apelo

Ruf, Rufen, Auruf, aurufen, Vorruf, vorrufen, Ausruf, ausrufen

Caso o homem ainda deva encontrar o caminho da proximidade do Ser, terá de aprender primeiro a existir no inefável (Namenlose). Terá que conhecer o extravio (Verführung) do público como também a impotência do privado. Antes de falar, o homem terá que deixar-se apelar (ansprechen) pelo Ser mesmo com o risco de, sob um tal apelo (Anspruch), ter pouco ou ter raramente algo a dizer. Somente assim, se restituirá à palavra a preciosidade de sua Essência e ao homem, a habitação para morar na Verdade do Ser. [CartaH, Carneiro Leão; GA9; GA9GS]


A análise mais profunda da consciência a desvela como APELO. STMSC: §54

O APELO é um modo de fala. STMSC: §54

O APELO da consciência possui o caráter de interpelação da presença [Dasein] para o seu poder-ser-si-mesmo mais próprio e isso no modo de fazer APELO para o seu ser e estar em dívida mais próprio. STMSC: §54

Ao APELO da consciência corresponde a possibilidade de uma escuta. STMSC: §54

Com isso temos a articulação das análises desse capítulo: os fundamentos ontológico-existenciais da consciência (§55); o caráter de APELO da consciência (§56); a consciência como APELO da cura (§57); a compreensão do interpelar e a dívida (§58); a interpretação existencial da consciência e sua interpretação vulgar (§59); a estrutura existencial do poder-ser próprio, testemunhado na consciência (§60). STMSC: §54

A análise {CH: aqui se confundem necessariamente várias coisas: 1) o APELO do que chamamos consciência; 2) o ser interpelado: 3) a experiência desse ser; 4) a interpretação comum da tradição; 5) a maneira em que disso se desincumbe} da consciência parte de um dado indiferente, a saber, de que ela, de algum modo, dá algo a compreender. STMSC: §55

Esse APELO rompe o dar ouvidos ao impessoal em que a presença [Dasein] não dá ouvidos quando, de acordo com seu próprio caráter, desperta uma escuta que, em tudo, se contrapõe à escuta perdida. STMSC: §55

Se este se caracteriza pelo “ruído” da ambiguidade múltipla e variada da falação cotidianamente “nova”, o APELO deve APELAR sem ruído, sem ambiguidade, sem apoiar-se na curiosidade. STMSC: §55

Apreendemos o APELO como modo da fala. STMSC: §55

A caracterização da consciência como APELO não é, absolutamente, apenas uma “imagem” como a representação kantiana do tribunal da consciência. STMSC: §55

Devemos lembrar que a verbalização não é essencial nem para a fala e nem para o APELO. STMSC: §55

Na tendência de abertura do APELO, insere-se um momento de impacto, de sobressalto {CH: mas também aquilo que detém} brusco. STMSC: §55

O APELO vem de longe e apela para longe. STMSC: §55

Só é atingido pelo APELO quem quer {CH: quem se distanciou do próprio si-mesmo} recuperar-se. STMSC: §55

Não é que se compare o fenômeno a um APELO mas, enquanto fala, o fenômeno é compreendido a partir da abertura constitutiva da presença [Dasein]. STMSC: §55

O que no APELO da consciência constitui o referido da fala, ou seja, o interpelado? STMSC: §56

Mesmo que o APELO tivesse uma meta tão vaga, ele ainda seria para a presença [Dasein] um motivo de prestar atenção a si mesma. STMSC: §56

O APELO alcança a presença [Dasein] nesse movimento de sempre já se ter compreendido na cotidianidade mediana das ocupações. STMSC: §56

O impessoalmente si mesmo do ser-com os outros nas ocupações é também alcançado pelo APELO. STMSC: §56

Que o APELO ultrapassa o impessoal e a interpretação pública da presença [Dasein], isso não significa, absolutamente, que o APELO também não o atinja. STMSC: §56

Justamente no ultrapassar, o APELO empurra o impessoal, absorvido nas considerações públicas, para a insignificância. STMSC: §56

