Cf. supra p. 22. Il ne nous a pas paru possible de restituer en français, sans artifice, la distinction terminologique: ZeitlichkeitTemporalität. Nous avons traduit ce dernier terme tantôt, comme ici, par « être-temporal », tantôt par « temporal-ité ». Nous aurions pu écrire aussi, plus simplement, temporalité. (N.d.T.)[↩]
  2. Sobre la traducción de los términos alemanes Zeitlichkeit y Temporalität, véase el prólogo. (N. del T.)[↩]
Excertos de

Heidegger – Fenomenologia e Hermenêutica

Responsáveis: João e Murilo Cardoso de Castro

Twenty Twenty-Five

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