Ao falar de um fim, entendemos algo que não consegue ir adiante, algo que acabou de ser. O fim está sendo entendido como carência e fracasso. Fim soa como impotência e decadência.
Mas expressões como “ir de um confim a outro”, “em todos os cantos e confins” anunciam um outro significado da palavra “fim”. Fim diz aqui o mesmo que lugar. Entendemos, portanto, por fim [Ende] o lugar em que algo se recolhe nas suas possibilidades mais extremas, o lugar em que algo se plenifica, se consuma plenamente (vollendet). [Coisa do Pensamento]
Que dizemos nós quando falamos do fim da Filosofia? Temos a tendência de compreender o fim de algo em sentido negativo como a pura cessação, como a cessação de um processo, quando não como ruína e impotência. Pelo contrário, quando falamos do fim da Filosofia queremos significar o acabamento da Metafísica. Acabamento não quer dizer, no entanto, plenitude no sentido que a Filosofia deveria ter atingido, com seu fim, a suprema perfeição. Falta-nos não apenas qualquer medida que permitisse estimar a perfeição de uma época da Metafisica em comparação a outra. Não há mesmo nada que possa justificar tal maneira de proceder. O pensamento de Platão não é mais perfeito que o de Parmênides. A Filosofia hegeliana não é mais perfeita que a de Kant. Cada época da Filosofia possui sua própria necessidade. Que uma Filosofia seja como é, deve ser simplesmente reconhecido. Não nos compete preferir uma a outra, como é possível quando se trata das diversas visões do mundo.
O antigo significado de nossa palavra “fim” (Ende) é o mesmo que o da palavra “lugar” (Ort): “de um fim a outro” quer dizer: “de um lugar a outro”. O fim da Filosofia é o lugar, é aquilo em que se reúne o todo de sua história, em sua extrema possibilidade. Fim como acabamento quer dizer esta reunião.
Através de toda a História da Filosofia, o pensamento de Platão, ainda que em diferentes figuras, permanece determinante. A metafísica é platonismo. Nietzsche caracterizou sua filosofia como platonismo invertido. Com a inversão da metafísica, que já é realizada por Karl Marx, foi atingida a suprema possibilidade da Filosofia. A Filosofia entrou em seu estágio terminal. Toda tentativa que possa ainda surgir no pensamento filosófico não passará de um renascimento epigonal e de variações deste. Por conseguinte, o fim da Filosofia será uma cessação de seu modo de pensar? Tal conclusão seria muito apressada.
Fim é, como acabamento, a concentração nas possibilidades supremas. Pensamos estas possibilidades de maneira muito estreita enquanto apenas esperarmos o desdobramento de novas filosofias do estilo até agora vigente. Esquecemos que já na época da filosofia grega se manifesta um traço decisivo da Filosofia: é o desenvolvimento das ciências em meio ao horizonte aberto pela Filosofia. O desenvolvimento das ciências é, ao mesmo tempo, sua independência da Filosofia e a inauguração de sua autonomia. Este fenômeno faz parte do acabamento da Filosofia. Seu desdobramento está hoje em plena marcha, em todas as esferas do ente. Parece a pura dissolução da Filosofia; é, no entanto, precisamente seu acabamento. [MHeidegger 96]