Heidegger, fenomenologia, hermenêutica, existência

Dasein descerra sua estrutura fundamental, ser-em-o-mundo, como uma clareira do AÍ, EM QUE coisas e outros comparecem, COM QUE são compreendidos, DE QUE são constituidos.

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Zahavi: si mesmo

segunda-feira 13 de abril de 2020

nossa tradução

A ideia crucial proposta por todos os fenomenólogos é que uma compreensão do que significa ser um si mesmo exige um exame da estrutura da experiência e vice-versa. Em outras palavras, a alegação feita é que as investigações de si mesmo e da experiência precisam ser integradas para que ambas sejam entendidas.

Mais precisamente, afirma-se que o si mesmo (mínimo ou central) possui a realidade experiencial, é levado a estar intimamente ligado à perspectiva da primeira pessoa e é, de fato, identificado com a dação pessoal dos fenômenos experienciais. Na sua forma mais primitiva, a consciência de si mesmo é simplesmente uma questão de ter acesso pessoal à própria consciência; é uma questão da dação ou manifestação pessoal da vida experiencial. Essa dação pessoal de fenômenos experienciais não é algo incidental ao seu ser, um mero verniz que as experiências poderiam faltar sem deixar de ser experiências. Pelo contrário, essa dação pessoal torna as experiências subjetivas. Embora existam diferentes tipos de experiências (o cheiro do feno, a visão de um pôr-do-sol, o toque de um cubo de gelo etc.), e embora existam diferentes tipos de dação experiencial (perceptiva, imaginativa e recoletiva, etc.) há características comuns também. Uma dessas características comuns é a qualidade da ser-minha (ou para usar o termo de Heidegger "Jemeinigkeit"). Se uma certa experiência é experienciada como minha ou não, não depende de algo à parte da experiência, mas da dação da experiência. Se a experiência é dada a mim em um modo de apresentação pessoal, ela é experienciada como minha experiência, caso contrário não. Estar consciente de si mesmo, consequentemente, não é capturar um si puro que existe em separação [9] do fluxo da consciência, mas implica apenas estar consciente de uma experiência em seu modo de dação pessoal. Em suma, o si referido não é algo que está além ou oposto ao fluxo de experiências, mas é uma característica ou função de sua dação. É a dimensão invariável da dação pessoal na multidão de experiências em mudança.

Aliás, essa visão deixa claro que a consciência de si não deve ser entendida como uma consciência de um si isolado e sem mundo, nem o si localizado e escondido na cabeça. Ser consciente de si não é interromper a interação experiencial com o mundo para desviar o olhar; pelo contrário, a consciência de si é sempre a autoconsciência de um si imerso no mundo. O si está presente a ele mesmo de maneira precisa e, de fato, apenas quando está envolvido no mundo. Consequentemente, seria um erro decisivo interpretar a noção fenomenológica de um núcleo, ou mínimo, como um resíduo mental ao estilo cartesiano, isto é, como algum tipo de interioridade fechada no si e suficiente no si. A noção fenomenológica de si é totalmente compatível com uma forte ênfase na intencionalidade fundamental, ou estar no mundo, da consciência. Não é por acaso que mesmo Heidegger empregou tal mínima noção de si (cf. Zahavi   2003b).

Original

The crucial idea propounded by all of the phenomenologists is that an understanding of what it means to be a self calls for an examination of the structure of experience, and vice versa. To put it differently, the claim being made is that the investigations of self and experience have to be integrated if both are to be understood.

More precisely, the (minimal or core) self is claimed to possess experiential reality, it is taken to be closely linked to the first-person perspective, and is in fact identified with the first-personal givenness of the experiential phenomena. At its most primitive, self-consciousness is simply a question of having first-personal access to one’s own consciousness; it is a question of the first-personal givenness or manifestation of experiential life. This first-personal givenness of experiential phenomena is not something quite incidental to their being, a mere varnish that the experiences could lack without ceasing to be experiences. On the contrary, this first-personal givenness makes the experiences subjective. Although there are different types of experiences (the smelling of hay, the seeing of a sunset, the touching of an ice cube etc.), and although there are different types of experiential givenness (perceptual, imaginative, and recollective, etc.) there are common features as well. One such common feature is the quality of mineness (or to use Heidegger’s term “Jemeinigkeit”). Whether a certain experience is experienced as mine or not does not depend on something apart from the experience, but on the givenness of the experience. If the experience is given to me in a first-personal mode of presentation, it is experienced as my experience, otherwise not. To be conscious of one self, is consequently not to capture a pure self that exists in separation from the stream of consciousness, rather it just entails being conscious of an experience in its first-personal mode of givenness. In short, the self referred to is not something standing beyond or opposed to the stream of experiences, rather it is a feature or function of their givenness. It is the invariant dimension of first-personal givenness in the multitude of changing experiences. [1]

Incidentally, this view makes it clear that self-awareness is not to be understood as an awareness of an isolated, worldless self, nor is the self located and hidden in the head. To be self-aware is not to interrupt the experiential interaction with the world in order to turn one’s gaze inwards; on the contrary, self-awareness is always the self-awareness of a world-immersed self. The self is present to itself precisely and indeed only when it is engaged in the world. It would consequently be a decisive mistake to interpret the phenomenological notion of a core, or minimal, self as a Cartesian-style mental residuum, that is, as some kind of self-enclosed and self-sufficient interiority. [2] The phenomenological notion of self is fully compatible with a strong emphasis on the fundamental intentionality, or being-in-the-world, of consciousness. It is no coincidence that even Heidegger employed such a minimal notion of self (cf. Zahavi   2003b).

[Excerto de ZAHAVi  , Dan. "Being Someone", in PSYCHE 11 (5), June 2005]


Ver online : BEING SOMEONE


[1For a sustained defence of these notions of self-awareness and self, cf. Zahavi 1999, 2000, 2003a, and in particular 2005b.

[2Although Henry might in fact be read as defending a kind of immanentism, I would take exception to this aspect of his position (cf. Zahavi 1999).