Embora saibamos que a etimologia da palavra agere indica que agir é “levar adiante”, devemos ter em conta o que temos em mente quando pensamos na ação humana. Muito mais rica, muito mais significativa. O agir, o verdadeiro agir, para nós nunca se esgota, de forma alguma, num só impulso (qualquer que seja a qualidade do esforço exigido). Agir: fazer alguma coisa, mas não no sentido da produção que termina com o aparecimento de um produto que está agora presente como uma coisa. Exemplo: um operário a soldar. Todos os seus gestos são orientados pela preocupação de que a soldadura acabada… aja? Podemos dizer isto? Falar assim revela o sentido em que algo como uma soldadura deve ser entendido? Só o ser humano age (dizemos de uma solda que ela “mantém”). Para haver ação, a ação tem de ter aquilo a que os gregos chamam um τέλος, um fim onde a ação termina. Agir, por exemplo, no sentido moral, significa não mentir — em outras palavras, dizer a verdade custe o que custar! Mas também podemos agir num sentido não moral, por exemplo, quando fazemos o nosso trabalho. Mas o que é que isso significa? Ser estudante é uma profissão? Não é bem assim, porque não se pode ser estudante, no verdadeiro sentido da palavra, durante toda a vida. Agir: fazer o que se faz com a intenção de que seja feito, porque tem de ser feito.
Sempre que utilizamos o termo filosófico “agir” (ou “ação”) para descrever o modo de existência muito particular que caracteriza o ser humano nas suas ações, é evidente que queremos dizer que esta palavra significa infinitamente mais do que um “levar adiante”.
Ação, actio, remete etimologicamente para a ideia de avançar. É de notar que a palavra “avançar” é utilizada revém hoje em dia sem cessar no vocabulário do jornalismo ou da política. As palavras têm uma característica estranha: a de guardar seu sentido atávico, que elas instilam no vocabulário corrente: quando os jornalistas ou os homens políticos de hoje em dia falam de “avanço”, é o velho sentido romano da ação, por sua conta, que ressurge, aquele de levar adiante. É curioso notar que andar é sempre entendido como ir adiante, enquanto as crianças adoram andar para trás. Podemos também pensar nos patinadores, que patinam para trás.
– E a reação?
– A reação é simplesmente a inversão do movimento. Não pode ser entendida por si só. É um avanço para trás, mas que supõe uma ação à qual reagir. Um “reacionário” é alguém que faz o contrário da ação à qual reage: retroage. Alguém diz branco; reage-se — automaticamente — dizendo “preto”. Uma pessoa diz: “Rolling Stones”, a outra responde: “Beatles”. Está a fazer o contrário. Uma criança animada pelo espírito de contradição é reacionária.
[FÉDIER, F. L’humanisme en question: Pour aborder la lecture de la “Lettre sur l’humanisme” de Martin Heidegger. Paris: Les Éditions du Cerf, 2012]