GA5:323-325 – pré-socráticos

Nas suas lições sobre a história da filosofia grega, na passagem em que fala das fontes do conhecimento da época da filosofia mais antiga, Hegel diz o seguinte: “Aristóteles é a fonte mais rica. Estudou os filósofos mais antigos de forma expressa e fundada e, sobretudo no princípio da sua Metafísica (de resto, também em muitos outros lugares), falou deles historicamente, por ordem. Ele é tão filosófico como erudito; podemos confiar nele. No que diz respeito à filosofia grega, não há nada melhor do que estudar o primeiro livro da sua Metafísica (WW. XIII. S.189)

A recomendação que Hegel faz aqui aos seus ouvintes, nas primeiras décadas do séc. XIX, já tinha sido seguida, no tempo de Aristóteles, por Teofrasto, seu aluno e seu primeiro sucessor na direcção da escola peripatética. Teofrasto morreu por volta de 286 a.C.. É autor de uma obra com o título Φυσικῶν δόξαι, “as opiniões daqueles que falam dos φύσει ὄντα”. Aristóteles chama-lhes também φυσιολόγοι. Isto refere-se aos pensadores iniciais, que tratam das coisas da natureza. Φύσις significa terra e céu, planta e animal, de certo modo também o homem. A palavra designa um domínio particular do ente que, em Aristóteles, tal como, em geral, na escola de Platão, se encontra delimitado em relação a ἦθος e λόγος. Φύσις já não tem (374) o significado lato de “todo do ente”. Este modo do ente, enquanto φύσει ὄντα, é delimitado por Aristóteles, no (299) princípio das considerações temáticas da Física, ou seja, da ontologia dos φύσει ὄντα, em contraposição com os τέχνη ὄντα. Os φύσει ὄντα são aquilo que, ao brotar, vem a ser a partir de si próprio; os τέχνη ὄντα vêm a ser através do representar e produzir humanos.

Quando Hegel diz que Aristóteles é tão filosófico como erudito, isto significa: Aristóteles vê os pensadores iniciais numa perspectiva historiográfica, no horizonte e segundo o padrão da sua Física. Isto significa, para nós:

Hegel compreende os filósofos pré-platónicos e pré-socráticos como pré-aristotélicos. Daí em diante, cristalizou-se uma dupla opinião na perspectiva que se generalizou a respeito da filosofia anterior a Aristóteles e Platão: 1. Os pensadores iniciais, que perguntaram pelos primeiros princípios do ente, tomaram, primariamente e a maior parte das vezes, apenas a natureza como objecto do seu representar. 2. As suas proposições acerca disso permanecem algo indeterminadas e insuficientes, se as compararmos com aquilo que, entretanto, se desenvolveu, quanto ao conhecimento da natureza, na escola platônica e aristotélica, bem como nos Estoicos e nas escolas médicas.

As Φυσικών δόξαι de Teofrasto tornaram-se, na época do Helenismo, a fonte principal dos manuais de história da filosofia. A partir destes manuais – que, ao mesmo tempo, determinaram a interpretação dos escritos originais, ainda conservados, dos pensadores iniciais – , formou-se a posterior tradição doxográfica da filosofia. Não só o conteúdo, mas também o estilo desta tradição cunharam, até Hegel e para além dele, a relação dos pensadores posteriores com a história do pensar. (GA5:323-325; GA5BD:374-375)