O si-mesmo, porém, é levado pelo APELO para si mesmo, ao ser privado, na interpelação, desse refúgio e esconderijo. STMSC: §56

O APELO passa por cima de tudo isso e desfaz tudo isso para interpelar unicamente o si-mesmo que, por sua vez, não é senão no modo de ser-no-mundo. STMSC: §56

Que APELO a consciência faz para o interpelado? STMSC: §56

O APELO não exprime nada, não fornece nenhuma informação sobre acontecimentos do mundo, nada tem para contar. STMSC: §56

Correspondendo à sua tendência, o APELO não coloca o si-mesmo interpelado numa “negociação” consigo mesmo mas, enquanto um fazer APELO para o seu poder-ser mais próprio, o APELO é uma “a”-pelação (para “adiante”) da presença [Dasein] para suas possibilidades mais próprias. STMSC: §56

O APELO dispensa qualquer verbalização. STMSC: §56

A falta de verbalização do que, no APELO, se apela não remete o fenômeno à indeterminação de uma voz misteriosa, mas mostra apenas que a compreensão não deve se apoiar na expectativa de uma comunicação ou de algo parecido. STMSC: §56

O que o APELO abre é, não obstante, unívoco e preciso, mesmo que possa sofrer interpretações diversas, segundo as possibilidades de compreensão de cada presença [Dasein] singular. STMSC: §56

Apesar da aparente indeterminação do conteúdo do APELO não se pode deixar de considerar a direção segura com que o APELO intervém. STMSC: §56

O APELO não necessita primeiro buscar, tateando, o interpelado. STMSC: §56

Na consciência, os “enganos” não surgem de uma falha do APELO, mas somente do modo em que se escuta o APELO – de que, ao invés de ser propriamente compreendido, o APELO é arrastado pelo impessoalmente si mesmo para uma conversa negociadora consigo mesmo, desviando-se, assim, de sua tendência de abertura. STMSC: §56

Devemos ater-nos ao seguinte: o APELO característico da consciência é uma interpelação do impessoalmente-si-mesmo para o seu si-mesmo; tal interpelação é fazer APELO ao si-mesmo para seu poder-ser si-mesmo e, assim, uma APELAÇÃO da presença [Dasein] para suas possibilidades. STMSC: §56

Só podemos obter uma interpretação ontológica suficiente da consciência depois de se esclarecer o seguinte: é preciso apreender ontologicamente não apenas quem é APELADO no APELO, mas quem apela e também como o interpelado se relaciona com quem apela e como essa “relação” se oferece enquanto nexo ontológico. STMSC: §56

A consciência faz APELO ao si-mesmo da presença [Dasein] para sair da perdição no impessoal. STMSC: §57

O APELO ultrapassa o que a presença [Dasein], numa primeira aproximação e na maior parte das vezes, compreende a seu respeito, a partir da interpretação das ocupações. STMSC: §57

Não apenas o APELO considera o interpelado “sem levar em conta a sua pessoa” como quem apela se mantém numa surpreendente indeterminação. STMSC: §57

Embora jamais se descaracterize, quem apela também não oferece a menor possibilidade de tornar o APELO familiar para uma compreensão da presença [Dasein] orientada “mundanamente”. STMSC: §57

Quem apela o APELO – isso pertence à sua caracterização fenomenal – mantém afastada de si toda possibilidade de tornar-se conhecido. STMSC: §57

Ele anuncia que quem apela só se empenha em fazer APELO…, que ele só escuta assim e, por fim, que ele não aceita tagarelices a seu respeito. STMSC: §57

Sim, assim seria quando se escuta existenciariamente o fato do APELO da consciência. STMSC: §57

Não, porém, para a análise existencial da facticidade do APELO e da existencialidade da escuta. STMSC: §57

Não será então que para a presença [Dasein] essa pergunta se responde com a mesma precisão que a questão do que é interpelado no APELO? STMSC: §57

Essa compreensão de quem apela deve estar mais ou menos desperta na escuta fática do APELO. STMSC: §57

