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No entanto, enquanto o jogo humano é reconhecido como um fenómeno, o jogo cósmico nunca é encontrado e corroborado como uma ocorrência objetivamente presente e intersubjectivamente identificável. O jogo do mundo não é um fenómeno. Não se pode apontá-lo ou torná-lo objeto de um método científico de investigação. É inicialmente um pensamento e nada mais. Mas o que é um “pensamento” continua a ser um problema repleto de questões. Será um pensamento algo meramente “imaginado”, um fantasma, algo que a nossa alma sonhou — uma representação que não corresponde a nada de real? Ou será que o poder do pensamento atinge mais profundamente a essência do Ser do que a representação sensorial, na qual as chamadas “coisas reais” se manifestam para nós? A “ideia” de Platão não pode ser determinada pela visão, audição, paladar ou olfato — e no entanto conta para ele como “tendo mais ser (seiender)”, como mais forte no seu Ser do que as coisas sensíveis. É apenas o pensamento como apreensão genuína que está associado à ideia platónica. As ideias platónicas também não são fenómenos. É claro que não se pode simplesmente inverter a situação e sustentar que tudo o que não se anuncia de forma identificável como fenómeno é uma atualidade de categoria superior; pois abrir-se-ia assim a porta ao fanatismo mais selvagem e perder-se-ia o rigor do conceito filosófico. Ora, para “interpretar (deuten)” o movimento total da atualidade do mundo em analogia com o jogo humano, poder-se-ia talvez dizer que o conceito de “jogo do mundo” significa antes de mais um símbolo especulativo. Tratar-se-ia de uma “transferência” de estruturas pertencentes a uma encenação específica da vida humana para o todo mundano de todos os seres, uma questão de meta-pherein, uma metáfora — de facto, uma questão de correspondência entre um ser interior do mundo e o próprio mundo. Esta “transferência”, poder-se-ia dizer, tem a sua base no fenómeno do jogo, que é, de facto, uma realidade humana — o pensamento filosófico salta desta base quando tenta pensar todo o movimento do mundo a partir do conceito de jogo; num tal salto, tem necessariamente de mudar e transformar-se, se se tornar expressamente consciente da diferença entre uma coisa do mundo interior e o próprio mundo. A elaboração diferenciada das estruturas fenoménicas do jogo humano surge então como a tarefa mais urgente, enquanto a análise da questão de saber se o conceito de jogo pode ser transferido numa analogia simbólica para o acontecimento do mundo — e até que ponto uma tal metáfora tem valor para o conhecimento filosófico — surge então como uma questão subordinada. O argumento do “senso comum”, que, com a sua saúde de bochechas rechonchudas, se move com a diferença entre coisa e mundo como um estado de coisas evidente, é mais ou menos assim. No entanto, talvez aqui não se trate apenas da diferença entre coisa e mundo, mas ao mesmo tempo da questão de como uma coisa peculiar do mundo interior, o ser humano que compreende o Ser, se relaciona com o mundo-totalidade. No fim de contas, nada se consegue distinguindo o jogo humano e o jogo do mundo, um designado como fenómeno, o outro como pensamento especulativo. A relação-mundo da existência humana não é um assunto já previamente conhecido e apurado de modo a podermos aplicar a distinção entre o ser humano e o mundo, por assim dizer, ao jogo. É antes o contrário. Numa discussão sobre o jogo talvez consigamos os recursos conceptuais para pensar e conceber primordialmente a diferença e a pertença conjunta do ser humano e do mundo.