(Rorty2009)
Em ambos os lados do canal, entretanto, a maioria dos filósofos permaneceu kantiana. Mesmo quando afirmam ter “ido além” da epistemologia, concordam que a filosofia é uma disciplina que toma como seu estudo os aspectos “formais” ou “estruturais” de nossas crenças, e que, ao examinar esses aspectos, o filósofo serve à função cultural de manter as outras disciplinas honestas, limitando suas afirmações ao que pode ser apropriadamente “sustentado”. As grandes exceções a esse consenso neokantiano são, mais uma vez, Dewey, Wittgenstein e Heidegger. Em conexão com o tópico desta seção — a noção de “fundamentos” do conhecimento como baseada numa analogia com a compulsão a acreditar ao olhar para um objeto —, é Heidegger quem é especialmente importante. Pois Heidegger tentou mostrar como a noção epistemológica de “objetividade” deriva, como ele coloca, da “identificação” platônica “de φυσις com ἰδέα” — da realidade de uma coisa com sua presença diante de nós.1 Ele está preocupado em explorar o modo pelo qual o Ocidente [169] ficou obcecado com a noção de nossa relação primária com objetos como análoga à percepção visual e, assim, em sugerir que poderia haver outras concepções de nossa relação com as coisas. As raízes históricas da analogia do conhecimento com a percepção de Aristóteles-Locke estão além do escopo deste livro, mas podemos ao menos tomar emprestada de Heidegger a ideia de que o desejo por uma epistemologia é simplesmente o produto mais recente do desenvolvimento dialético de um conjunto de metáforas originalmente escolhido.2