De um lado reconhecer e assumir as determinações concretas, consentir em ser circunstância, em se limitar a um modo definido e encarnado de viver; de outro lado projetar-se para a transcendência, manter o movimento de negação das determinações. Sustentar a tensão dos polos de afirmar e de negar: é a ambiguidade do humano.
Cair para um polo, não ficar como ponte, como corda, é a queda. A queda nesse sentido é o humano expulso de sua verdade e liberdade, aprisionado numa afirmação definida, num sistema, numa ideologia. Ela se pode dar de dois modos: ora afirmando a existência dentro de uma empiria sem transcendência, ora afirmando uma transcendência que rejeite o modo concreto, encarnado de ser. No mito da árvore da vida está assinalada a queda: Eva busca a transcendência (a imortalidade), rejeitando o modo concreto de seu ser (a mortalidade).
Todo empreendimento, que lance raízes no dinamismo dessa ambiguidade existencial, buscando sem esmorecer a superação de um modo definido de ser, é revelador do que seja o humano. A existência se dimensiona como «humana» precisamente no movimento de superar o modo de ser definido, arranjado, instalado, para um caminhar além, jamais definido, definível à medida que se caminha no definido. Perceber no próprio caminhar a revelação da transcendência, a possibilidade de superação, não como algo pré-fixado, pré-normalizado, mas como constante criação decisória de quem caminha, é o que significa o termo experiência. (1976, p. 60)