Bornheim (1989) – O Existencialismo de Sartre (Método)

(Bornheim1989)

A questão do método é muito ampla, mesmo porque o pensamento de Sartre se desdobra em três fases fundamentais. A primeira, em que se constitui o existencialismo propriamente dito, dominada pela principal obra de Sartre, O ser e o nada (1943), adota o método fenomenológico. A Segunda, inspirada por preocupações de ordem marxista, assimila também a sua metodologia, e condensa-se no livro Crítica da razão dialética (1960). Finalmente, na terceira fase, volta a acentuar-se a nunca abandonada inquietação com o indivíduo concreto; agora, a extensa biografia do romancista Gustavo Flaubert, o idiota da família (1972), mostra as novas transformações: além do marxismo, Sartre lança mão também da psicanálise. Mas ele não chega a elaborar as bases teóricas de sua interpretação de Flaubert.

Contudo, em sua primeira novela, A náusea, de 1937, uma descrição fenomenológica muito livremente entendida casa-se com o emprego da dúvida na acepção cartesiana, com a diferença reveladora de que, ao contrário de Descartes que punha em dúvida apenas as formas do conhecimento humano, Sartre busca destituir de suas bases tudo aquilo que possa emprestar um sentido à existência do homem; põe-se em dúvida, assim, o sentido da existência humana em geral, e também o sentido do outro, de Deus, da História, da arte. O nome que assume a dúvida para alcançar esse despojamento inaugural é a náusea. A experiência da náusea, minuciosamente descrita, revela-se aos poucos uma força definitivamente reveladora.

 

“Alguma coisa me acontece, já não posso mais duvidar. (…) não foram necessários mais de três segundos para que todas as minhas esperanças fossem varridas.

(A náusea, pág. 168)

 

Éramos um monte de existências enfadadas, embaraçadas de nós mesmos, sem a menor razão para estarmos aí, nem uns nem outros; cada existente, confuso, inquieto, sentia-se demais em relação aos outros. (…) E eu – fraco, enlanguecido, obsceno, digerindo, movendo mornos pensamentos – eu também era demais. (…) A palavra absurdidade nasce agora sob minha pena. (…) E sem nada formular claramente, compreendi que havia encontrada a chave da Existência, a chave de minhas náuseas, de minha própria vida. De fato, tudo o que consegui apreender em seguida se reduz a essa absurdidade fundamental.

(A náusea, pág. 163-4)

 

Mas eu, há pouco, fiz a experiência do absoluto: o absoluto ou o absurdo. (…) Eu não estava surpreso, sabia que era o Mundo, o Mundo em sua nudez que se mostrava repentinamente, e eu sufocava de cólera contra esse grande ser absurdo.”

(A náusea, pág. 170)

Excertos de

Heidegger – Fenomenologia e Hermenêutica

Responsáveis: João e Murilo Cardoso de Castro

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