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Tradução
O primeiro início, o início grego, é marcado sobretudo pela descoberta e ascendência da theoria, concebida como uma pura contemplação das formas de todos os entes, um modo de Ser em que a contemplação é cada vez mais separada da práxis ética e política. – separada, abstraída e isolada a ponto de não ser mais vista como sendo uma práxis mundana de forma alguma – e as formas são igualmente estudadas em abstração de sua incorporação material e sensual. Em ambos os lados (lados que, na modernidade, acabariam por se tornar “sujeito” e “objeto”) o que ocorre é um afastamento e um distanciamento da morada humana de sua exposição à imediatez sensual das coisas. Procedemos como se não fossemos realmente, imediata ou convincentemente, reivindicados e dependentes do sensual. No entanto, essa hipótese fantástica – essa história que contamos a nós mesmos de que não pertencemos realmente ao mundo, de nossa posição acima e além dele em toda a glória de nosso domínio – tem repercussões muito reais. Para Heidegger, o “primeiro início” não ficou para trás em algum passado grego remoto, nem é o tema romantizado de algum anseio nostálgico. É o que continua a ter domínio sobre nós, o que domina nosso futuro e ações em desenvolvimento, na medida em que nosso êthos cultural é dominado por toda a ciência e tecnologia. Suas repercussões afetam não apenas aqueles de nós que se engajam diretamente na produção de ciência e tecnologia, ou aqueles de nós que, direta ou indiretamente, consciente ou inconscientemente, temos afirmado este modo de vida. Afetam o mundo inteiro, todos os entes, que se veem incapazes de resistir à força hegemônica que se impõe em todo o globo, erradicando outras histórias, outras culturas, outras línguas, outras formas de Ser, outro êthê. A obra de Heidegger não é apenas uma meditação sobre o poder desse “primeiro início” da cultura ocidental, uma tentativa de compreendê-lo em todas as suas dimensões; é também, portanto, uma tentativa de se preparar para a possibilidade do que ele chama de “outro início”.
Original
(MCNEILL, William. The Time of Life. Heidegger and Êthos. New York: State University of New York Press, 2006, p. xv-xvi)