6- O Ocidente 1: não tanto uma cultura, mas a cultura comum para a qual todas as outras são traduzidas e apagadas no próprio ato da sua comunicação. O Ocidente como berço da ciência (Husserl), isto é, de um mundo comum a todos (incluindo os não ocidentais), um mundo de fatos positivos e de leis universalmente válidas; o Ocidente como berço da metafísica (Heidegger), isto é, de um modo de pensar que transpõe a singularidade do ser ([?Seyn]) para a ideia geral de quantidade; o Ocidente como berço do capitalismo (Marx), isto é, de um sistema de produção que substitui o valor de uso, sempre particular, pelo primado anônimo do valor de troca, através do qual todas as coisas, tornadas mercadorias [201], comunicam; o Ocidente como berço da democracia, isto é, de um regime político em que tudo é acessível a todos e em que a soberania se torna, paradoxalmente, o exercício da vontade geral e igualitária (Rousseau): desde Nietzsche, tornou-se habitual agrupar todos estes aspectos do Ocidente sob o nome de niilismo. O niilismo existe quando nada é absolutamente (e, portanto, solitariamente) válido, mas apenas na sua relação com outro (outros) em que se funda, fundando-o reciprocamente, como os elementos pavoneantes de um castelo de cartas que se apoiam mutuamente sem que nenhum deles possa manter-se de pé sozinho (Comte e Proudhon — o conservador e o rebelde — seriam talvez os pensadores mais puros deste niilismo tranquilo em que se cumpre o destino/declínio do Ocidente).
[MARQUET, Jean-François. Singularité et événement. Grenoble: J. Millon, 1995]