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Casanova
Ser sujeito do significante, porém, isso também quer dizer, e ainda quer dizer, duas coisas indissociáveis, que se acoplam na subjetividade do sujeito. O sujeito do significante está sujeitado ao significante. Lacan não para de insistir sobre a “dominância” do “significante sobre o sujeito”1, assim como sobre a “ordem simbólica que é, para o sujeito, constituinte”2. O “sujeito” não (186) é senhor dessa ordem. Nem a soberania. O verdadeiro soberano humano é o significante. A entrada do sujeito na ordem humana da lei supõe essa finitude passiva, essa incapacidade, essa falta da qual o animal não sofre. O animal não conhece o mal, a mentira, o engodo. O que lhe falta é justamente a falta em virtude da qual o homem é sujeito do significante, sujeito sujeitado ao significante soberano. Mas ser sujeito do significante também é ser sujeito assujeitador, sujeito mestre, sujeito ativo que decide o significante; bastante mestre em todo caso, se os senhores quiserem, para ser capaz de fingir o fingimento e, então, de poder estabelecer o seu poder de aniquilamento do rastro. Essa soberania é a superioridade do homem sobre a besta, mesmo que ela esteja assegurada segundo o privilégio da falha, da falta ou do erro, de um defeito que se reconduz tanto à prematuração genérica do nascimento quanto ao complexo de castração — que Lacan, em um texto que citarei em um instante, designa como a versão científica (em todo caso não mitológica) e freudiana do pecado original e do erro de adâmico.
É aí que a passagem do imaginário para o simbólico se determina como passagem da ordem animal para a ordem humana. É aí que a subjetidade, como ordem do significante segundo o lugar do Outro, teria passado despercebido pela filosofia tradicional do sujeito, como relações entre o homem e o animal. Tal é ao menos a alegação de Lacan no momento em que ele reintroduz sutilmente a lógica do antropocentrismo e reforça firmemente o fixismo do cogito cartesiano como tese sobre o animal-máquina em geral.
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- Por exemplo, em “O seminário sobre a ‘Carta roubada”, em: Escritos, op. cit., p. 61.[
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- “(…) é a ordem simbólica que é, para o sujeito, constituinte, ao vos demonstrar em uma história a determinação maior que o sujeito recebe do percurso de um significante” (Ibid, p. 12).[
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- Par exemple dans « Le séminaire sur “La Lettre volée” », dans Ecrits, op. cit., p. 61.[
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- « (…) c’est l’ordre symbolique qui est, pour le sujet, constituant, en vous démontrant dans une histoire la détermination majeure que le sujet reçoit du parcours d’un signifiant. » (Ibid., p. 12.)[
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