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A introspecção só é possível a partir de uma compreensão do ser e, por conseguinte, a partir de uma transcendência do si mesmo sobre o seu próprio corpo e sobre qualquer situação definida onticamente. Em se intro-espectando, o si mesmo está sempre noutro lugar que não aquele onde pensa estar, e quanto mais intenso for, mais há “especção”, menos há “intro”, interioridade, menos há interiorização do si mesmo; quanto mais o si se centra em si mesmo como eu na introspecção, mais se deporta para o ser pela compreensão da qual apenas os seus estados de consciência podem aparecer para um pensamento ; quanto mais o si mesmo pensa, menos coincide com a sua imediaticidade ôntica; expõe-se cada vez mais ao ser para poder tomar o campo que lhe permite distinguir cada estado interior particular com maior precisão. A introspecção contradiz em seu ser o que acredita ser, anula o que visa — nomeadamente as vivências físicas e psicológicas, e o eu como o conjunto dessas vivências — pelo que faz. É porque o eu está sempre para além, επέκεινα, numa outra região, num outro elemento, numa outra ordem que não a ordem do ente, que há para ele ente enquanto ente, ente em seu ser, que lhe é dado abrir-se a este ou àquele ente com esta ou aquela insistência, fazer aparecer as coisas por dicotomia e diferenciação nas suas características precisas, descascar a multiplicidade dos seus “estados interiores” fazendo aparecer os seus diferentes matizes afectivos, e dedicar-se a tal tarefa com tanta aplicação que se esquece da própria coisa que está a fazer. O si mesmo pode ser, através do movimento do seu próprio desdobramento, atraído pelo seu reflexo, absorvido e totalmente escondido a si mesmo por aquilo a que se abre e torna manifesto. Faz parte do seu ser poder cair numa realidade, e faz parte do próprio ser do cair, esquecer o que torna este cair possível.
Original
CARON, Maxence. Pensée de l’être et origine de la subjectivité. Paris: CERF, 2005.