Não será o seu poder-ser si-mesmo mais próprio que faz APELO? STMSC: §57

O APELO justamente não é e nunca pode ser algo planejado, preparado ou voluntariamente cumprido por nós mesmos. STMSC: §57

O APELO “se faz” contra toda espera e mesmo contra toda vontade. STMSC: §57

Por outro lado, o APELO, sem dúvida, não provém de um outro que é e está no mundo junto comigo. STMSC: §57

O APELO provém de mim e, no entanto, por sobre mim. STMSC: §57

Esse procedimento é facilitado pelo dogma não pronunciado, que guia a seguinte tese ontológica: o que é, de modo tão fatual quanto o APELO, deve ser simplesmente dado; o que não se deixa comprovar objetivamente como ser simplesmente dado não é. STMSC: §57

Face a essa precipitação metodológica, deve-se não apenas manter o dado fenomenal – que o APELO nasce em mim, provindo de mim e por sobre mim – mas também ater-se ao prelineamento ontológico do fenômeno enquanto fenômeno da presença [Dasein]. STMSC: §57

Será que a análise da constituição ontológica da presença [Dasein], até aqui empreendida, aponta um caminho para a compreensão ontológica do modo de ser de quem faz APELO e com isso também do APELAR? STMSC: §57

Que o APELO não se realiza explicitamente por mim, sendo sempre um “se” apela, isso ainda não justifica que se busque o quem apela num ente desprovido do caráter de presença [Dasein]. STMSC: §57

E se, dispondo no fundo de sua estranheza, a presença [Dasein] fosse quem apela o APELO da consciência? STMSC: §57

A seu favor pronunciam-se todos os fenômenos apresentados para a caracterização de quem apela e de seu APELO. STMSC: §57

O APELO “se” faz e, ao mesmo tempo, nada oferece à escuta do ouvido curioso das ocupações que pudesse ser divulgado e discutido em público. STMSC: §57

Como se faz o APELO senão enquanto um fazer APELO a esse poder-ser, unicamente em jogo para si? STMSC: §57

O APELO não relata nenhum dado ou conteúdo. STMSC: §57

O APELO fala estranhamente em silêncio. STMSC: §57

E isso somente porque o APELO não interpela para a falação pública do impessoal mas sim para dele sair e passar para a silenciosidade do poder-ser existente. STMSC: §57

Só o APELO sintonizado pela angústia possibilita que a presença [Dasein] se projete para o seu poder-ser mais próprio. STMSC: §57

Compreendido existencialmente, o APELO da consciência é que anuncia o que, anteriormente, não passou de mera afirmação: a estranheza posterga a presença [Dasein] e ameaça a sua perdição no esquecimento de si mesma. STMSC: §57

A consciência revela-se como APELO da cura: quem apela é a presença [Dasein] que, no estar-lançado (já-ser-em…), angustia-se com o seu poder-ser. STMSC: §57

O APELO da consciência, ou seja, dela mesma, encontra sua possibilidade ontológica em que, no fundo de seu ser, a presença [Dasein] é cura. STMSC: §57

Dessa forma não é preciso escamoteá-la em poderes desprovidos do caráter de presença [Dasein], visto que a remissão a essas forças aniquila a estranheza do APELO ao invés de esclarecê-la. STMSC: §57

Será que esses falsos “esclarecimentos” não se devem, em última instância, a que, já na fixação do dado fenomenal do APELO, se parte de uma visão demasiado curta? STMSC: §57

Esta interpretação se oferece como reconhecimento do APELO no sentido de “voz universalmente obrigatória”, que não fala “apenas de modo subjetivo”. STMSC: §57

E isso não apenas no sentido de que, a cada vez, o poder-ser mais próprio é interpelado mas porque o APELO provém desse ente que eu mesmo sou. STMSC: §57

A interpretação precedente do quem apela nada mais fez do que acompanhar o caráter fenomenal do APELO. STMSC: §57

Ao contrário, só então liberou-se o APELO em seu caráter inexorável e unívoco. STMSC: §57

