temporalidade

Na medida em que o Dasein vem a si mesmo a partir do vir que o a-vir abre, este modo de ser temporal (esta ekstasis da temporalidade) tem, num certo sentido, uma primazia. Heidegger explica isto na página 329 de Ser e Tempo:

“Ao enumerar as ekstases, nomeamos sempre o a-vir em primeiro lugar. Isto é para sublinhar que o a-vir tem primazia dentro da unidade ekstática da temporalidade original e própria, embora a temporalidade não surja precisamente de uma acumulação e sucessão de ekstases, mas seja sempre temporal na sua co-originalidade. Mas dentro delas os modos de temporalização são diferentes. E a diferença reside no fato de a temporalidade poder ser determinada principalmente com base nas diferentes ekstases. A temporalidade originária e própria é temporizada a partir do a-vir próprio de tal modo que, abrindo o a-vir ao que nunca deixou de ser, desperta sobretudo o presente. O fenômeno primitivo da temporalidade originária e própria é o a-vir.

Porque Heidegger já não se situa na linearidade unidimensional do tempo como continuação do agora, não pode haver primazia do a-vir, nem ontológica nem cronologicamente: o a-vir não é anterior ao presente, em espera, ele “não designa aqui um agora que ainda não se tornou real e que só será real uma vez” (ÊT, 325), mas abre o Dasein à finitude do seu ser-possível, no interior do qual, de modo igualmente original, jogam uma na outra (para usar as palavras da conferência Tempo e Ser, Questions iv, p. 34) as três dimensões do tempo verdadeiro. De um modo original, porém, e na sua efusão, é portanto a partir do vir que o a-vir libera que se joga a temporalização do tempo na sua tripla modulação. Assim, o verdadeiro passado (ser-sido) nunca é passado, porque ele “nasce, de certo modo, do a-vir” (ÊT, 326; ver também GA26, 266), dando origem ao presente. O primado do a-vir não exclui, mas, pelo contrário, torna possível a unidade das três ekstases, tal como Heidegger a coloca:

Num retorno sobre si mesmo rico em a-vir, a resolução aproxima-se da situação fazendo-se presente nela. O ser-aí nasce do a-vir de tal modo que o a-vir, tendo sido (melhor dito: sendo sido), deixa o presente dele vir. Chamamos a este tipo de fenômeno unificador, em que o a-vir presenta-se em tendo sido, temporalidade [ÊT, 326]. (LDMH)