Caron (2005:782) – Jemeinigkeit e senso interno

tradução

Por outro lado, o ser-sempre-meu (Jemeinigkeit), tal como é exposto no § 9 de Sein und Zeit, não representa qualquer sentimento de ordem psicológica. “O Dasein é sempre meu”: isto não significa que o local do seu desdobramento seja o senso interno através do qual nos experimentamos na nossa individualidade. Pelo contrário, qualquer senso interno só é possível na associação operada pelo Dasein entre uma integridade biológica que sou enquanto vivente, e o fato que, como relação ao ser, posso aparecer enquanto eu: só então nasce o senso interno, possibilitado pela pré-compreensão ontológica; nasce quando esta totalidade viva aparece em sua presença a um si mesmo que se identifica com ela e identifica cada sensação com o fato que isto aí são suas sensações. O ser-sempre-meu aplica-se então ao corpo, e neste fenômeno de senso interno encontramo-nos perante o conluio em um de dois fenômenos: o Dasein liga-se a um ente, neste caso a um corpo; e este ente a que se liga, sendo o seu corpo, torna-se para ele um ser insigne na medida em que o sente a cada momento. Relaciona assim a transcendência, que não é nada de ente, com um ente que, enquanto tal, lhe permanece o mais próximo entre os entes. O senso interno nasce da identificação entre o que vejo e o que sinto. O psicologismo que faz dele o princípio nasce do fato de o “eu sinto” se tornar o princípio do “eu penso”, esquecendo que o “sentir-se a si mesmo” só é possível num tal grau de intensidade porque este ente, que sinto e que é meu corpo, apareceu, graças à relação ao ser que permite que um ente surja diante dos meus olhos, como o ente privilegiado que está ligado a mim. O senso interno que se tornou um princípio é o esquecimento do fato de que só posso sentir meu corpo como meu porque não estou confinado, como o animal, aos limites deste corpo. Quando o si mesmo se centra nos seus estados, nas suas experiências, na sua interioridade, está precisamente a centrar-se em si próprio. A introspecção só é possível porque é precedida de um espectro, de um ver, porque há um aparecimento de um ente, de meu corpo, de meu eu, contra o fundo de um horizonte prévio de manifestação. A introspecção só é possível porque já estamos sempre noutro lugar que não aquele que visamos nela. Este estado de coisas torna possíveis certas experiências-limite, como a muito instrutiva contada por Cioran neste aforismo: “Sou distinto de todas as minhas sensações. Não consigo perceber como. Nem sequer consigo perceber quem as experimenta. E, além disso, quem é esse eu no início das três proposições? [Cioran, Œuvres, p. 1645].

Original

CARON, Maxence. Pensée de l’être et origine de la subjectivité. Paris: CERF, 2005.

Excertos de

Heidegger – Fenomenologia e Hermenêutica

Responsáveis: João e Murilo Cardoso de Castro

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