Zahavi: si mesmo

nossa tradução

A ideia crucial proposta por todos os fenomenólogos é que uma compreensão do que significa ser um si mesmo exige um exame da estrutura da experiência e vice-versa. Em outras palavras, a alegação feita é que as investigações de si mesmo e da experiência precisam ser integradas para que ambas sejam entendidas.

Mais precisamente, afirma-se que o si mesmo (mínimo ou central) possui a realidade experiencial, é levado a estar intimamente ligado à perspectiva da primeira pessoa e é, de fato, identificado com a dação pessoal dos fenômenos experienciais. Na sua forma mais primitiva, a consciência de si mesmo é simplesmente uma questão de ter acesso pessoal à própria consciência; é uma questão da dação ou manifestação pessoal da vida experiencial. Essa dação pessoal de fenômenos experienciais não é algo incidental ao seu ser, um mero verniz que as experiências poderiam faltar sem deixar de ser experiências. Pelo contrário, essa dação pessoal torna as experiências subjetivas. Embora existam diferentes tipos de experiências (o cheiro do feno, a visão de um pôr-do-sol, o toque de um cubo de gelo etc.), e embora existam diferentes tipos de dação experiencial (perceptiva, imaginativa e recoletiva, etc.) há características comuns também. Uma dessas características comuns é a qualidade da ser-minha (ou para usar o termo de Heidegger “Jemeinigkeit”). Se uma certa experiência é experienciada como minha ou não, não depende de algo à parte da experiência, mas da dação da experiência. Se a experiência é dada a mim em um modo de apresentação pessoal, ela é experienciada como minha experiência, caso contrário não. Estar consciente de si mesmo, consequentemente, não é capturar um si puro que existe em separação (9) do fluxo da consciência, mas implica apenas estar consciente de uma experiência em seu modo de dação pessoal. Em suma, o si referido não é algo que está além ou oposto ao fluxo de experiências, mas é uma característica ou função de sua dação. É a dimensão invariável da dação pessoal na multidão de experiências em mudança.

Aliás, essa visão deixa claro que a consciência de si não deve ser entendida como uma consciência de um si isolado e sem mundo, nem o si localizado e escondido na cabeça. Ser consciente de si não é interromper a interação experiencial com o mundo para desviar o olhar; pelo contrário, a consciência de si é sempre a autoconsciência de um si imerso no mundo. O si está presente a ele mesmo de maneira precisa e, de fato, apenas quando está envolvido no mundo. Consequentemente, seria um erro decisivo interpretar a noção fenomenológica de um núcleo, ou mínimo, como um resíduo mental ao estilo cartesiano, isto é, como algum tipo de interioridade fechada no si e suficiente no si. A noção fenomenológica de si é totalmente compatível com uma forte ênfase na intencionalidade fundamental, ou estar no mundo, da consciência. Não é por acaso que mesmo Heidegger empregou tal mínima noção de si (cf. Zahavi 2003b).

Original

(ZAHAVi, Dan. “Being Someone”, in PSYCHE 11 (5), June 2005)

  1. For a sustained defence of these notions of self-awareness and self, cf. Zahavi 1999, 2000, 2003a, and in particular 2005b.[↩]
  2. Although Henry might in fact be read as defending a kind of immanentism, I would take exception to this aspect of his position (cf. Zahavi 1999).[↩]

Heidegger – Fenomenologia e Hermenêutica

Responsáveis: João e Murilo Cardoso de Castro

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