Onto-Theo-Logie

fr. onto-théo-logie
es. onto-teo-logía
in. onto-theo-logy
pt. onto-teo-logia

Ontologie é o “estudo (logos) dos entes (onta)”, Theologie, o “estudo de Deus (theos)”. Heidegger combina essas palavras derivadas do grego para formar Onto-Theologie ou Onto-Theo-Logie. A ideia, mas não as palavras, vem de Aristóteles, cuja “primeira filosofia” considera tanto os entes enquanto tais quanto o ser mais elevado (Kant e o problema da metafísica, 220/150; Retorno ao Fundamento da Metafísica, 373/275). Assim sendo, a ontoteologia formula duas questões distintas: 1. O que são os entes enquanto tais em geral? 2. O que é o ser mais elevado, e qual a sua natureza? (A Tese de Kant sobre o ser, 443). As questões fundem-se facilmente em alemão, já que Was ist das Seiende?, “O que são os entes?”, é literalmente “O que é o ser?” ou “O que é isto que é?”, que poderia ser tanto a questão 1 quanto a questão 2. Certas vezes Heidegger explica de modo diferente as duas questões. A questão 1 é “sobre os entes enquanto tais (nach dem Seienden als einem solchen)”, a questão 2 é “sobre os entes como um todo (nach dem Seienden im Ganzen)” (Kant e o problema da metafísica, 220/150). Ele imputa esta fusão à sua obra anterior: em O que é Metafísica?, “a metafísica é definida como a questão sobre os entes enquanto tais e como um todo (nach dem Seienden als solchen und im Ganzen). A totalidade deste todo (die Ganzheit dieses Ganzes) é a unidade dos entes, o solo que os traz à luz e os unifica. Para qualquer um que possa ler, isto significa: a metafísica é Onto-Theo-Logie” (Identidade e Diferença, 51/54). Em outras obras, ele localiza a confusão na frase inteira das Ganze des Seienden als solchen, “o todo dos entes enquanto tais”, que pode significar: 1. “os aspectos mais gerais dos entes”, ou 2. “o ser mais elevado e portanto divino” (Retorno ao Fundamento da Metafísica, 373/275). (Aristóteles não tem culpa desta confusão: seu deus é um ente entre os outros, não a totalidade dos entes. Mas em Identidade e Diferença Heidegger está lidando com Hegel, cujo deus é a estrutura geral dos entes, não um ente individual.)

Biologie é o “estudo” ou “ciência” dos seres vivos. Mas na Onto-Theologie, -logie desempenha um papel mais importante. Logos, de legein, “dispor, arranjar, reunir, dizer etc”, significa “solo, deixar (as coisas) estarem diante (de nós) (Vorliegenlassen)”, e também “reunião (Versammlung), união” (Identidade e Diferença, 54s/57; 67/69). A metafísica faz as duas coisas. Ela reúne os entes para considerá-los “como um todo”. Ela considera o ser com o “solo” dos entes: “Ontologia e teologia são ‘-logias’ porque alcançam as profundezas (ergründen) dos entes enquanto tais e os fundamentam (begründen) como um todo (im Ganzen, lit. ‘no todo’)” (Identidade e Diferença, 56/59). Por isso, Hegel chamou a metafísica de “lógica”; ela é Onto-Theo-Logik.

Como Deus torna-se um ente, o ente mais elevado, ao invés de simplesmente Sein, “o ser” ? Ser e entes são distintos, mas inseparáveis. O ser “fundamenta (gründet)” os entes, e inversamente os entes “constituem (begründet)” o ser. Os entes só podem, no entanto, constituir o ser na forma de um único ente supremo, uma causa que é causa sui, “causa de si”: “Este é o nome apropriado para o deus da filosofia. O homem não pode rezar para este deus, nem lhe oferecer sacrifícios. O homem não pode cair de joelhos por admiração diante da causa sui, nem dançar e tocar diante deste deus” (Identidade e Diferença, 70/72). Heidegger considera que “o pensamento sem-deus”, o pensamento que rejeita esse deus da filosofia, está “talvez mais próximo do deus divino” (Identidade e Diferença, 71/72): “O caráter ontoteológico da metafísica tornou-se questionável para o pensamento, não na base de um ateísmo qualquer, mas a partir da experiência de um pensamento que viu na onto-teo-logia a unidade ainda impensada da essência da metafísica” (id, 51/55). Pensando sobre esta unidade, e sobre a diferença que a metafísica discerne apenas vagamente, Heidegger vai além da metafísica. (DH)