Romano – Onde passou o passado?

tradução

Mas como é que estes filósofos justificam a tese de que o tempo pertence originalmente àquilo a que chamamos, à falta de um termo melhor, subjetividade, deixando de lado as diferenças – muitas vezes consideráveis – entre eles? Através de um argumento aparentemente simples, aquele que acabámos de enunciar: para que haja tempo, dizíamos, não basta que os fenômenos se sucedam, é preciso que essa sucessão possa aparecer, e para que isso aconteça é necessário que os momentos anteriores sejam retidos por uma consciência, mantidos presentes apesar de passados, ou melhor, como passados por um ato de memória. Se o passado se limitasse a passar, se não pudesse de modo algum permanecer ali, quase-presente, sob a luz da consciência, não haveria de fato passado, nem presente, nem sucessão de espécie alguma, não haveria tempo algum. O passado deve poder permanecer presente no presente sob a forma de um presente de-passado, para poder passar como passa e permanecer como permanece, deve poder negar o seu próprio ser passado para se conservar e se apresentar ao presente, para poder ser o que é: passado. Se o passado não estivesse algures, para nós, como que à mão, se não estivesse presente à sua maneira no “presente expandido” de uma consciência, nem sequer seria passado; ou, mais simplesmente: se o passado não estivesse presente de alguma maneira, nem sequer se poderia dizer que é passado: toda a sucessão seria abolida, e já nem sequer haveria tempo.

Todas as filosofias que acreditam poder pensar o tempo como um fenômeno originalmente subjetivo colocam a mesma questão: para onde foi o passado? Ou, dito de outro modo: como é que o passado está presente, ainda lá, no presente, permanecendo precisamente em si mesmo como passado? Se o passado é apenas passado, não há tempo nenhum; mas se o passado está inteiramente presente no presente, perde o seu próprio caráter de passado: tal é a aporia ou dupla impossibilidade que qualquer fenomenologia coerente do tempo tem de enfrentar, ao que parece.

Original

OÙ EST PASSÉ LE PASSÉ?

Excertos de

Heidegger – Fenomenologia e Hermenêutica

Responsáveis: João e Murilo Cardoso de Castro

Twenty Twenty-Five

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