gesto

J — Certamente e, sobretudo, porque a superfície do mundo japonês é inteiramente europeia ou, se preferir, americana. O mundo japonês, o seu mundo de fundo, ou melhor, o que ele é em si mesmo, o senhor pode experimentar no teatro Nô.

P — Conheço apenas um texto sobre o teatro Nô.

J — Qual, se me permite perguntar?

P — O tratado de Beni.

J — Para a crítica japonesa, trata-se de uma obra fundamental e, sem dúvida, a melhor coisa que o senhor poderia ler sobre o Teatro Nô.

P — Mas só a leitura não é suficiente.

J — O senhor precisa assistir às encenações. E mesmo assim é difícil, enquanto o senhor não conseguir morar no lugar e no modo de ser japonês. Para que o senhor possa ver, mesmo que à distância, algo do que determina o Teatro Nô, gostaria de observar que o palco japonês é vazio.

P — Este vazio requer e exige uma concentração extraordinária.

J — Graças a ela, basta um pequeno gesto para fazer surgir de uma estranha tranquilidade algo vigoroso.

P — O que o senhor quer dizer?

J — Para fazer aparecer uma paisagem de montanha, o ator eleva vagarosamente a mão aberta e a mantém parada acima dos olhos na altura das sobrancelhas. Posso mostrar?

P — Por favor.

(O japonês levanta e mantém a mão na maneira indicada)

É uma gesticulação difícil para o europeu.

J — O gesto não está tanto no movimento visível da mão e nem na postura do corpo. É difícil dizer o que na sua língua se entende propriamente com a palavra “gesto”.

P — Mas talvez essa palavra possa nos ajudar a fazer a experiência do que se quer dizer.

J — No fundo, o que tenho em mente coincide com essa palavra.

P — O gesto é o recolhimento de um trazer.

J — E de propósito que o senhor não diz do nosso trazer, de nossa postura,

P — porque o que traz, traz a si mesmo até nós,

J — e nós apenas lhe trazemos ao encontro nossa parte.

P — E o que se traz até nós, já trouxe, inscrito em seu trazer, o trazer de nossa parte.

J — O senhor chama, portanto, de gesto a força que reúne originariamente em si a unidade entre o trazer até nós e o nosso trazer.

P — O perigo de uma formulação como essa reside no fato de se representar a reunião como uma composição posterior…

J — em lugar de se fazer a experiência de que todo trazer, tanto o trazer até nós como o trazer de nossa parte, brota da reunião.

P — Se conseguíssemos pensar o gesto desse modo, onde estaria então o próprio do gesto que o senhor acabou de me mostrar?

J — Numa visão invisível que se traz de maneira tão recolhida para o vazio, que nele e por ele a montanha aparece em toda a sua presença. [GA12]