Com relação à interpretação da consciência enquanto APELO da cura, pode-se, contudo, levantar as seguintes questões: Uma interpretação da consciência tão distante da “experiência natural” pode ser consistente? STMSC: §57

Como a consciência há de fazer APELO ao poder-ser mais próprio se, numa primeira aproximação e na maior parte das vezes, ela apenas censura e adverte? STMSC: §57

O que a consciência testemunha só poderá adquirir plena determinação caso se delimite, com clareza e suficiência, o caráter que deve ter o ouvir que genuinamente corresponde ao APELO. STMSC: §57

A compreensão própria, aquela que “segue” o APELO, não é um mero acréscimo do fenômeno da consciência, um processo que poderia ou não advir. STMSC: §57

Se a própria presença [Dasein] é em si mesma sempre ao mesmo tempo quem apela e o interpelado, então quando não se dá ouvidos ao APELO, quando não se dá ouvidos a si, está em jogo um modo determinado de ser da presença [Dasein]. STMSC: §57

Do ponto de vista existencial, um APELO solto no ar, ao qual “nada se segue”, é uma ficção impossível. STMSC: §57

Do mesmo modo, só a partir da análise da compreensão do interpelar é que se pode retornar explicitamente à discussão daquilo que o APELO dá a compreender. STMSC: §57

A interpelação do impessoalmente-si-mesmo significa fazer APELO ao si-mesmo mais próprio para assumir o seu poder-ser e isso enquanto presença [Dasein], ou seja, enquanto ser-no-mundo das ocupações e ser-com os outros. STMSC: §58

A interpretação existencial daquilo para que o APELO faz APELO não pode pretender delimitar nenhuma possibilidade concreta e singular de existência, desde que suas possibilidades e tarefas metodológicas sejam devidamente compreendidas. STMSC: §58

A compreensão existenciária que escuta o APELO é tanto mais própria quanto mais a presença [Dasein] escutar e compreender, sem estabelecer remissões, o seu ser-interpelado e quanto menos aquilo que se diz, o que convém e possui validade, deturpa o sentido do APELO. STMSC: §58

O que no APELO se dá a compreender de modo essencial, embora nem sempre seja, faticamente, compreendido? STMSC: §58

Já indicamos a resposta para essas questões com a seguinte tese: o APELO não “diz” nada que se pudesse discutir. STMSC: §58

O APELO coloca a presença [Dasein] diante de seu poder-ser e isso enquanto APELO proveniente da estranheza. STMSC: §58

É indeterminado quem apela – mas o lugar de onde ele apela não é indiferente para o APELO. STMSC: §58

No APELO, esse lugar de onde – a estranheza da singularidade lançada – é convocado, ou seja, abre-se conjuntamente. STMSC: §58

Na APELAÇÃO para…, o lugar de onde provém o APELO é o lugar para onde se destina a reclamação. STMSC: §58

O APELO não dá a compreender um poder-ser ideal e universal; ele abre o poder-ser como a singularidade de cada presença [Dasein]. STMSC: §58

O caráter de abertura do APELO só se determina plenamente na sua compreensão de reclamação que apela. STMSC: §58

Somente orientando-se por essa apreensão do APELO é que se deve perguntar o que ele dá a compreender. STMSC: §58

Não seria, contudo, mais fácil e seguro responder à questão do que diz o APELO, indicando-se “simplesmente” o que comumente se ouve ou se deixa de ouvir em todas as experiências da consciência, ou seja, que o APELO endereça-se à presença [Dasein] como “o que está em dívida” ou, como no caso da consciência que adverte, remete a uma “dívida” possível ou ainda, enquanto “boa” consciência, confirma não “ter ciência de nenhuma dívida”? STMSC: §58

O recurso à “dívida” ouvido unanimemente ainda não é a resposta para a pergunta do sentido existencial do que no APELO se apela. STMSC: §58

E somente porque a presença [Dasein], no fundo de seu ser, é e está em dívida e, enquanto lançada e decadente, se tranca em si mesma é que a consciência se faz possível, desde que, no fundo, o APELO dê a compreender esse ser e estar em dívida. STMSC: §58

