Não mais do que Heidegger, Sólon convida-nos a cometer suicídio, mas a considerar a teleute, isto é, a conclusão, o fim no sentido daquilo que conduz à plenitude: a finitude como horizonte que liberta o possível. O poder-ser mais próprio do Dasein, aquele que não está obcecado pelo que está antes (pareon), mas que deixa a possibilidade ser como possibilidade para encontrar a morada da existência, este “poder” que abre o Dasein ao seu ser-inteiro, é o que Heidegger chama die vorlaufende Entschlossenheit : a abertura da resolução (aquela através da qual tocamos a verdade do Dasein, a sua abertura mais própria, ver ÊT, 297) que se abre avançando para além de si mesma, em direção à morte. É na abertura desta resolução, a partir do horizonte de possibilidade libertado pela morte, que o Dasein pode chegar a si mesmo. É a este vir a si que Heidegger chama futuro, na página 325 de Ser e Tempo, e é preciso sublinhar aqui que o futuro (die Zukunft: -kunft, parente de kommen, significa vir e zu indica o movimento daquilo que vem em direção a, dirigindo-se a) é assim nomeado a partir do próprio movimento de vir, a partir do verbo (Zukommen-lassen) que permite que o vir seja como vir e assim mantém a possibilidade como possibilidade. O futuro impróprio, por outro lado, é aquele que reduz a possibilidade a resultados esperados, e que de cada vez espera algo (cf. ÊT, 337 — note-se que é nesta dimensão que Husserl se move, escrevendo no §26 das Lições que “a expectativa encontra a sua realização na percepção. Pertence à essência do que é esperado ser algo que será percepcionado”).
Tendo em conta estes dois entendimentos possíveis, próprio e impróprio, é notável o fato de a palavra francesa “avenir” ser, como assinala o Dictionnaire historique de langue française, a substantivação das expressões temps advenir e estre à venir.
Trata-se, portanto, de um composto do verbo venir, distinto de um outro substantivo avenir “sucesso, êxito” (Froissart), que provém do verbo avenir no sentido de “ter êxito, atingir os seus objetivos”. Este verbo, que já se encontrava no século XI, significava originalmente “chegar por acaso ou de surpresa”; foi emprestado do composto latino advenire, de ad- (-à) e venire (-vindo)…
O a-vir não é, pois, um “ainda não” em relação a um presente bem real, mas a dimensão a partir da qual o Dasein vem a si mesmo e, resolvido nesse vir, acede ao seu tempo, a esse tempo finito que, no entanto, sempre “tem”: “a existência própria é sempre reconhecida pelo fato de, a partir do momento em que se resolve, nunca perder tempo e ‘ter sempre tempo’”, diz Heidegger (ÊT, 410), que já tinha escrito na conferência de 1924 sobre O Conceito de Tempo:
Nesta Vorlaufen [digamos, por falta de uma tradução satisfatória: estar à frente de si mesmo, avançando da morte] eu sou propriamente tempo, eu tenho tempo [GA64, 124; Cahier de l’Herne Heidegger, p. 51]. (LDMH)