- Roberto Raposo
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Roberto Raposo
O motivo fundamental da superioridade da propaganda totalitária em comparação com a propaganda de outros partidos e movimentos é que o seu conteúdo, pelo menos para os membros do movimento, não é mais uma questão objetiva a respeito da qual as pessoas possam ter opiniões, mas tornou-se parte tão real e intocável de sua vida como as regras da aritmética. A organização de toda a textura da vida segundo uma ideologia só pode realizar-se completamente sob um regime totalitário. Na Alemanha nazista, duvidar da validade do racismo e do antissemitismo, quando nada importava senão a origem racial, quando uma carreira dependia de uma fisionomia “ariana” (Himmler costumava selecionar os candidatos à SS por fotografias) e a quantidade de comida que cabia a uma pessoa dependia do número dos seus avós judeus, era como colocar em dúvida a própria existência do mundo.
As vantagens de uma propaganda que constantemente empresta à voz fraca e falível do argumento a “força da organização”, e dessa forma realiza, por assim dizer, instantaneamente tudo o que diz, são tão óbvias que dispensam demonstração. Garantida contra argumentos baseados numa realidade que os movimentos prometeram mudar, contra uma propaganda adversária desqualificada pelo simples fato de pertencer ou defender um mundo que as massas ociosas não podem e não querem aceitar, sua inverdade só pode ser demonstrada por outra realidade mais forte ou melhor.
É no momento da derrota que a fraqueza inerente da propaganda totalitária se torna visível. Sem a força do movimento, seus membros cessam imediatamente de acreditar no dogma pelo qual ainda ontem estavam dispostos a sacrificar a vida. Logo que o movimento, isto é, o mundo fictício que as abrigou, é destruído, as massas revertem ao seu antigo status de indivíduos isolados que aceitam de bom grado uma nova função num mundo novo ou mergulham novamente em sua antiga e desesperada superfluidade. Os membros dos movimentos totalitários, inteiramente fanáticos, enquanto o movimento existe, não seguem o exemplo dos fanáticos religiosos morrendo como mártires, embora estivessem antes tão dispostos a morrer como robôs, mas abandonam calmamente o movimento como algo que não deu certo e procuram em torno de si outra ficção promissora, ou esperam até que a velha ficção recupere força suficiente para criar novo movimento de massa.