O APELO é APELO da cura. STMSC: §58

Na medida em que, para a presença [Dasein] enquanto cura, o que está em jogo é o seu ser, a partir da estranheza, ela faz APELO a si mesma, enquanto faticamente decadente no impessoal, para assumir o seu poder-ser. STMSC: §58

E a escuta que corresponderia a tal APELO seria um tomar conhecimento do fato de “estar em dívida”. STMSC: §58

Mas se o APELO deve ter o caráter de fazer APELO, nesse caso a interpretação da consciência não desvirtuaria inteiramente a função da consciência? STMSC: §58

O fazer APELO ao ser e estar em dívida não significaria, portanto, um fazer APELO ao mal? STMSC: §58

Essa interpretação mais violenta de todas não pretende impor à consciência esse sentido de APELO. STMSC: §58

O sentido de APELO esclarece-se caso a compreensão se atenha ao sentido existencial de ser e estar em dívida, em lugar de supor o conceito derivado de culpa, no sentido de uma dívida “nascida” de um ato ou omissão. STMSC: §58

Essa exigência não é arbitrária desde que o APELO da consciência, que provém ele mesmo da presença [Dasein], se dirija unicamente para esse ente. STMSC: §58

O fazer APELO ao ser e estar em dívida significa uma APELAÇÃO do poder-ser que, enquanto presença [Dasein], eu sempre sou. STMSC: §58

Permitir a APELAÇÃO desta possibilidade numa compreensão implica o tornar-se livre da presença [Dasein] para o APELO: a prontidão para poder ser interpelada. STMSC: §58

Compreendendo o APELO, a presença [Dasein] se faz escuta para a sua possibilidade de existência mais própria. STMSC: §58

A compreensão do APELO é a escolha não da consciência que, como tal, não pode ser escolhida. STMSC: §58

Com isso não se quer dizer: querer ter uma “boa consciência”, nem tampouco um cultivo voluntário do “APELO”, mas, unicamente, prontidão para ser interpelado. STMSC: §58

Compreendendo o APELO, a presença [Dasein] deixa que o si-mesmo mais próprio aja dentro dela a partir da possibilidade de ser escolhida. STMSC: §58

Embora o APELO nada dê a conhecer, ele não é meramente crítico, sendo também positivo; ele abre o poder-ser mais originário da presença [Dasein] como ser e estar em dívida. STMSC: §58

A consciência é o APELO da cura que, a partir da estranheza do ser-no-mundo, faz APELO para a presença [Dasein] assumir o seu poder ser e estar em dívida mais próprio. STMSC: §59

Se, numa primeira aproximação e na maior parte das vezes, a presença [Dasein] se compreende a partir das ocupações e interpreta todos os seus comportamentos como ocupação, então não haverá de interpretar justamente o modo de seu ser como decadência e encobrimento, modo que, no APELO, ela pretende recuperar da perdição nos afazeres do impessoal? STMSC: §59

O que a interpretação vulgar objetaria à interpretação da consciência como o fazer APELO da cura em seu ser e estar em dívida resume-se nos seguintes pontos: 1. STMSC: §59

Mas quando a consciência anuncia um “ser-culpado”, isto não se faz como fazer APELO para…, mas como referência que recorda a culpa acometida. STMSC: §59

E se a culpabilização fática e originária fosse apenas ocasião para o APELO fático da consciência? STMSC: §59

Mas nem o APELO, nem o ato e nem a culpa são ocorrências dotadas do caráter de um ser simplesmente dado que ocorre. STMSC: §59

O APELO possui o modo de ser da cura. STMSC: §59

A reclamação, ao mesmo tempo, faz APELO ao ser e estar em dívida como algo a ser assumido na própria existência de tal modo que o ser-culpado propriamente existenciário “segue” o APELO e não o contrário. STMSC: §59

Ela seria, pois, uma experiência do não aparecimento do APELO, ou seja, eu nada teria de que me acusar. STMSC: §59

