Fink (1966b:228-230) – O homem sempre escolhe a si próprio

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(…) O homem realiza-se escolhendo-se a si próprio de muitas maneiras diferentes ao longo da sua vida: sempre que escolhe, acaba por escolher apenas a si próprio. Nas decisões da sua liberdade, ele determina a sua individualidade. Ignoramos aqui o fato de a ação da liberdade humana pressupor uma base que não pode ser escolhida, que é, por assim dizer, irrigada pela herança que nos foi legada pela natureza e que temos de aceitar. De fato, não podemos entrar em disputa com a natureza sobre os “dons”, grandes e pequenos, que ela nos deu para nos acompanhar ao longo da vida. Ela deixa-nos à nossa sorte, e cabe-nos a nós “aproveitar o talento que nos foi confiado”. A partir daí, escolhemo-nos a nós próprios nas ações que praticamos, mas também nas nossas omissões e falhas. Tornamo-nos cada vez mais a obra dos nossos atos e dos nossos erros. Nas decisões da nossa própria liberdade, definimo-nos, determinamo-nos, escolhemos uma determinada realidade de entre as muitas possibilidades que se nos abrem. Podemos, sem dúvida, reverter decisões que já tomámos, transformar antigas determinações em novas, mas apenas de forma a determinarmo-nos, a definirmo-nos de novo. Em cada ato de livre escolha, fixamo-nos numa forma habitual da vontade. Nas ações de liberdade, criamos o estilo de uma conduta de vida auto-responsável. Não podemos realmente livrar-nos dele a toda a hora, não podemos realmente fugir de nós próprios e livrar-nos do peso da nossa própria responsabilidade, não podemos realmente saltar as nossas ações, mas podemos realmente fazer tudo isto de uma “forma irreal”, isto é, no jogo. O jogo liberta-nos temporariamente da história das nossas ações, liberta-nos do trabalho da liberdade e devolve-nos uma irresponsabilidade que experimentamos com prazer. Sentimos a abertura da vida, a ausência de limites, a vibração na abundância das possibilidades, sentimos o que “perdemos” na ação que decide, sentimos o jogo no coração da liberdade, a irresponsabilidade na origem de toda a responsabilidade.

Hildenbrand & Lindeberg

Excertos de

Heidegger – Fenomenologia e Hermenêutica

Responsáveis: João e Murilo Cardoso de Castro

Twenty Twenty-Five

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