casa do ser

das Haus des Seins

P — Há algum tempo, com muita timidez, chamei a linguagem de casa do ser. Se, pela linguagem, o homem mora na reivindicação do ser, então nós europeus, pelo visto, moramos numa casa totalmente diferente da oriental.

J — Na suposição de que essas línguas não apenas são diferentes mas que possuem fundamentalmente uma outra essência.

P — Assim a conversa de uma casa para outra torna-se quase impossível. [GA12]


Este co-responder é um falar. Está a serviço da linguagem. O que isto significa é de difícil compreensão para nós hoje, pois nossa representação comum da linguagem passou por um estranho processo de transformações. Como consequência disso a linguagem aparece como um instrumento de expressão. De acordo com isso, tem-se por mais acertado dizer que a linguagem está a serviço do pensamento em vez de: o pensamento como co-respondência está a serviço da linguagem. Mas, antes de tudo, a representação atual da linguagem está tão longe quanto possível da experiência grega da linguagem. Aos gregos se manifesta a essência da linguagem como o logos. Mas o que significa logos e legein? Apenas hoje começamos lentamente, através de múltiplas interpretações do logos, a descerrar para nossos olhos o véu sobre sua originária essência grega. Entretanto, nós não somos capazes nem de um dia regressar a esta essência da linguagem, nem de simplesmente assumi-la como herança. Pelo contrário, devemos entrar em diálogo com a experiência grega da linguagem como logos. Por quê? Porque nós, sem uma suficiente reflexão sobre a linguagem, jamais sabemos verdadeiramente o que é a filosofia como a co-respondência acima assinalada, o que ela é como uma privilegiada maneira de dizer. [MHeidegger: QUE É ISTO – A FILOSOFIA?]


Caso, em nosso ensaio de conduzir nosso pensamento ao lugar de origem da essência da identidade, algo tiver consistência, que terá acontecido com o título da conferência? O sentido do título “O princípio da Identidade” se teria transformado. O princípio se apresenta primeiro na forma de um primeiro princípio que pressupõe a identidade como um traço no ser, quer dizer, no fundamento do ente. Este princípio no sentido de um enunciado transformou-se a caminho num princípio que é uma espécie de salto que, distanciando-se do ser como fundamento do ente, salta no abismo (sem-fundamento). Mas este abismo não é nem o nada vazio nem o negro caos, mas: o acontecimento-apropriação. No acontecimento-apropriação vibra a essência daquilo que a linguagem fala, a linguagem que certa vez designamos como a casa do ser. Princípio da identidade diz agora: um salto exigido pela essência da identidade porque dele necessita, se, entretanto, o comum-pertencer de homem e ser for destinado a alcançar a luz essencial do acontecimento-apropriação. [MHeidegger: IDENTIDADE E DIFERENÇA]


Consideramos somente — e isso de maneira bem grosseira — o último verso e ainda o transformamos num enunciado não poético: nenhuma coisa [Ding] é onde falha a palavra [Wort]. Podemos fazer ainda outra coisa. Podemos acrescentar ao enunciado: alguma coisa só é quando a palavra apropriada e competente nomeia algo como sendo um ente [Seiende], estabelecendo assim cada ente como tal. Isso não significaria então que só há ser onde uma palavra apropriada vem à fala? Mas de onde a palavra recebe a sua propriedade? O poeta [Dichter] não diz nada sobre isso. O conteúdo do último verso enuncia, no entanto, que o ser [Sein] de tudo aquilo que é mora na palavra. Nesse sentido, é válido afirmar: a linguagem é a casa do ser. Procedendo desse modo, a poesia [Dichtung] haveria de proporcionar a mais bela confirmação de uma posição de pensamento, pronunciada em outra ocasião. Só que na verdade proceder assim seria confundir e misturar tudo. Agindo assim, não apenas rebaixamos a poesia para a posição de mera validação de um pensamento como tomamos o pensamento como algo leviano, esquecendo o que significa fazer uma experiência com a linguagem [Sprache]. [GA12]