Essa pretensa vivência não é, de modo algum, a experiência do APELO mas sim um asseguramento de que um ato atribuído à presença [Dasein] não foi por ela cometido e que, por isso ela não é culpada. STMSC: §59

Na verdade, a ideia da consciência que adverte parece ser a que mais se aproxima do fenômeno do fazer APELO… Com esta, ela tem a em comum o caráter de referência prévia. STMSC: §59

Enquanto interdição do que se quer, a advertência só é possível porque o APELO “que adverte” almeja o poder-ser da presença [Dasein], ou seja, a compreensão do ser e estar em dívida aonde “o que se quer” pode romper-se. STMSC: §59

A experiência de uma consciência “que adverte” apenas revê a tendência de APELO da consciência, quando ela permanece nos limites da compreensibilidade do impessoal. STMSC: §59

Esta última reflexão reside em que a experiência cotidiana da consciência não conhece nenhum fazer APELO para o ser e estar em dívida. STMSC: §59

Mas será que, com isso, a experiência cotidiana da consciência já garante que nela se escutou todo o conteúdo possível do APELO da voz da consciência? STMSC: §59

Com isso, perde em força a objeção de que a interpretação existencial desconsideraria que o APELO da consciência se referia cada vez a um determinado ato “realizado” ou que se dá na vontade. STMSC: §59

Não se pode negar que, com frequência, o APELO é experimentado nessa tendência. STMSC: §59

Permanece, no entanto, a questão se essa experiência do APELO permite que ele se faça “apelamento” em toda a sua plenitude. STMSC: §59

A interpretação comum pode pretender sustentar-se nos “fatos”, limitando, nessa sua compreensão, a abrangência de abertura do APELO. STMSC: §59

Se, porém, para o APELO, não é primária a dependência de uma culpa de fato “dada” ou de um ato culpável que de fato se dá na vontade, desse modo, a consciência que “censura” e “adverte” não constitui função originária do APELO, então são infundadas as objeções mencionadas de que a interpretação existencial desconsidera “essencialmente” o desempenho crítico da consciência. STMSC: §59

Pois, com efeito, no conteúdo do APELO não se pode demonstrar o que a voz aconselha e oferece “positivamente”. STMSC: §59

O APELO da consciência não propicia tais indicações “práticas” unicamente porque ele faz APELO à presença [Dasein] para a existência, para o poder-ser mais próprio de si mesma. STMSC: §59

O APELO não entreabre nada que, enquanto algo passível de ocupação, pudesse ser positivo ou negativo, porque ele diz respeito a um ser ontologicamente diverso, qual seja, à existência. STMSC: §59

Em contrapartida, no sentido existencial, o APELO, compreendido corretamente no sentido existencial, propicia o que há “de mais positivo”, ou seja, a possibilidade mais própria que se pode dar à presença [Dasein] enquanto reclamação apeladora do poder-ser faticamente a cada vez si-mesma. STMSC: §59

Ouvir com propriedade o APELO significa colocar-se na ação fática. STMSC: §59

Só podemos conquistar uma interpretação plena e suficiente do que se apela no APELO quando se elaborar e apresentar a estrutura existencial à base da compreensão que propriamente escuta o interpelar como tal. STMSC: §59

Foi preciso mostrar, preliminarmente, como os fenômenos, familiares apenas à interpretação vulgar da consciência, podem ser remetidos ao sentido originário do APELO da consciência, desde que compreendidos ontologicamente de maneira adequada. STMSC: §59

Assim como a existência não é, necessária e diretamente, em nada prejudicada por uma compreensão ontológica insuficiente da consciência, também não se pode garantir a compreensão existenciária do APELO mediante uma interpretação existencialmente adequada da consciência. STMSC: §59

O que se testemunha é, pois, “apreendido” no ouvir que compreende o APELO sem deturpações, no sentido por ele mesmo intencionado. STMSC: §60

Apenas a compreensão do interpelar, enquanto modo de ser da presença [Dasein], propicia o teor fenomenal do que é testemunhado no APELO da consciência. STMSC: §60

Caracterizamos a compreensão própria do APELO como querer-ter-consciência. STMSC: §60

