A enunciação sobre a moeda “se” relaciona com esta coisa enquanto a apresenta e diz da coisa apresentada o que ela é sob o ponto de vista principal. A enunciação apresentativa exprime, naquilo que diz da coisa apresentada, aquilo que ela é, isto é, exprime-a tal qual é, assim como é [leitende Hinsicht]. O “assim como” se refere à apresentação e ao que é apresentado. “Apresentar” [vor-stellen] significa aqui, descartando todos os preconceitos “psicologistas” e “epistemológicos”, o fato de deixar surgir a coisa diante de nós enquanto objeto. O que assim se opõe a nós deve, sob este modo de posição, cobrir [durchmessen] um âmbito aberto para nosso encontro, mas permanecer, ao mesmo tempo, também a coisa em si mesma e se manifestar em sua estabilidade. Esta aparição da coisa, enquanto cobre (mede) um âmbito para o encontro, se realiza no seio de uma abertura cuja natureza de ser aberto não foi criado pela apresentação, mas é investido e assumido por ela como campo de relação. A relação da enunciação apresentativa com a coisa é a realização desta referência [Verhältnis]; esta se realiza, originariamente e cada vez, como o desencadear de um comportamento [Verhalten]. Todo o comportamento, porém, se caracteriza pelo fato de, estabelecido no seio do aberto, se manter referido àquilo que é manifesto enquanto tal. Somente isto que, assim, no sentido estrito da palavra, está manifesto foi experimentado precocemente pelo pensamento ocidental como “aquilo que está presente” [«das Anwesende»] e já, desde há muito tempo, é chamado “ente” [«das Seiende»].
O comportamento está aberto sobre o ente. Toda relação de abertura, pela qual se instaura a abertura para algo, é um comportamento. A abertura que o homem mantém se diferencia conforme a natureza do ente e o modo do comportamento. Todo trabalho e toda realização, toda ação e toda previsão, se mantêm na abertura de um âmbito aberto no seio do qual o ente se põe propriamente e se torna suscetível de ser expresso naquilo que é e como é. Isto somente acontece quando o ente mesmo se pro-põe, na enunciação que o apresenta, de tal maneira que esta enunciação se submete à ordem de exprimir o ente assim como é. Na medida em que a enunciação obedece a tal ordem, ela se conforma ao ente. O dizer que se submete a tal ordem é conforme (verdadeiro). O que assim é dito é conforme (verdadeiro).
A enunciação recebe sua conformidade da abertura do comportamento. Pois, somente através dela, o que é manifesto pode tornar-se, de maneira geral, a medida diretora de uma apresentação adequada. Mas o comportamento aberto mesmo deve deixar-se guiar por esta medida. Isto quer dizer: o comportamento mesmo deve receber antecipadamente o dom prévio desta medida diretora de toda apresentação. Isto faz parte da abertura que o comportamento mantém, mas se somente pela abertura que o comportamento mantém se torna possível a conformidade da enunciação, então aquilo que torna possível a conformidade possui um direito mais original de ser considerado como a essência da verdade.
Assim, cai por terra a atribuição tradicional e exclusiva da verdade à enunciação, tida como o único lugar essencial da verdade. A verdade originária não tem sua morada original na proposição. Mas surge simultaneamente a seguinte questão: qual é o fundamento da possibilidade intrínseca da abertura que mantém o comportamento e que se dá antecipadamente uma medida? E somente desta possibilidade intrínseca da abertura do comportamento que a conformidade da proposição recebe a aparência de realizar a essência da verdade. [MHeidegger – SOBRE A ESSÊNCIA DA VERDADE]