Schürmann (BAPA:4) – presença e ação

Tradução

Ele (Heidegger) não separa a antiga unidade entre teoria e prática, mas faz muito pior: levanta a questão da presença de tal maneira que a questão do agir já está respondida; ele a levanta de tal forma que a ação não pode mais se tornar uma questão separada; de tal forma que buscar um padrão duradouro para responder à pergunta: ‘O que deve ser feito?’ é procurar no vácuo do lugar desertificado pelas sucessivas representações de um terreno inabalável; de tal forma, finalmente, que as constelações epocais da presença sempre prescreveram não apenas os termos em que a questão da ação pode e deve ser levantada (termos ousiológicos, teológicos, transcendentais, linguísticos), mas também o fundamento a partir do qual ela pode e deve ser respondida (substância, Deus, cogito, comunidade discursiva), bem como os tipos de respostas que podem e devem ser aduzidas (hierarquia das virtudes, hierarquia das leis – divinas, naturais e humanas – hierarquia dos imperativos e hierarquia de interesses discursivos, ou seja, cognitivos ou emancipatórios). A desconstrução heideggeriana (Abbau – o termo só se tornou uma palavra de ordem uma vez traduzido para o francês, cinquenta anos depois de ter sido cunhado) das constelações históricas da presença mostra que se pode falar da unidade fechada da época metafísica pelo menos em um aspecto: a preocupação em derivar uma filosofia prática de uma filosofia primeira. ‘Metafísica’ é então o título desse conjunto de esforços especulativos com vista a um modelo, um cânone, um principium para a ação. À luz da desconstrução, esse conjunto surge como um campo fechado. A hipótese do fechamento do campo metafísico é o ponto de partida para tudo o que se seguirá. Esta hipótese funciona duplamente (embora a oposição entre sistema e história acabe por ser vítima desta mesma hipótese): é um encerramento sistemático, na medida em que as normas de ação formalmente “procedem de” as primeiras filosofias correspondentes; e é um fechamento histórico, uma vez que o discurso desconstrucionista só pode surgir da fronteira da época sobre a qual é exercido. A hipótese de fechamento determina a desconstrução a cada etapa de seu andamento. Ela confere sua ambiguidade ao empreendimento heideggeriano: ainda encerrado na problemática da presença, mas já fora do feudo onde a presença funciona como presença constante, como identidade de si com si, como fundamento inabalável.

Gros

(SCHÜRMANN, Reiner. Heidegger on Being and Acting: from principles to anarchy. Tr. Christine-Marie Gros with the author. Bloomington: Indiana University Press, 1987, p. 4)

Excertos de ,

Heidegger – Fenomenologia e Hermenêutica

Responsáveis: João e Murilo Cardoso de Castro

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