A suprema valorização da imaginação (Imagination) por parte de Heidegger é obtida através do seu famoso comentário à Crítica da Razão Pura, intitulado Kant e o Problema da Metafísica (GA3). Este título anuncia imediatamente o programa do comentador. Para Heidegger, a Crítica da Razão Pura não pode ser reduzida ao seu projeto explícito. O filósofo chega mesmo a afirmar que “não tem nada a ver com uma teoria do conhecimento”. A intenção mais profunda de Kant é metafísica, de acordo com a definição de Baumgarten: “metaphysica est scientia prima cognitionis humanae principia continens”. A teoria do conhecimento de Kant consiste, assim, não só em estabelecer as condições a priori de todo o conhecimento do ente, mas também em procurar o fundamento que permite que essas condições se desenvolvam e alcancem o ente enquanto tal. A Crítica de Kant merece o título de ontologia na medida em que visa a raiz da razão humana e pretende alcançar o “domínio da origem”, como diz Heidegger, onde se revela o ser do ente, o fundamento de todo o conhecimento possível de qualquer ente. A tarefa de Kant é descobrir, na razão humana e nas suas faculdades, essa “raiz”, esse poder originário capaz de projetar, antes de qualquer conhecimento de um ente, o seu ser enquanto tal.
(DUFOUR-KOWALSKA, G. L’art et la sensibilité: de Kant à Michel Henry. Paris: J. Vrin, 1996)