Depraz (1994:17-20) – Eugen Fink

(Fink1994)

destaque

Fink refletiu principalmente sobre a questão da origem do mundo, que lhe parecia ser a questão fenomenológica fundamental. Embora a sua interrogação ontológica estivesse inicialmente na linha da de Heidegger, Fink desenvolveu uma abordagem original: o seu objetivo mais radical era redescobrir o mundo na sua imediatez original, relativizando assim a questão do ser em relação à do mundo. A abordagem de Heidegger, pelo contrário, que tematiza o esquecimento do ser na metafísica, consiste em fazer emergir a questão do ser como a questão decisiva e eminente. Assim, já em 1949, numa conferência intitulada Welt und Endlichkeit 1, Fink se faz recipiente e eco crítico da conferência de Heidegger de 1929-30 intitulada Grundprobleme der Metaphysik. WeltEndlichkeitEinsamkeit, que Heidegger dedicou a Fink após a morte deste último em 1975. Em Welt und Endlichkeit, Fink tenta considerar o âmbito da diferença cosmológica em relação à diferença ontológica. Nesta base, destaca o tema do mundo como uma totalidade do ser (Seinsganze), um tema que Heidegger, tal como a tradição filosófica ou científica anterior, tem, na sua opinião, geralmente obscurecido. Ao ancorar a sua meditação num horizonte ontológico, Fink dá primazia à questão do mundo como um todo espácio-temporal infinito, em relação ao qual todo o ser aparece necessariamente finito. Para Fink, o mundo não é nem uma Ideia no sentido kantiano, nem o horizonte dos horizontes como é para Husserl, nem mesmo um existencial (Heidegger). É uma dimensão que está para além da metafísica onto-teológica e que, enquanto fenômeno do ser total, engloba a totalidade do ser e não pode ser pensada como a soma de estados finitos do ser, nem como o horizonte abrangente de estados do ser. O pensamento de Fink, embora subscrevendo um certo gesto ontológico e forjando o seu próprio caminho para a cosmologia, permanece mais do que nunca ligado à herança fenomenológica husserliana.

A sua perspectiva filosófica é, no entanto, de facto cosmológica. Enraizando as suas reflexões nos textos de Nietzsche, Fink elabora uma crítica da metafísica, que continua a ser o pensamento da coisa objetivada, e tenta implementar um pensamento do cosmos. Ainda fortemente influenciado por Nietzsche, coloca em primeiro plano o conceito de jogo como “símbolo cósmico”. Em Spiel als Weltsymbols 2, tenta mostrar como o jogo é o fenómeno original da situação do homem no mundo, muito mais do que a luta, por exemplo. É aqui que a sua releitura de Heráclito, que se concretizou no Seminário de 1966-67 que dirigiu em colaboração com Heidegger, desempenha um papel essencial no seu itinerário filosófico. O mundo é um jogo sem jogador, ou seja, sem uma instância transcendente que lhe dite o sentido: “o jogo do mundo não é o jogo de ninguém”. A abordagem cosmológica faz simplesmente do mundo um jogo que lhe é imanente. Desta forma, Fink promove uma nova forma de pensar o mundo, uma forma de pensar que contraria o esquecimento da metafísica clássica, uma forma de pensar em que o céu e a terra, o fogo e o ar, jogam juntos numa dialética livre de qualquer ancoragem antropológica no sentido positivo do termo.

original

  1. Welt und Endlichkeit, Würzburg, Königshausen & Neumann, 1990[↩]
  2. Spiel als Weltsymbol, Stuttgart, Kohlhammer, 1960, trans. de H. Hildenbrand e A. Lindenberg sob o título Le jeu comme symbole du monde, Paris, Minuit, 1966[↩]
  3. Nähe und Distanz. Phänomenologische Vorträge und Aufsätze, Freiburg/München. Karl Alber Verlag, 1976, trad. fr. par J. Kessler, J. Millon, Grenoble, 1994.[↩]
  4. Welt und Endlichkeit, Würzburg, Königshausen & Neumann, 1990.[↩]
  5. Spiel als Weltsymbol, Stuttgart, Kohlhammer, 1960, trad. fr. par H. Hildenbrand et A. Lindenberg sous le titre Le jeu comme symbole du monde, Paris, Minuit, 1966.[↩]
  6. Grundphänomene des menschlichen Daseins, Freiburg, Karl Alber, 1979.[↩]
  7. Existenz und Koexistenz, Würzburg, Königshausen & Neumann, 1987.[↩]
Excertos de

Heidegger – Fenomenologia e Hermenêutica

Responsáveis: João e Murilo Cardoso de Castro

Twenty Twenty-Five

Designed with WordPress