O compreender do APELO abre a própria presença [Dasein] na estranheza de sua singularidade. STMSC: §60

Em seu fato, a angústia da consciência é uma confirmação fenomenal de que, no compreender do APELO, a presença [Dasein] é colocada diante da estranheza de si mesma. STMSC: §60

Entendido como fala originária da presença [Dasein], o APELO exclui toda e qualquer fala contrária, algo no sentido de uma discussão negociadora do que diz a consciência. STMSC: §60

A escuta compreensiva do APELO recusa a fala contrária não porque essa escuta fosse atropelada por um “poder obscuro” e repressor mas por se apropriar, sem encobrimentos, do conteúdo do APELO. STMSC: §60

O APELO apresenta o insistente ser e estar em dívida, retirando, assim, o si-mesmo da algazarra da compreensão impessoal. STMSC: §60

Por isso, o APELO é um silêncio. STMSC: §60

A consciência só apela em silêncio, ou seja, o APELO provém da mudez da estranheza e reclama a presença [Dasein] apelada para aquietar-se na quietude de si mesma. STMSC: §60

Que o impessoal, que apenas escuta e compreende a algazarra da falação, não pode “constatar” nenhum APELO, isso é então atribuído à consciência com a justificativa de que ela é “muda” e manifestamente não é um simples dado. STMSC: §60

Com esta interpretação, o impessoal encobre apenas a sua própria impossibilidade de dar ouvidos ao APELO e a curta amplitude de seu “escutar”. STMSC: §60

A decisão significa deixar-se receber o APELO a partir da perdição no impessoal. STMSC: §60

Com isso, torna-se inteiramente claro que o APELO da consciência, o fazer APELO ao poder-ser, não propõe nenhum ideal vazio de existência, mas faz APELO para a situação. STMSC: §60

Essa positividade existencial do APELO da consciência, corretamente compreendido, também evidencia a medida em que a limitação da tendência do APELO para culpabilizações anteriormente cometidas e contraídas desconhece o caráter de abertura da consciência e aparentemente só nos transmite a compreensão concreta de sua voz. STMSC: §60

A compreensão do APELO da consciência desvela a perdição no impessoal. STMSC: §62

Na interpelação, o APELO da consciência ultrapassa todo prestígio e poder “mundanos” da presença [Dasein]. STMSC: §62

O APELO singulariza, de forma inexorável, a presença [Dasein] em seu poder-ser e estar em dívida, dispondo-a a ser propriamente aquilo que é. STMSC: §62

Ela é o compreender que responde ao APELO da consciência, a qual libera a possibilidade de a morte apoderar-se da existência da presença [Dasein] e de, no fundo, dissipar todo encobrimento de si mesma, por menor que seja. STMSC: §62

Também esclarecemos que, no APELO da consciência, a cura faz APELO à presença [Dasein] para o seu poder-ser mais próprio. STMSC: §64

Entendida originariamente, o compreender do APELO revelou-se como decisão antecipadora. STMSC: §64

A indeterminação e impossibilidade de determinação próprias de quem apela não é um nada negativo, mas um traço positivo. STMSC: §57

Mas então o fenômeno não exigiria que se abandonasse a questão de quem é que apela? STMSC: §57

Faz-se ainda necessário recolocar explicitamente a pergunta de quem apela? STMSC: §57

Na consciência, a presença [Dasein] apela para si. STMSC: §57

Do ponto de vista ontológico, não é de forma alguma suficiente a resposta de que a presença [Dasein] é, ao mesmo tempo, quem apela e quem é interpelado. STMSC: §57

Somente a constituição existencial desse ente pode oferecer o fio condutor para a interpretação do modo de ser desse “se” apela. STMSC: §57

Nada “mundano” pode determinar quem apela em seu modo de ser. STMSC: §57

Quem apela é a presença [Dasein] em sua estranheza, o ser-no-mundo originariamente lançado enquanto um não sentir-se em casa, o nu e cru “que” (a presença [Dasein] é) no nada do mundo. STMSC: §57

