Fédier (2010:153-156) – tempo é a priori sem ser subjetivo

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“No que diz respeito ao a priori, está implícito [entenda-se bem: implícito em todo o pensamento moderno desde Descartes] um princípio: o que é a priori pertence à subjetividade.” [GA21:289]

Ora, Heidegger questiona este princípio. Ele pensa: o a priori, aquilo que é anterior a toda a experiência, independente dela, e a condição de possibilidade da experiência, porque é que há-de estar no sujeito, no “eu penso”, no nosso pensamento enquanto sujeitos conscientes? A fenomenologia, a começar pela de Husserl, mostrou como toda a representação, embora tenha o momento essencial de retomada que é a própria consciência, não é menos dependente do seu objeto. Isto leva-nos a pensar o sujeito como intencional. O que é a intencionalidade é ilustrado pelo modo como a representação vai produzir o objeto.

Heidegger dá um exemplo:

“‘Subjetivo’ pode ser em todo o caso — no sentido da pertença exclusiva ao Dasein de um fato qualquer que seja — a descoberta do espaço puramente métrico (i.e. mensurável), a partir do espaço ambiente, e além disso a elaboração do espaço métrico assim descoberto em geometria.”

Se lermos corretamente esta frase (ibid., 290), vemos diante dos nossos olhos algo como um espaço de medidas, proveniente do espaço ambiente, mas que não deriva dele, pois, pelo contrário, é o a priori do espaço ambiente. E o espaço geométrico é o a priori do espaço métrico.

Se virmos o fenômeno, torna-se claro que “subjetivo” adquiriu um outro significado. Este significado é dito “na pertença exclusiva de cada postura ao Dasein”. Postura é Verhaltung — comportamento seria mais exato, isto é, portar-se juntamente com. Cada ser humano, em cada momento, está numa relação múltipla com o que o rodeia. Estamos numa relação de percepção, por exemplo, mas também numa relação de memória, numa relação de tédio, numa relação de conhecimento… Este ser-em-relação está ele próprio em relação com o Dasein. Ser-em-relação é ek-sistir, estar fora de si mesmo. Acima de tudo, esta locução não deve ser entendida num sentido extático.

Original

Excertos de

Heidegger – Fenomenologia e Hermenêutica

Responsáveis: João e Murilo Cardoso de Castro

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