Quem apela também não é familiar ao impessoalmente-si-mesmo da cotidianidade é algo como uma voz estranha. STMSC: §57

Em que contexto funda-se a certeza fria e estranha, embora não evidente, com a qual aquele que apela atinge o interpelado, senão em que, na estranheza de sua singularidade, a presença [Dasein] é para si absolutamente insubstituível? STMSC: §57

Enquanto consciência, é do fundo desse ser que a presença [Dasein] apela. STMSC: §57

A proposição: a presença [Dasein] é, ao mesmo tempo, quem apela e o interpelado perde agora o seu vazio formal e a sua evidência. STMSC: §57

Na interpretação do quem apela enquanto poder – que mundanamente é “ninguém” – parece subsistir, no entanto, o reconhecimento despreconceituoso de um “dado objetivo”. STMSC: §57

A consciência revela-se, portanto, como testemunho pertencente ao ser da presença [Dasein] onde ela apela a si mesma em seu poder-ser mais próprio. STMSC: §58

Nessa consequência impossível da ideia de boa consciência, porém, aparece apenas que a consciência apela por um ser e estar em dívida. STMSC: §59

É a partir da expectativa de uma indicação útil das possibilidades de “ação”seguras, disponíveis e calculáveis que se sente a falta de um conteúdo “positivo” no que se apela. STMSC: §59

Apela-se a presença [Dasein], interpelando-a para sair da decadência no impessoal (já-ser-junto-ao-mundo-das-ocupações). STMSC: §57

Não somente nada perde em termos de percepção, mas até leva a presença [Dasein] interpelada e apelada à silenciosidade de si mesma. STMSC: §56

O interpelado é justamente essa presença [Dasein] apelada para assumir o seu poder-ser mais próprio (anteceder-se…). STMSC: §57

Esse ainda deve ser conceituado de modo a possibilitar a compreensão do que significa a “dívida” apelada, de por que e como o seu significado é deturpado na interpretação cotidiana. STMSC: §58

Nada” é con-fessado para o si-mesmo interpelado, mas este é APELADO para si mesmo, ou seja, para assumir seu poder-ser mais próprio. STMSC: §56

O “eu sou APELADO” é uma fala privilegiada da presença [Dasein]. STMSC: §57

Foi, no entanto, apenas com esta caracterização ontológica geral da consciência que se tornou possível conceber, existencialmente, o que na consciência é APELADO no sentido de “dívida”. STMSC: §57

Não se pode e nem se quer fixar no APELADO o que sempre se dá, existenciariamente, em cada presença [Dasein], mas sim aquilo que pertence à condição existencial de possibilidade do poder-ser fático e existenciário. STMSC: §58

A interpelação é uma reclamação apeladora: A-PELAR a possibilidade de, em existindo, assumir, em si mesmo, o ente-lançado que é; re-clamar para o estar-lançado de modo a se compreender como fundamento do nada a ser assumido na existência. STMSC: §58

A reclamação APELADORA da consciência oferece para a presença [Dasein] a compreensão de que ela, na possibilidade de seu ser, é o fundamento nulo de seu projeto nulo, devendo recuperar-se para si mesma da perdição no impessoal, ou seja, de que ela é e está em dívida. STMSC: §58

O testemunho da consciência não é um anúncio indiferente mas uma APELAÇÃO apeladora do ser e estar em dívida. STMSC: §60

Pois todo pronunciamento e todo “APELAMENTO” já pressupõem a fala. STMSC: §55

O que assim APELANDO se dá a compreender é a consciência. STMSC: §55

Na condição de interpelada, a presença [Dasein] não se a-pre-senta [»da«] diferentemente do que como APELANTE? STMSC: §57

O querer-ter-consciência é o compreender que corresponde ao APELAR. STMSC: §59

Decisão diz: deixar-se APELAR no ser e estar em dívida mais próprio. STMSC: §62

Mas então o que quer dizer “APELAÇÃO do ser e estar em dívida”? STMSC: §58

Mas será que o “fato” de a voz vir depois exclui que, no fundo, é uma APELAÇÃO? STMSC: §59